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Douglas Seibert Lazaretti

Diretor de Operações Florestais da Suzano

OpCP63

Ecossistemas de inovação e empreendedorismo
O mundo vem observando um movimento de aceleração na curva de adoção de novas tecnologias nos mais variados setores da economia. Um exemplo disso são as tecnologias digitais, que vêm transformando setores inteiros, colocando a experiencia do cliente no centro do modelo de negócios com o objetivo de resolver problemas do cotidiano e tornar, assim, a nossa vida mais fácil. Com isso, abrimos espaço em nosso tão concorrido tempo para nos dedicar às tarefas que somente nós, seres humanos, somos capazes de fazer.
 
Já do lado da ciência, descobertas recentes foram fundamentais para a criação em tempo recorde da primeira vacina contra a Covid-19, aprovada e distribuída no Reino Unido, que utiliza a tecnologia inovadora de RNA mensageiro. Isso só foi possível pela coragem de uma cientista chamada Katalin Karikó, húngara radicada nos Estados Unidos, que desenvolveu a tecnologia para vacinas hoje utilizada nos imunizantes Pfizer/BioNTech e que poderá ser um ponto de partida para revolucionar outras imunizações no futuro.
 
Foram 30 anos de pesquisa, enfrentando uma sequência de rejeições do governo e de investidores privados para o financiamento de suas investigações desde que ela ingressou na Universidade da Pensilvânia, em 1990. Nem mesmo um câncer que enfrentou em 2005 tirou a sua perseverança: ela continuou escrevendo e melhorando a sua abordagem, para que conseguisse financiar a pesquisa baseada no trabalho de cientistas da Universidade de Wisconsin e da empresa de biotecnologia Vical Incorporated, os quais descobriram como fabricar o RNA mensageiro, molécula que dá o pontapé inicial para instruir as células vivas a produzir proteínas específicas. 
 
Esse é um belo exemplo da ciência aplicada à solução de problemas reais da sociedade e da perseverança que cientistas e empreendedores precisam ter para enfrentar essa longa e desafiadora jornada. Mas, afinal, o que é preciso para que pesquisas como essa se transformem em novas tecnologias, produtos e modelos de negócio? É possível que instituições de pesquisa, startups, governos e/ou grandes empresas façam investimentos de forma individual em pesquisa e desenvolvimento para contribuir para o cenário de transformação de novas descobertas em tecnologia e inovação? Talvez sim. No entanto há forte probabilidade que esse tipo de jornada, quando percorrida de forma isolada, seja mais longa e onerosa. 
 
Neste artigo, vou abordar a via colaborativa que conecta diversos stakeholders na busca por soluções dos mais variados desafios que enfrentamos como sociedade. Já parou para pensar no que torna ecossistemas de inovação, como o de Kendall Square/Grande Boston, Israel, Londres, Singapura ou Vale do Silício, lugares especiais e únicos para a criação e crescimento de novas empresas que impulsionam a prosperidade econômica dessas regiões ou países?
 
Os professores Phill Budden e Fiona Murray, do MIT Sloan School of Business, escola de gestão do renomado Massachusetts Institute of Technology, vêm estudando, há alguns anos, os mais diversos ambientes de inovação ao redor do mundo. O objetivo é entender o que é preciso para criar esse tipo de ecossistema e torná-lo único por meio de suas capacidades e características específicas. Segundo os mesmos professores, um ecossistema de inovação também pode ser lido como um grupo de pessoas e recursos interconectados que promovem um ambiente para que empresas orientadas por inovação possam iniciar, crescer e escalar.

De forma resumida, duas competências principais são os motores desse sistema, de acordo com o modelo sistemático criado no MIT para avaliar o empreendedorismo voltado à inovação em ecossistemas:

Capacidade de Inovação (ICap): capacidade de um lugar, uma cidade, região ou nação de desenvolver ideias novas para o mundo, movendo-as da fase embrionária para algo de impacto (social, econômico e/ou ambiental). Em outras palavras, a capacidade de inovação abrange não apenas o desenvolvimento de 
ciência básica e pesquisa, mas também a tradução de suas "soluções" em produtos úteis, tecnologias ou serviços que realmente resolvam problemas.
 
Capacidade de empreendedorismo (E-Cap): enfatiza um subconjunto de capacidades mais gerais e condições da região para a constituição de novas empresas e negócios. Para facilitar o entendimento dessa capacidade, faço um paralelo com o índice Doing Business, do Banco Mundial, que aborda a facilidade de fazer negócios de um determinado país – nesse ranking, o Brasil está posicionado na 124ª posição entre 190 países avaliados, conforme relatório de 2020. Contudo os aspectos do E-cap que mais interessam à inovação são aqueles relacionados ao apoio da cidade, região ou país para suportar o crescimento das IDEs (innovation-driven enterprises), em tradução livre, empresas orientadas à inovação. Existem cinco componentes considerados principais por esse modelo ao analisar o ICap e o E-Cap de uma região:
 
Capital Humano: talentos da região ou atraídos para a região com alto nível de educação, capacitação e experiência, tanto para inovação quanto para empreendedorismo; 
 
Financiamento: dos mais diversos tipos de capital, do setor público ao privado, que suportem a inovação e o empreendedorismo na longa jornada que começa em uma ideia e vai até a criação e o crescimento de uma startup.
 
Infraestrutura: estrutura física necessária para suportar a inovação e o empreendedorismo nos seus diferentes estágios, incluindo espaço, equipamentos para pesquisa, produção e cadeia de suprimentos. 
 
Demanda: o nível e a natureza da demanda especializada para os produtos da inovação e empreendedorismo, fornecidos por diferentes organizações em sistema.
 
Cultura e Incentivos: a natureza dos modelos e indivíduos que são reconhecidos, as normas sociais (cultura) que moldam as escolhas de carreira aceitáveis e os incentivos que moldam os comportamentos individuais e de equipe.
 
Em complemento aos fatores citados acima, um estudo recente da Endeavor, em parceria com a ENAP no Brasil (Índice de Cidades Empreendedoras – ICE 2020)*, aponta ainda o fator Ambiente Regulatório, que aborda os desafios do cumprimento de obrigações regulatórias que demandam tempo e recurso, como tributos e contratação de mão de obra específica.
 
Retomando a metodologia MIT, o modelo de stakeholders de um ecossistema de inovação é formado basicamente por cinco elementos:  empreendedores, capital de risco (ex: empresas de venture capital, que investem em negócios de alto risco - alto retorno),  empresas, governo e universidades (que particularmente abordaria como as mais diversas instituições de pesquisa e ensino).
 
No caso da Suzano, líder global na produção de celulose de eucalipto, o trabalho começou “dentro de casa”: a companhia implementou um robusto sistema interno de transformação digital – que englobou desde a formação de um time interno de designers, agilistas, cientistas e engenheiros de dados  até o contínuo esforço de envolvimento de todas as áreas da companhia à temática, descentralizando a responsabilidade de apenas um núcleo para literalmente permear toda a organização. 
 
A companhia implementou a utilização de advanced analytics e machine learning para otimizar os processos de alocação clonal, planejamento florestal e abastecimento de madeira nas fábricas.  
 
Indo além, a companhia fez do compromisso de ser referência global no uso sustentável de recursos naturais uma importante oportunidade de dar asas à inovação aberta e estabelecer parcerias estratégicas com startups para diversas frentes de produtividade e de novos negócios, ou até mesmo de substituição de negócios já existentes como alternativa sustentável à sociedade.
 
Temos, no agronegócio brasileiro, um bom exemplo de ecossistema que vem crescendo ano após ano: o Vale do Piracicaba (ou AgTech Valley), na mesma região que abriga a renomada Esalq – Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz. Nesse contexto, a Suzano encontrou uma oportunidade de protagonizar, como innovation partner, a primeira parceria do setor florestal com a AgTech Garage, mais relevante hub de inovação do agronegócio da América Latina. Atualmente, trabalhamos um desafio de inovação aberta voltado à geração de valor para a restauração florestal por meio do programa Intensive Connection LATAM: o programa conta com startups de toda a América Latina, e a companhia vai possibilitar que empreendedores apresentem tecnologias que contribuam para a ampliação da eficiência operacional e a geração de inteligência sobre monitoramento florestal. Estabelecemos, ainda,  iniciativas conjuntas com outros hubs, como o Plug and Play, Endeavor Brasil, Beta-i e Ibi-Tech – Israel Brazil Innovations etc. E o investimento se estende também à academia, por meio de importantes parcerias com universidades e institutos de pesquisa por todo o mundo.
 
Já são mais de 500 conexões e 28 projetos de inovação aberta em andamento, que visam fortalecer os direcionadores da companhia, os quais passam por inovar para avançar e por investir somente no que também for bom para o mundo. Ao assumir publicamente o propósito de renovar a vida a partir da árvore, a companhia já traz à tona a sua audácia e firme crença em iniciativas disruptivas. Um exemplo disso é o recente anúncio de uma joint venture com a startup Spinnova, da Finlândia, para a produção de tecido a partir de fibra de eucalipto naquele país. 
 
Os estudos para a utilização de celulose microfibrilada (MFC) pela companhia já vinham sendo realizados há mais de 4 anos para esse fim, e a aposta de produzir um tecido mais sustentável conversa diretamente com a demanda do mercado por produtos que preservam o meio ambiente, além de colocar em prática uma das metas de longo prazo da companhia, que envolve a redução do uso de água. 
 
A produção do novo tecido não englobará químicos nocivos ao ambiente no processo de fabricação e traz uma significativa redução do volume de água necessário à sua produção, em comparação com outras alternativas atualmente disponíveis. Além disso, o material possui potencial circular – de reaproveitamento – e não resulta em microplásticos.
 
Trata-se de um importante movimento não só para a empresa, mas para todo o setor de base florestal, que também precisa estar mais conectado com polos como o Vale do Piracicaba e trabalhar de forma colaborativa com os diversos stakeholders que compõem esses ecossistemas para promover ambientes de inovação e empreendedorismo no Brasil. 
 
Assim, podemos criar, atuando juntos e pelo todo, soluções para os principais desafios do setor de florestas plantadas, o qual vem tomando cada vez mais um papel protagonista na busca de soluções mais sustentáveis para o planeta.