Dias atrás deparei-me com os anais do Encontro de Colheita Florestal que participei em Curitiba, organizado pelo Professor Malinovski em 2006. Já com as folhas um pouco amareladas, talvez devido ao calor que se intensifica a cada ano em Curvelo, mas com conteúdo que apresentava as tecnologias mais avançadas nas práticas florestais.
Refiro-me aqui a um passado recente, mas, folheando tal livro, confesso que minha memória me traiu. Fiquei surpreso com o que via e acabei apoiando o livro sobre a mesa. Duranteum instante me dei conta de como o tempo havia passado. Era como se estivesse olhando aquela foto de infância, aquele retrato ao lado de meus pais, todos com sorriso estampado no rosto, satisfeitos por terem comprado o primeiro carro da família, o Volkswagen Brasília, símbolo de robustez e conforto de uma época.
Frente aos desafios de cada época, a tecnologia reflete a capacidade humana de utilizar conhecimento e criatividade para transformar o mundo ao nosso redor. A área florestal é testemunha disso, pois as tecnologias desenvolvidas no setor têm respondido a uma série de desafios emergentes. O estado da arte destas tecnologias reflete não apenas o que é conhecido e amplamente aceito, mas as inovações mais recentes, os desenvolvimentos mais avançados e as tendências. A seguir, trago uma lista não exaustiva de avanços tecnológicos que estão impactando positivamente o setor florestal:
1. Sensoriamento remoto e sistemas de informação geográfica: têm permitido o mapeamento detalhado e o monitoramento dos recursos florestais. Imagens de satélite de alta resolução espacial e temporal, drones equipados com sensores e LiDAR fornecem dados valiosos sobre a cobertura florestal, a saúde e a detecção de alterações. Suportam decisões de planejamento e gestão florestal na otimização de atividades de planejamento e operações de colheita, realização de inventário florestal, controle de pragas, monitoramento de incêndios, insight sobre a biodiversidade e estimativa de estoque de carbono.
2. Sistemas de monitoramento baseados em Internet das Coisas (IoT, Internet of Things): têm sido utilizados para monitoramento, gestão e conservação, propiciando a detecção precoce de problemas e gestão proativa. a) Sensores inteligentes estrategicamente distribuídos, que coletam dados em tempo real de variáveis ambientais, como temperatura, umidade do ar, umidade do solo, qualidade do ar e níveis de poluição;
b) câmeras de infravermelho e sistemas de detecção de fumaça, usados para detectar incêndios florestais em estágio inicial;
c) armadilhas fotográficas e sensores acústicos, empregados para monitorar a biodiversidade;
d) dispositivos de monitoramento do crescimento das árvores, estimativa de volume de madeira e planejamento de rotas de transporte eficientes.
3. Robótica e Automação: seja em fase de protótipos, ou em escala comercial, as aplicações robóticas têm sido aplicadas em áreas de preservação e monitoramento ambiental, combate a incêndios florestais, operações de inventário, plantio e colheita florestal.
a) Colheita florestal autônoma: robôs especializados que utilizam sensores avançados como câmeras, LiDAR e GPS, para navegar no ambiente florestal, identificar árvores, realizar cortes precisos e processar a madeira para o transporte. Prometem aumentar a eficiência, reduzir os custos e minimizar os riscos associados ao trabalho manual em ambientes com alto risco.
b) Plantio: robôs sendo desenvolvidos para automatizar o processo de reflorestamento, utilizando sistemas de visão computacional e braços robóticos para identificar locais adequados para o plantio, realizando coveamento e plantando mudas de forma eficiente. O plantio robótico pode aumentar significativamente a velocidade e a escala das operações, preenchendo lacunas em locais de mão de obra escassa.
4. Biotecnologia e genética: programas de melhoramento genético clássico têm sido revisitados para além de permitir o desenvolvimento de árvores mais produtivas e resistentes a doenças, potencializar o desenvolvimento de clones com expressão de características físico-químicas desejáveis, e sobretudo, materiais mais adaptados às mudanças climáticas. Em paralelo, avanços na engenharia genética e nas tecnologias de melhoramento através de técnicas de seleção assistida por marcadores e edição do genoma têm sido desenvolvidos como plataformas para acelerar demandas específicos de resultados.
5. Biomateriais e bioprodutos: pesquisa e desenvolvimento de biomateriais e bioprodutos derivados de recursos florestais são oportunidades para a diversificação de produtos e agregação de valor à biomassa florestal em sua integralidade. Isso inclui produtos como bioenergia, bioplásticos, produtos químicos renováveis e bioóleo, os quais contribuem para a redução das emissões de gases de efeito estufa como uma alternativa aos combustíveis fósseis.
6. Tecnologias emergentes: a Inteligência Artificial (IA), a aprendizagem automática e blockchain oferecem novas oportunidades para a modelação preditiva e apoio à decisão.
a) Algoritmos IA desempenham um papel central na otimização de processos. Analisando grandes conjuntos de dados, a IA identifica padrões operacionais, otimizando a alocação de recursos, logística e estratégias de reflorestamento.
b) Aplicações de realidade aumentada na formação de profissionais florestais através de treinamento prático em ambiente virtual,
capacitando equipes frente situações complexas, simulando estratégias de manejo e promovendo a segurança no trabalho.
c) Blockchain para rastreabilidade na cadeia de suprimentos através de contratos inteligentes. Permite a rastreabilidade dos produtos, mitigando riscos de atividades ilegais e garantindo que o manejo florestal esteja em conformidade com padrões ambientais e regulatórios.
As tecnologias continuam sendo ferramentas para enfrentar desafios clássicos do setor, como a produtividade florestal e o aumento dos custos de produção. As florestas de eucalipto no Brasil, que apesar de mostrarem resultados crescentes nos últimos anos, apresentaram em 2022, segundo a Ibá, o menor resultado em 9 anos, estimado em 32,7 m³/ha/ano (com casca aos 6,7 anos). A pressão inflacionária também continua se fazendo presente. Ainda segundo a Ibá, o custo de produção de madeira acumulou alta de 9% em 2022, já significativamente menor quando comparado a 2021 (24%), mas ainda bem acima do IPCA registrado neste mesmo ano (5,88%).
Por outro lado, novos desafios apresentam-se a cada dia. As mudanças climáticas e as adaptações as agendas de ESG têm influenciado de maneira preponderante a dinâmica de desenvolvimentos tecnológicos. Preocupações até então marginais começam a se impor nas agendas das equipes de P&D das empresas, startups e instituições de pesquisa e desenvolvimento.
A inovação tecnológica vem transformando o setor florestal, aumentando a produtividade e a resiliência nas práticas de gestão florestal. Ao abraçar estes avanços e promover a inovação, o setor florestal continuará a se adaptar aos desafios em evolução e a contribuir para um futuro ainda mais sustentável.