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Nelson Barboza Leite

Diretor da Teca Consultoria

Op-CP-37

O fomento florestal e o fio de bigode

A silvicultura brasileira, há algumas décadas, preconiza a necessidade de se aumentar a base de florestas plantadas. Grandes empreendimentos industriais cresceram e se consolidaram com madeira, cruzando estados e viajando milhares de quilômetros. Entra e sai governo, e sempre é lembrada a necessidade de se criarem políticas públicas para se aumentar as áreas plantadas.

Muito de nada e nada de tudo, e a área plantada continua próxima de 6 milhões de hectares. E ainda, com certeza, boa parte dessas áreas, agora reformadas, herdadas dos plantios incentivados lá nas décadas de 1960/1970. Há de se considerar também que, até alguns anos atrás, as estatísticas mostravam que não chegava a 30% a quantidade de áreas reflorestadas que não estivessem ligadas diretamente aos grandes consumidores de madeira.

Só nos últimos anos, surgiram os grandes investidores e a formação de ativos florestais independentes. Uma novidade, que ainda não teve tempo para mostrar seus reflexos no mercado de madeira. Na verdade, a silvicultura brasileira não conseguiu usar o fomento florestal como alternativa efetiva para aumento de suas áreas plantadas. Uma alternativa tão comum em outras atividades rurais, mas que, na silvicultura, encontra inúmeras restrições para se firmar, mesmo com casos de muito sucesso no passado.

A Duratex, outrora localizada em Jundiaí-SP, talvez se constitua no melhor exemplo de uma indústria que viveu décadas, praticamente, em função de seu trabalho de fomento na região. Mesmo depois de se transferir para outra localidade, se alguém quiser saber o porquê da existência de tantas propriedades na região com eucaliptos, é só perguntar aos antigos produtores, e a resposta está na ponta da língua: “foi o trabalho do ‘Seu Rensi’, que ensinava plantar, doava mudas e ainda garantia a compra da madeira por preço justo”.

O Eng. Antonio Sebastião Rensi Coelho, merecidamente festejado e respeitado no setor florestal brasileiro por tantos feitos em sua brilhante carreira profissional, é o próprio “Seu Rensi”, lembrado por centenas de produtores regionais. Com sua equipe de excelentes colaboradores, constituiu-se o “pai do fomento florestal da Região de Jundiaí e municípios vizinhos”.

Um trabalho de sucesso e de valor incalculável à Duratex, que rodou décadas com a parceria de leais produtores e sem necessitar de grandes investimentos na aquisição de terras. Na região, não há quem não se recorde, e com muita saudade, do respeito e comprometimento que, naquela ocasião, “a empresa do ‘Seu Rensi’ mantinha com seus fomentados”.

Há quem diga que era voz corrente na empresa: “o contrato é uma formalidade necessária, mas a garantia de seu cumprimento é o fio de bigode das pessoas envolvidas”. Respeito às pessoas e ao que foi tratado, sempre! Essa foi a receita de um programa de fomento bem-sucedido. E aí fica a pergunta: por que deu certo numa empresa, e a história não se repete com mais frequência?

Talvez, respostas ouvidas na mesma região de produtores mais novos sobre o interesse no plantio de eucalipto em parceria com outras empresas possam dar alguma indicação: “Nem pensar, eles aparecem aqui, prometem mil maravilhas e somem. Lá na frente, se eu não me transformar em problema jurídico, eles aparecem com mil desculpas e, como se estivessem ainda fazendo um grande favor, oferecem um preço miserável pela madeira”.

São situações contrastantes e ricas de informações que necessitam de registro e se tornam desafiadoras para quem deseja implantar um programa de fomento florestal. Os tempos mudaram... novos investidores, novas demandas, novos valores... mas parece que a necessidade de se aumentar as áreas plantadas não mudou. E, com certeza, repensar e buscar alternativas criativas para fortalecer o fomento florestal continua sendo um desafio para o crescimento da base florestal brasileira, com mais inclusão e participação da sociedade, mais distribuição de renda e menor concentração fundiária.

A silvicultura dos dias atuais apresenta características bastante peculiares. Nas áreas tradicionalmente produtoras de madeira, onde se concentraram as grandes indústrias – estados da região Sul e Sudeste –, é praticamente impossível o crescimento das áreas plantadas, na medida em que se necessite de aquisição de terras. Os valores são elevadíssimos, e os empreendimentos florestais tornam-se inviáveis economicamente.

Essa situação é menos preocupante, pelo menos no curto prazo, naquelas regiões de menor tradição em silvicultura. Na verdade, os atuais baixos preços de terra e a futura e inevitável valorização têm sido importantes atrativos aos investimentos florestais nas novas fronteiras. Contudo tanto nas regiões já desenvolvidas, quanto naquelas em que o desenvolvimento está chegando, sempre haverá possibilidade de se otimizar a ocupação das terras com a introdução da silvicultura nas propriedades rurais.

E essas oportunidades, se devidamente aproveitadas, ainda poderiam garantir substancial crescimento das áreas plantadas, mesmo nas regiões bem desenvolvidas. Há de se pensar, no entanto, em alternativas de fomento que criem, de fato, uma relação comercial segura para as partes envolvidas. Há muitos investidores interessados em aplicar em florestas, há financiamentos disponíveis, e os conhecimentos tecnológicos já não se restringem às grandes empresas.

Garantia de mercado, rentabilidade assegurada e até alternativas de participação nos grandes empreendimentos industriais são mecanismos que precisam ser elaborados de maneira que criem motivação aos investidores em florestas. Criar oportunidades para que produtores independentes se consolidem na cadeia de produção é um passo gigantesco para diminuir as pressões sociais e ambientais contrárias à silvicultura brasileira e, acima de tudo, é o melhor instrumento para manter a competitividade de nossas florestas. Pena que a indispensável credibilidade dos processos de parceria, em tempos modernos, foi substituída por um calhamaço de documentos, cuja eficácia, ainda continua longe de se comparar ao famoso “fio de bigode” dos tempos lá de trás.