O setor florestal brasileiro atravessa um período de crescimento acelerado, impulsionado pela expansão da fronteira florestal e pelo aumento da demanda por produtos derivados da celulose e da madeira, conforme demonstra o gráfico 1, Evolução da Produção Brasileira de Celulose.
1: EVOLUÇÃO DA PRODUÇÃO BRASILEIRA DE CELULOSE (em 1.000 toneladas)
No entanto, esse crescimento exponencial esbarra em um desafio crítico: a escassez de profissionais qualificados e de mão de obra operacional. Como podemos atrair, selecionar e reter talentos nesse cenário? O desafio não é apenas quantitativo, mas também qualitativo, pois as exigências técnicas e comportamentais para atuação no setor estão se tornando cada vez mais complexas.
O descompasso entre a oferta de mão de obra e o crescimento do setor florestal é evidente. A formação de engenheiros e técnicos florestais tem diminuído nos últimos anos, conforme apontam diversas pesquisas acadêmicas, demonstradas no gráfico 2, Formandos em Engenharia Florestal no Brasil.

2: FORMANDOS EM ENGENHARIA FLORESTAL NO BRASIL
A quantidade de profissionais formados nessas áreas já não acompanha a demanda crescente das empresas, e a tendência de redução da atratividade desses cursos em algumas universidades agrava ainda mais esse cenário conforme exposto no gráfico 3, Matriculados em Engenharia Florestal no Brasil.

3: MATRICULADOS EM ENGENHARIA FLORESTAL NO BRASIL
Além disso, a disponibilidade de trabalhadores rurais está em queda, reflexo da urbanização e da migração para setores considerados mais atrativos pelas novas gerações. De acordo com dados da Embrapa, em 2012, o setor primário do agronegócio brasileiro empregava 10,23 milhões de pessoas, número que caiu para 8,25 milhões em 2023, uma redução de 19,35% em 10 anos, o que representa 1,98 milhão de trabalhadores a menos. Com menos pessoas dispostas a trabalhar no campo, o setor precisa se reinventar para manter suas operações sustentáveis e produtivas.
As projeções empresariais indicam que, apenas no Vale da Celulose, mais de 100 mil vagas de empregos devem ser abertas até 2030. No entanto, onde encontraremos profissionais qualificados para ocupá-las? A equação não fecha: ou repensamos nossa abordagem na gestão de pessoas ou enfrentaremos um gargalo que pode comprometer o avanço do setor. A dificuldade não se restringe apenas a cargos técnicos e operacionais. Há também desafios na formação de líderes, supervisores e gestores que compreendam a complexidade do setor e saibam lidar com as novas dinâmicas do mercado de trabalho.
Outro fator crítico é a mudança no perfil dos trabalhadores. O trabalho de campo, muitas vezes exposto a intempéries e condições desafiadoras, já não desperta o interesse dos mais jovens. As novas gerações priorizam qualidade de vida, flexibilidade e inovação, e o setor florestal precisa se adaptar para ser mais atraente. A pergunta que se impõe é: nós, gestores florestais, incentivamos nossos próprios filhos a seguir essa carreira?
Quantos de nós realmente vemos nossos descendentes interessados em trabalhar nesse setor? Se a resposta for negativa, temos um forte indicativo de que precisamos transformar o setor para torná-lo mais compatível com as expectativas do novo perfil de profissionais. Será que a nova geração mudou tanto, ou será que nós mesmos desejamos mudanças para nossos filhos e acabamos não promovendo o setor da forma como deveríamos?
Diante desse cenário, três aspectos fundamentais devem ser trabalhados para garantir a atração, seleção e retenção de talentos na indústria florestal. O primeiro é o fortalecimento da cultura empresarial e a criação de um ambiente de trabalho mais atrativo. As empresas precisam construir uma identidade forte, baseada em inovação, sustentabilidade e valorização dos profissionais. Criar um ambiente em que os colaboradores se sintam pertencentes e motivados é essencial para garantir não apenas a permanência dos talentos, mas também sua produtividade e engajamento. O clima organizacional tem um papel fundamental na retenção de talentos, e as empresas precisam estar atentas a isso.
O novo profissional deseja se posicionar, ser ouvido e se sentir seguro para expressar opiniões e ideias, independentemente da hierarquia. A segurança psicológica se tornou um fator determinante para o engajamento dos colaboradores. Profissionais que se sentem à vontade para contribuir sem medo de represálias ou julgamentos tendem a inovar mais, propor soluções eficazes e se conectar genuinamente com a organização. Para a nova geração, um bom ambiente de trabalho não se resume apenas a benefícios financeiros ou estabilidade; trata-se de um espaço onde possam se expressar livremente, contribuir para o crescimento da empresa e sentir-se parte de um propósito maior.
Além disso, a felicidade passou a ser um valor inegociável no ambiente corporativo. Não se trata mais de apenas trabalhar para proporcionar felicidade na vida pessoal, mas de ser feliz no trabalho também. O conceito de felicidade no ambiente profissional está diretamente ligado à motivação, satisfação e sentido de pertencimento. Empresas que não compreendem essa nova realidade e insistem em ambientes rígidos e inflexíveis perdem talentos para setores que já abraçaram essa transformação. Os gestores precisam estar atentos a essa mudança e entender que investir no bem-estar do colaborador é investir no sucesso do próprio negócio.
O segundo aspecto é o cuidado com as pessoas e o desenvolvimento profissional. O setor florestal precisa investir na capacitação contínua de seus colaboradores e das comunidades onde está inserido, criando programas de treinamento e qualificação que os preparem para os desafios do futuro. Além disso, é fundamental divulgar mais o setor florestal nas comunidades, despertando interesse e fortalecendo a conexão entre a população local e as oportunidades da área.
Para atrair novos talentos, é essencial desenvolver programas voltados para os jovens, trazendo-os para dentro das empresas, permitindo que vivenciem o ambiente de trabalho e conheçam as evoluções tecnológicas do setor, despertando assim seu interesse na área. Também é necessário repensar as escalas de trabalho, adotando turnos menores que promovam mais qualidade de vida e segurança para os trabalhadores.
A melhoria das condições no campo, como a criação de áreas de vivência mais confortáveis e o investimento em tecnologia e comunicação/conectividade, é outro ponto essencial para garantir um ambiente mais atrativo e produtivo. A evolução de cargos deve ser bem estruturada, permitindo que os profissionais tenham perspectivas de crescimento dentro da empresa.
{Planos de carreira bem definidos, políticas de valorização e reconhecimento e benefícios alinhados às necessidades dos trabalhadores são estratégias essenciais para manter os talentos dentro do setor.
Por fim, a inovação e a tecnologia devem ser vistas como aliadas nesse processo de transformação. A mecanização e digitalização das atividades florestais não apenas aumentam a eficiência operacional, mas também tornam o trabalho menos árduo e mais atrativo para as novas gerações. Embora algumas áreas do setor já tenham avançado significativamente nesse aspecto, a silvicultura ainda depende intensamente de mão de obra.
Apesar da evolução nos processos de mecanização, essa transformação não tem ocorrido na velocidade necessária para suprir as demandas do setor. A adoção de tecnologias como automação, monitoramento remoto e inteligência artificial pode reduzir a necessidade de trabalhos manuais extenuantes e oferecer novas oportunidades para profissionais especializados em tecnologia e inovação. Com isso, o setor pode atrair talentos que, tradicionalmente, não considerariam uma carreira no segmento florestal.
O setor florestal brasileiro enfrenta um dilema crucial: sem uma estratégia robusta para atração e retenção de talentos, o crescimento poderá ser comprometido. É essencial que as empresas do setor, em parceria com instituições de ensino e programas cooperativos, busquem soluções para formar e reter profissionais qualificados. Programas de incentivo, parcerias com universidades, estímulo à pesquisa e desenvolvimento e criação de novas metodologias de ensino para o setor podem ser caminhos viáveis para minimizar essa escassez de mão de obra.
A pergunta que fica é: estamos prontos para adaptar nossa gestão de pessoas ao novo mundo do trabalho? Se quisermos garantir a sustentabilidade do setor florestal, a resposta precisa ser sim e a mudança deve começar agora.