As previsões indicam que, em 2050, a população mundial atingirá mais de nove bilhões de pessoas, e a produção de alimentos para essa população é o principal desafio da agricultura mundial nos próximos decênios. Acrescente-se a esse desafio que o esforço na produção de alimentos deverá ocorrer em um cenário de mudanças climáticas que afetam a produtividade agrícola e que a sociedade atual não mais aceita a expansão de áreas agrícolas, através de desmatamento da vegetação nativa, como alternativa para o aumento da oferta de alimentos.
Conforme indicado por diversos organismos internacionais, o Brasil deverá ser um dos principais protagonistas nesse esforço mundial de produção de alimentos. Esse protagonismo irá requerer a intensificação tecnológica dos sistemas de produção agrícola considerando maior eficiência no uso dos recursos naturais, a não expansão de fronteiras agrícolas, a atenção às demandas sociais dos atores envolvidos nas cadeias de produção agrícola, o atendimento de exigências de consumidores finais quanto à qualidade de alimentos e a viabilidade econômica dos empreendimentos rurais.
Nesse contexto, da necessidade de intensificação sustentável da agricultura brasileira, se destacam os sistemas integrados de produção como o iLPF, que permitem a exploração de lavouras, pecuária e florestas em uma mesma propriedade com uma série de benefícios biológicos, ambientais, sociais e econômicos para a exploração agrícola. No Brasil, a adoção de sistemas iLPF pode representar uma importante quebra de paradigmas em termos de agricultura tropical mundial na medida em que esses sistemas propiciam maior eficiência e sinergismo na utilização dos fatores de produção na propriedade, resultando em expressivos aumentos na produção de grãos, carne ou leite, energia e madeiras.
Por exemplo, a utilização de sistemas iLPF para recuperação e incorporação ao sistema produtivo de uma área estimada de 60 milhões de hectares de pastagens degradadas indica que a expansão da produção agrícola brasileira pode ser alcançada sem a necessidade de desmatamento e abertura de novas áreas. Sistemas integrados também desempenham importante papel na mitigação de emissões de gases de efeito estufa, e a expansão de áreas com iLPF foi incluída no Plano de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono, ou Plano ABC, como uma das estratégias para cumprimento das metas de redução de emissão de gases assumidas pelo Brasil na Conferência das Partes (COP-15).
Sistemas iLPF envolvem a utilização intensiva de tecnologia, e, embora adequados tanto para agricultura empresarial quanto para agricultura familiar, a sua adoção dependerá da existência de assistência técnica especializada em sistemas integrados e da disponibilidade de recursos financeiros. Embora exista um expressivo acervo de conhecimento e tecnologias para sistemas agrícolas convencionais, a sua utilização em sistemas de iLPF não é um processo direto.
Assim, a adaptação, a geração e a transferência de novas tecnologias adequadas para iLPF são prioridades no portfólio de pesquisas da Embrapa. Ações de transferência de tecnologia (TT) em iLPF devem tomar em consideração que sistemas integrados apresentam maior complexidade e também que são amplas as possibilidades de combinações temporais e espaciais entre lavoura, pecuária e florestas em uma propriedade agrícola. Outra possível limitante para ações de TT é que, de maneira geral, o perfil técnico dos profissionais envolvidos com assistência técnica e extensão rural tende a ser o de especialização, carecendo da visão holística de sistemas, necessária para atuação em propriedades que adotem iLPF.
Dessa maneira, é possível antever que TT para estimular a adoção de sistemas iLPF exigirá ações coordenadas das competências dos setores público e privado envolvidos no agronegócio brasileiro. A Embrapa sempre adotou o estabelecimento de parcerias público-privadas (PPP) em suas ações de P&D e TT, sendo reconhecidos, por exemplo, o sucesso de parcerias estabelecidas com fundações e associações de produtores de sementes para desenvolvimento de cultivares de diversas espécies.
Seguindo essa linha de atuação, a Embrapa vem adotando, em âmbito local, regional e nacional, diversas parcerias com a iniciativa privada para implementação de ações de TT em sistemas iLPF. A Rede de Fomento iLPF é uma parceria público-privada, estabelecida, em 2012, entre a Embrapa, a John Deere, a Syngenta e a Cooperativa Agroindustrial do Paraná (Cocamar), com o objetivo principal de apoiar as ações de TT que fomentassem o uso de sistemas de iLPF na agricultura brasileira. Posteriormente, as empresas Parker e Dow AgroSciences também ingressaram na Rede de Fomento iLPF.
Nessa PPP, que tem a coordenação técnica da Embrapa, os parceiros privados aportam recursos financeiros e agregam expertise técnica, administrativa e de gestão, propiciando maior dinâmica e agilidade nas ações de TT em iLPF realizadas em todo o território nacional pelos Centros de Pesquisa da Embrapa. Dessa maneira, setor público e privado atuam conjuntamente para a expansão do uso de iLPF, em uma iniciativa de importância estratégica para a agricultura brasileira e também de grande apelo ambiental, social e econômico. Os principais objetivos da Rede de Fomento iLPF são:
1. fomentar o desenvolvimento e a utilização de sistemas iLPF em propriedades de pequeno, médio e grande porte;
2. contribuir para a formulação e a implementação de ações de transferência de tecnologia em iLPF;
3. apoiar a capacitação e o treinamento de profissionais para assistência técnica e transferência de tecnologia em sistemas de iLPF;
4. estimular e promover atividades de pesquisa aplicada e adaptativa, bem como ações educacionais e de impacto cultural relacionados à iLPF;
5. participar na formulação de políticas públicas direcionadas à utilização de sistemas integrados que visem à intensificação sustentável da agricultura brasileira.
O processo de gestão da Rede de Fomento é participativo, e a governança da Rede é feita através de dois colegiados. A Assembleia Geral, que tem a participação de altos diretivos da Embrapa e das empresas participantes, é o principal colegiado da Rede Fomento e responsável pelas decisões de caráter estratégico. O Conselho Gestor, composto paritariamente por representantes da Embrapa e das empresas privadas, é o colegiado responsável pelas decisões táticas e operacionais da Rede.
A Fundação Eliseu Alves é responsável pela gestão administrativo-financeira dos recursos aportados e pela implementação das decisões do Conselho Gestor. O planejamento de atividades e de alocação de recursos é realizado para cada ano agrícola, e, atualmente, a Rede de Fomento apoia as ações de TT em iLPF da Embrapa, como a Rede Nacional de Unidades de Referência Tecnológica (URT) em iLPF e as ações de TT (dias de campo, capacitação continuada, cursos, reuniões técnicas, palestras e visitas) realizadas nessas URTs e um projeto de Comunicação em iLPF. A Rede também apoia as ações de um projeto de Sistematização de Informações geradas nas URTs, que tem como objetivo a avaliação da adoção de sistemas iLPF e dos impactos ambientais, econômicos e sociais desses sistemas. Também é objetivo desse projeto a análise estratégica das possibilidades de expansão de sistemas iLPF nos diversos biomas brasileiros.