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Denise Hamú

Secretária-geral do WWF-Brasil

Op-CP-22

Nova geração de florestas plantadas: potenciais impactos positivos

O que define um salto na evolução de um setor econômico? Crescimento? Inovação incorporada aos processos produtivos? Engajamento significativo em padrões de sustentabilidade? Aumento de participação no mercado global? O Brasil é o país com a melhor tecnologia para produção de celulose e papel de fibra curta do mundo, além de possuir alta produtividade nas florestas plantadas.

Hoje, há, em média, proteção de um hectare de ecossistemas nativos para cada hectare de floresta plantada, ao menos no setor de papel e celulose – desconsiderando o avanço sobre a vegetação nativa de algum tempo atrás. Outro importante fator relacionado a essa produção refere-se ao reaproveitamento de resíduos e à busca pela eficiência energética, que diminuem, de forma considerável, a demanda por novos recursos naturais.

Muitas serrarias do Centro-Sul do País já alcançam o percentual de 75% de aproveitamento de toda a madeira que retiram. Terra, água e sol podem ser considerados abundantes, se usados com responsabilidade. Assim, é possível ousar no planejamento para aumentar, ou até duplicar, a produção florestal até 2015, sem afetar a produção de alimentos.

Contudo é preciso ter critérios, cuidados e procedimentos que assegurem que não haverá avanços sobre ecossistemas naturais, garantindo apoio à regeneração das florestas nativas e integração social e econômica na escala regional.

Por que uma instituição voltada para a conservação da biodiversidade e para o desenvolvimento sustentável, como é o caso do WWF-Brasil, discute o potencial favorável de um setor com um histórico tão conturbado com o movimento ambientalista, como é o caso do segmento das florestas plantadas no Brasil?

Entendemos que o tema de florestas plantadas pode ser do interesse de sociedades que desejam um processo de produção na direção da sustentabilidade, como tem sido apontado pelos líderes desse setor industrial nos últimos tempos. Nesse novo contexto, como deverá se comportar o setor de florestas plantadas do século XXI?

Como será a próxima geração de florestas plantadas? Na visão do WWF-Brasil, na próxima década, os desafios do setor serão tão grandes quanto as oportunidades. Talvez o fomento florestal seja o maior desafio e a maior oportunidade.

Incentivar a produção florestal em áreas privadas que não sejam das empresas, com especial atenção para a pequena e a média propriedade, pode levar à garantia da sustentabilidade econômica e ambiental, além de incrementar o desempenho do setor na área da responsabilidade social. No passado, as empresas decidiram concentrar a produção em terras próprias.

Essa estratégia diminuía o risco de falta de matéria-prima, bem como justificava os grandes investimentos necessários para a formação da base florestal. Diante do embate com movimentos sociais, tornou-se indispensável repensar o modelo de negócios das organizações florestais. Diante desse cenário, o fomento pode ser uma estratégia acertada para o setor.

No componente econômico, esse modelo permite reduzir o capital imobilizado das empresas em terras, melhorando a competitividade das organizações em tempos de câmbio desfavorável e possíveis crises econômicas regionais nas próximas décadas. Possibilita, ainda, o acesso às linhas de financiamento exclusivas para o pequeno produtor, como Pronaf e Propflora, diminuindo a dependência do capital próprio para a execução de novos plantios.

Ambientalmente, o fomento florestal só faz sentido se incentivar a recuperação de Áreas de Preservação Permanente e Reserva Legal – o mínimo que os requisitos de sustentabilidade exigem. Afinal, oferece ferramentas de gestão, como planejamento da propriedade, economia rural básica e microzoneamento, além de insumos e técnicas mais eficientes de recomposição da vegetação nativa.

Como esses incentivos vêm acompanhados de exigências contratuais para a recomposição, o produtor rural acaba optando por restaurar a vegetação nativa. Ainda no campo ambiental, inicia-se a discussão sobre pagamentos por serviços dos ecossistemas, tais como compensação pela fixação de carbono nas áreas de recuperação ecológica, manutenção da qualidade da água e, talvez, futuramente, benefícios por manutenção e incremento da biodiversidade nas propriedades. Cabe, ainda, observar que, certamente, a sociedade brasileira estará mais aberta a discutir remuneração para pequenos produtores rurais do que para grandes conglomerados empresariais.

Mas é no campo social que o fomento pode apresentar maior ganho. Ao envolver o pequeno e o médio produtor rural, as empresas florestais podem resolver diversos problemas. O aumento da renda do produtor contribui para a redução do êxodo rural e o consequente inchaço das áreas urbanas ou de áreas próximas aos maciços de florestas plantadas.

O fomento tem também o potencial de diminuir conflitos entre movimentos sociais e empresas, uma vez que, via de regra, o alvo principal das organizações que reivindicam reforma agrária são as grandes propriedades e a concentração de terras, na monocultura. A nova geração de florestas plantadas deve eliminar esses problemas. Finalmente, a criação de empregos por meio do fomento é diretamente relacionada à área explorada.

Nas propriedades das empresas, a mecanização florestal reduziu significativamente a oferta de empregos. Seja por intermédio do emprego na propriedade ou do emprego formal nas empresas florestais ou prestadoras de serviços, o potencial impacto social positivo desse modelo não deve ser ignorado. Há possibilidades de potencializar os impactos positivos do setor também por meio da transferência de tecnologia para espécies de árvores nativas.

Somente na Amazônia brasileira, há cerca de 4 mil espécies arbóreas nativas, das quais mais de 600 possuem madeira com características favoráveis à industrialização florestal. Infelizmente, a grande maioria das empresas não tem investido ou apoiado pesquisas com essas espécies. Um bom exemplo é o paricá (Schizolobium amazonicum), cujos plantios no Brasil atingiram cerca de 80 mil hectares.

Segundo o Centro de Pesquisas do Paricá no Pará, a produtividade média da espécie atingiu 20 m³/ha/ano em 2010. Há algumas décadas, uma espécie australiana apresentava desempenho semelhante e, hoje, atinge mais de 120 m3/ha/ano em plantios experimentais e 42 m3/ha/ano em plantios comerciais no Brasil.

Outras espécies nativas, como mogno, maçaranduba e ipê, que possuem alto valor comercial, deveriam ser igualmente pesquisadas e usadas no reflorestamento, com enorme vantagem sobre as exóticas. Na Amazônia Legal, que corresponde a 60% da área do País, mais de 20 milhões de hectares de áreas degradadas precisam ser recuperadas, e esse processo deverá ser feito com uso de espécies nativas. Há outras frentes.

Não há dúvidas de que o Brasil possui o mais abrangente e avançado sistema de melhoramento genético do eucalipto. Mas os desafios ainda são grandes. Nossos plantios requerem grandes quantidades de produtos químicos, alguns deles de uso restrito ou não recomendado pela OMS – sulfloramida, por exemplo, utilizada no combate às formigas.

O melhoramento genético pode ter um papel fundamental no desenvolvimento de híbridos mais resistentes a pragas e a doenças e altamente produtivos em regiões inóspitas, como o semiárido ou áreas sujeitas a geadas intensas e frequentes. Nesse tema, é necessário também ampliar e aprofundar o debate sobre organismos geneticamente modificados – OGMs, principalmente por meio do envolvimento de instituições independentes, que podem dar uma visão mais abrangente sobre eventuais vantagens e riscos dos OGMs.

De um lado, organizações ambientalistas indicam sérias restrições quanto ao uso de OGMs, principalmente devido ao risco de impactos no meio ambiente, difíceis de mensurar. De outro, algumas organizações privadas ou governamentais afirmam que não existe risco. Nesse caso, uma abordagem com o enfoque da precaução – evitar potenciais danos, analisar cuidadosamente as opções, manter flexibilidade nas alternativas futuras é a recomendação do WWF-Brasil. O debate precisa amadurecer e ser aprofundado, com base em conhecimento e na busca de soluções.  

Nas perspectivas atuais, a eficácia de um setor não se mede mais somente dentro de si mesmo. É fundamental que a sustentabilidade exista na relação com os meios onde se inserem as organizações. É também necessária, portanto, a integração com áreas naturais, de conservação ou restauração, e de comunidades locais. Cabe ressaltar que vários limites de perda de hábitats já foram ultrapassados. A conversão de ecossistemas em áreas plantadas não é mais aceitável, exceto em condições e situações muito limitadas e com a compensação adequada.

A comunidade mundial tem expressado seu interesse em caminhar para a sustentabilidade, seja pelas discussões sobre mudanças climáticas, seja pela atenção dada à biodiversidade. Nesses campos, se valorizam cada vez mais as florestas. Mas já não são aceitas as florestas plantadas que consomem ecossistemas naturais.

Com a crescente demanda por áreas naturais pela sociedade e pelos fóruns mundiais, o setor florestal brasileiro se destaca, não só pela possível integração de áreas plantadas com remanescentes naturais, mas também diante da possibilidade de recuperação de paisagens naturais. Claro que esse potencial só será uma realidade se o planejamento da conservação for colocado em primeiro plano, o que não impede o desenvolvimento do setor florestal.

Nesse contexto, a participação de governos e sociedade civil é crucial para o planejamento ligado à conservação. Os processos de uma nova geração, sustentável, de florestas plantadas demandam a reorientação dos profissionais do setor, bem como o envolvimento dos produtores rurais. Considera-se que a capacitação técnica adequada seja requisito fundamental para o cumprimento de metas de conservação no setor produtivo.

Além disso, após a recente crise econômica mundial, várias empresas do segmento florestal têm anunciado investimentos expressivos para o aumento da produção. Diante desse cenário, especialistas preveem dificuldades para suprir a crescente demanda por mão de obra especializada. Apesar da valorização dos profissionais, os cursos de formação de engenheiros florestais e outros profissionais da área florestal parecem ser insuficientes, e isso se reflete diretamente na ampliação da produção.

A demanda não se restringe apenas à formação superior. Técnicos desse setor têm atingido um grau cada vez maior de especialização. Diante disso, investimentos em formação técnica e superior são primordiais para se evitarem obstáculos ao desenvolvimento do setor. O WWF-Brasil vem acompanhando essas discussões e tem colaborado com orientações para diversos setores produtivos, inclusive o florestal, de maneira que metas de conservação possam ser alcançadas, sem prejuízos à produção.