As mudanças dos padrões do clima constituem uma das principais preocupações atuais, uma vez que afetam vários fatores ligados à proteção dos plantios e, de forma ainda mais direta, a produtividade florestal. Desse modo, torna-se muito importante entender como será o clima futuro, bem como se existe uma forma de tornar isso mais previsível, para que medidas mitigadoras possam ser tomadas em tempo.
Logicamente, essas não são tarefas simples, porém, com base em metodologia científica mais atualizada, buscou-se embasar alguns cenários futuros para reflexão. O primeiro passo para o nosso trabalho foi definir quais projeções utilizar sobre o clima futuro. Para isso, usamos projeções de dois Modelos Climáticos Globais (MCG), o HadGEM2-ES (UK Met Office Hadley Centre Global Environmental) e o MIROC5 (Japan Agency for Marine-Earth Science and Technology), ambos fornecidos pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).
Os GCM são ferramentas disponíveis para projetar o clima no futuro, com base em processos biofísicos de transferência de energia de materiais dos componentes atmosféricos por meio do sistema climático. Os modelos simulam o clima desde o período pré-industrial, usando os níveis anteriores de concentração de gases de efeito estufa (GEE).
Essas simulações atingem o clima atual aumentando as concentrações até os níveis observados de GEE atuais, e, em seguida, os modelos projetam, no clima futuro, as concentrações de gases de acordo com o cenário prescrito. Para reduzir os vieses aleatórios de ambos os MCG, nós usamos a abordagem conjunta multimodelo (ensemble approach) nas análises dessa comunicação.
No Intergovernmental Panel on Climate Change - IPCC AR5 (IPCC, 2013), as concentrações de GEE foram baseadas em quatro cenários, as chamadas Representative Concentration Pathways (RCP): RCP2.6, RCP4.5, RCP6.0 e RCP8.5. Tais números referem-se às forçantes radiativas, 2,6; 4,5; 6,0 e 8,5 Wm-2, respectivamente, e que poderiam ser alcançadas no final do século 21 e seriam causadas pelo aumento das concentrações globais de GEE.
Essas forçantes radiativas são usadas nos MCG como uma proxy para os cenários de comportamento socioeconômico e ambiental futuros de longo prazo. Nas análises dessa comunicação, vamos apresentar apenas os resultados para os cenários RPC4.5 e RCP 8.5. O primeiro cenário é considerado moderadamente otimista, enquanto o segundo é o mais pessimista, pois adota taxas de emissão de GEE muito elevadas.
Precisamos entender clima como uma média de longo prazo das condições meteorológicas de 30 anos consecutivos de uma determinada localidade. Por exemplo, a média e a distribuição mensal da temperatura e a precipitação de uma região são componentes-chave do estado geral do sistema climático naquele local.
Portanto um sistema de classificação climática bem definido, e que pode ser, ao mesmo tempo, simples, relevante e facilmente replicável, é uma excelente ferramenta de benchmark para detectar e monitorar as mudanças climáticas ao longo do tempo. O sistema Köppen, por atender a essas premissas, continua sendo a classificação climática mais utilizada até hoje.
Desse modo, muitos cientistas têm usado esse sistema com sucesso para identificar os tipos de clima e rastrear as mudanças climáticas em escalas regionais e globais (Köppen's climate classification map for Brazil, Alvares et al., 2013). Nós sumarizamos as projeções futuras em três períodos (2011-2040, 2041-2070 e 2071-2099) para classificá-las conforme os critérios de Köppen, além do período presente (baseline, 1961-1990).
Posteriormente, utilizamos os mapas de localização dos plantios florestais. Como sabemos, mapas de plantações florestais, separados de florestas naturais, estão disponíveis para alguns poucos estados brasileiros. As culturas florestais e suas espécies identificadas com alta confiança nesses esforços de mapeamento de florestas plantadas ainda são um desafio.
Convergindo para resolver esses problemas de informações cadastrais básicas para a ciência aplicada, o projeto Spatial Database of Planted Trees (SDPT) conduziu um amplo trabalho de compilação, sintetização e harmonização de mapas nacionais de florestas plantadas em um mapa global (Harris et al., 2019).
Nas análises dessa comunicação, os layers de Eucalyptus (5.490.594 ha) e Pinus (2.137.492 ha) do SDPT foram usados para avaliar como a mudança climática deve afetar essas culturas florestais atuais no Brasil. São esperadas mudanças climáticas acentuadas nas regiões das atuais plantações de Eucalyptus no País, aumentando as condições tropicais, de 19,5% para 45% (RCP4.5) a 59,4% (RCP8.5) em 2071-2099.
Os climas semiáridos aumentariam de 0,1% para 7%. Por outro lado, nas plantações em regiões subtropicais, são esperadas uma redução drástica de 80,3% (1961-1990) para 52,6% (RCP4.5) e 33,5% (RCP8.5), até 2071-2099. Nas áreas de Pinus, as mudanças climáticas poderão ser também importantes. Atualmente, as plantações estão 98,7% em regiões subtropicais e 1,3% em tropicais.
Em 2071-2099, são esperados aumentos das condições tropicais de 6,8% a 21,5% e redução das condições subtropicais para 93,1% a 78,3%, respectivamente os cenários RCP4.5 e RCP8.5. É importante destacar que são esperadas trade-off dos principais climas subtropicais, forte aumento de Cfa (verão quente) e grande redução de Cfb (verão ameno).
Essas fortes mudanças climáticas nas culturas florestais desses gêneros estão relacionadas, em parte, com a regiões tradicionais (subtropicais) e de expansão (tropicais) do Eucalyptus e Pinus. Resumidamente, no Brasil, os climas tropicais se mantêm em torno de 80% do País, mas vemos redução dos tropicais úmidos (Af e Am) e aumento de área nos secos (Aw e As) em todos os períodos e cenários.
Os modelos mostram aumento significativo de climas semiáridos (BSh) e áridos (BWh), de 6,5% (1961-1990) para 17,5% (2071-2099 RCP8.5) do País. Os resultados mostram que as atuais regiões subtropicais (Cfa, Cfb, Cwa e Cwb) serão muito afetadas, reduzindo dos atuais 15,5% para 8,4% (RCP4.5) e 6.1% (RCP8.5) em 2071-2099.
Sucintamente, é esperado que os climas áridos avancem sobre os tropicais, e estes, sobre os subtropicais, em intensidade moderada a rápida, a depender dos cenários de concentração dos GEE. Conforme já podemos perceber, o efeito das mudanças climáticas estão sendo percebidos por meio de veranicos e ondas de calor cada vez mais severas, temperatura média mais elevada a cada ano, déficit hídrico do solo mais prolongado, redução do total anual de chuva em algumas regiões, ciclos hidrológicos mais curtos (relacionados com ENSO) e distribuição de chuvas mais típica de monções.
Todas essas variações do clima causam maiores ocorrências de incêndios florestais, desequilíbrios ambientais e surtos de pragas e doenças; em casos mais severos, mortalidades de árvores. Esses são alguns dos eventos que causaram a estagnação da produtividade florestal na última década. Desse modo, torna-se preciso dar mais atenção para algumas medidas, principalmente para desenvolver uma floresta mais resiliente, além de desenvolver conceitos e tecnologias mais eficientes para a proteção da floresta do futuro.