Ministra da Agricultura
Op-CP-39
Como toda crise, a crise hídrica deve ser analisada do ponto de vista da emergência, para solução imediata, e em um retrospecto que permita se verificar suas causas e o papel de cada agente no resultado a que se chegou. Não se trata de vilanizar este ou aquele setor, mas avaliar o uso que, historicamente, se faz da água à luz da demanda pelo recurso e do resultado esperado. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), o setor é responsável pelo consumo de cerca de 70% da água captada.
Os 30% estariam na conta da indústria, com algo por volta de 25%, e do consumo doméstico com os restantes 5%. A agricultura não se furta de fazer parte da solução desse problema que pertence a todos. Sim, é inegável que a produção agrícola demanda grande quantidade de água. É preciso muita água para se produzir alimentos. Para produzir um quilo de grãos, é necessário 1,5 mil litros de água e dez vezes mais essa quantidade para um quilo de carne, segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO). Não há produto ou tecnologia que a substituam.
No entanto é possível se usar melhor o escasso recurso que se tem. É preciso utilizar a infraestrutura e as tecnologias já disponíveis. Na agricultura irrigada, temos que evitar perdas de água nas tubulações e nos canais que conduzem a água de uma fonte até a área agrícola e na distribuição dessa água dentro de uma área agrícola. Até mesmo para a agricultura de sequeiro ou dependente de chuva, há práticas agrícolas que ajudam a conservar a água das precipitações, como o plantio direto e a utilização de curvas de nível na área a ser plantada.
Existem várias tecnologias, que vão desde a medida da quantidade de água existente no solo e de que a planta necessita, passando pela conservação da água no solo, como o uso de cobertura morta (resíduos de cultivos) para diminuir a evaporação, chegando até o melhoramento genético de plantas, que busca variedades mais resistentes à seca. Também se pode praticar a irrigação com déficit, técnica que consiste na aplicação de uma quantidade de água menor que a necessária à planta.
Existem áreas em que a quantidade de chuva não atende à demanda de água de uma cultura agrícola, e, para termos uma produção, temos que irrigar. É o caso de regiões áridas e semiáridas, como o Semiárido do Brasil. Já em outras regiões, como o Cerrado, em sua maior parte no Centro-Oeste, temos chuvas em quantidade que podem atender às necessidades de água de uma cultura, mas somente em parte do ano. Se quisermos produzir o ano todo, temos que fazer uso da irrigação.
Mesmo no período chuvoso, a irrigação pode evitar a falta de água, provocada por possíveis estiagens, e, assim, aumentar a produtividade. É preciso planejar e executar o armazenamento de água durante o período chuvoso ou em cursos de água nos quais isso seja possível. É importante reservar água para a agricultura e, se possível, também para outro fim, como a geração de energia e o abastecimento de cidades e indústrias, o que implica necessidade de uma gestão integrada dos recursos hídricos.
O Brasil ainda tem muito a fazer nessa área. Temos 30 milhões de hectares disponíveis para a irrigação, mas só irrigamos pouco mais de 5 milhões de hectares – um aproveitamento de apenas 17% do potencial. Os números são muito baixos, principalmente considerando que o País possui 12% de toda a água doce superficial do planeta e um potencial de irrigação de até 29,5 milhões de hectares.
É necessário dobrar o território de irrigação nos próximos dez anos, com responsabilidade sustentável e ambiental. Desde 2012, o Plano Safra prevê recursos para isso. Ainda no primeiro trimestre, anunciei R$ 55 milhões para irrigar outros cinco milhões de hectares em todo o território brasileiro, gerando 8 milhões de novos empregos e melhorando os índices de competitividade do setor agrícola. Enfim, a agricultura não pode ser cegamente responsabilizada pela maior fatia do problema. Somos parte da solução. E queremos, junto com toda a sociedade, encontrar caminhos para a sustentabilidade do progresso.