O início do processo de ocupação e consolidação do território brasileiro ocorreu com o deslocamento para oeste e norte de grandes contingentes humanos em busca de ouro e diamantes, seguido pela fixação de parte dessas populações ao longo das trilhas e caminhos pioneiros, consolidando a presença portuguesa e brasileira em todas as regiões e ampliando o território brasileiro, inicialmente delimitado pelo Tratado de Tordesilhas.
Esse processo definiu nossas novas fronteiras e afirmou nossa soberania como nação ao consolidar a incorporação dessas extensas áreas no planalto central e na Amazônia, de valor incalculável pela biodiversidade, solos férteis, clima ameno e topografia favorável.
Na atualidade, a necessidade de preservação pela limitação da exploração econômica desse território rico e frágil se depara com as legítimas demandas sociais de uma população de mais de 200 milhões de habitantes, que não compreende com clareza o seu potencial econômico e estratégico. Para atender aos anseios da população, principalmente a amazônica, é necessário promover o desenvolvimento de uma economia “verde”, baseada em um amplo leque de atividades originadas nos diversos biomas brasileiros, cuja vastidão, complexidade e magnitude da contribuição à economia nacional ainda não são valorizadas em sua integralidade,
principalmente contribuições ligadas aos serviços ambientais, cuja importância é de difícil avaliação por parcela considerável da população brasileira, que não tem como prioridade a limitação do uso com sustentabilidade ambiental, o que impõe a difícil tarefa de conciliar preservação com o desenvolvimento pleno, para proveito das atuais e futuras gerações.
Com uma área total de florestas nativas de 490 milhões de ha e plantadas em 7,8 milhões de ha, o negócio florestal tem faturamento bruto superior a US$ 28 bilhões, gerando ocupação para mais de 7 milhões de brasileiros, direta e indiretamente e pelo efeito renda. A economia florestal brasileira está ainda muito aquém do seu potencial.
A despeito da magnitude dos números, uma comparação com países de economia florestal mais robusta mostra que há enorme espaço para o crescimento, dado o diferencial a nosso favor da maioria dos indicadores do negócio florestal, principalmente pelas taxas de crescimento das florestas plantadas, que hoje suprem a quase totalidade das necessidades da indústria de base florestal, incluindo a geração de energia e a secagem de grãos na agricultura, contribuindo decisivamente para reduzir a pressão sobre as florestas nativas.
Temos que considerar a estratégica contribuição econômica e ambiental das formações naturais, incluindo as áreas preservadas por obrigação legal nos plantios florestais e na agricultura, que são os pilares da manutenção da biodiversidade e dos serviços ambientais, como a produção de água limpa e abundante, estabilidade térmica e redução da poluição atmosférica.
Para a construção de um cenário atraente ao desenvolvimento de uma “economia verde”, há necessidade da implantação de ações que tenham como foco a integração dos diversos sistemas de monitoramento e vigilância já existentes, para que os resultados sejam rápidos, precisos e efetivos na identificação de ameaças e situações que requeiram pronta resposta do Estado brasileiro, como no caso recente de incêndios florestais, provocados por atores que agem na clandestinidade e a quem não interessa o desenvolvimento harmônico e dentro da legalidade; políticas públicas realistas de fácil comunicação, tanto para os atores diretamente envolvidos como ao conjunto dos brasileiros, transmitindo uma clara noção da importância estratégica do uso e da preservação dos recursos naturais; a estruturação de um programa intensivo e abrangente para tratar dos graves conflitos fundiários com delimitação das áreas devolutas e regularização da posse da terra; a criação de equipes multidisciplinares para atender à transversalidade e à complexidade dessas tarefas, envolvendo representantes governamentais, da iniciativa privada, de ONGs e universidades/institutos de pesquisa; reforço das estruturas de comando e de controle responsáveis pelo ordenamento e fiscalização das operações, tanto estaduais como federais, para coibir o uso dos recursos naturais por vias ilícitas, as ameaças às populações locais e a agentes governamentais e a exploração ilegal em parques nacionais, reservas ambientais e terras indígenas; desenvolver mecanismos que permitam aos produtores rurais plantar florestas com fins econômicos e ecológicos, que resultem na produção de madeira e na recuperação dos mananciais, na captura de carbono da atmosfera, na redução do desmatamento e no aumento da biodiversidade local.
Outro ponto crucial, e que é a maior fragilidade do negócio florestal no Brasil, tem como causa a inexistência de um programa de P&D de longo prazo, com metas claras, para o desenvolvimento da silvicultura de espécies nativas nos diversos biomas.
Pesquisas com espécies nativas são conduzidas desde o século XVII, porém esse conhecimento acumulado sobre as diversas espécies necessita ser consolidado, identificar as lacunas existentes e possibilitar a eleição de linhas de pesquisa prioritárias, com otimização do uso dos recursos, sempre escassos. Temos que compreender que o sucesso da silvicultura de espécies exóticas no Brasil, como o pínus e o eucalipto, não aconteceu por acaso.
Foram décadas de investimento conjunto – empresas e universidades, em pesquisa e desenvolvimento. Esse exemplo de sucesso que, em menos de 40 anos, multiplicou por três o incremento volumétrico dessas espécies deve fundamentar a criação de um programa de P&D com árvores nativas, baseado nas diversas espécies brasileiras em cada um dos biomas, que apresentam elevado potencial de retorno social ao fixar as populações nas suas regiões de origem, incentivando a conservação dos recursos florestais, bem como retornos econômicos ao gerar renda e desenvolvimento com o estabelecimento de cadeias produtivas locais.
Áreas possivelmente prioritárias seriam as pesquisas em processos de colheita, seleção e armazenamento de sementes e produção de mudas; uso da biotecnologia, programas de melhoramento genético, técnicas de clonagem e micropropagação; modelos de integração Lavoura-Pecuária-Floresta (iLPF) e Sistemas Agroflorestais (SAFs); modelos para promover a regeneração natural sem/com manejo e mercado para produtos madeireiros e não madeireiros.
Isso posto, há que se observar que o Brasil tem, na comunidade internacional, sempre tão preocupada com a integridade de nossas florestas, importantes parceiros que, todavia, precisam dar uma contribuição mais efetiva em retribuição ao incalculável valor dos serviços ambientais que prestamos ao preservar, por força de lei, mais de 65% do nosso território, com ênfase para a região amazônica, que deve preservar 80% das áreas naturais.
O pagamento por serviços ambientais, por exemplo, seria de grande valia para financiar um amplo leque de ações em P&D. Outro ponto fundamental diz respeito à alternância de comando e das lideranças das diversas organizações e governos, que possibilita o arejamento, a revisão e a alteração das estratégias. Essa deveria ser uma prática constante nos organismos multilaterais e nos bancos de fomento e desenvolvimento nacionais e internacionais e nas ONGs que desenvolvem políticas ambientais e projetos de financiamento nos países-membros.
O cenário atual mostra estruturas formadas há mais de 30 anos – RIO 92, cujo comando permanece o mesmo, gerando uma homogeneidade de atitudes, ações e programas que já não trazem mais resultados conectados com as demandas reais das populações nacionais.