Me chame no WhatsApp Agora!

Roberto Smeraldi

Jornalista e Diretor da Amigos da Terra - Amazônia Brasileira

Op-CP-16

O alvo móvel

A pergunta mais frequente à qual ainda sou obrigado a responder – em entrevistas, palestras e reuniões – é ainda aquela clássica “como resolver o conflito entre conservação e desenvolvimento?”. Ora, se os geradores de opinião na sociedade estão ainda se questionando sobre essa suposta dicotomia, é indício de que sustentabilidade está ainda longe da pauta, para a maioria dos atores econômicos.

Se houver um conflito – e há, claro, é evidentemente entre desenvolvimento e devastação, nunca entre desenvolvimento e conservação, pois a segunda é condição necessária, embora não suficiente, para o primeiro. Já imaginou um desenvolvimento baseado na destruição do capital natural? Seria uma contradição. Eu nunca vi.

Outro indicador importante da distância entre a realidade do mundo empresarial atual no Brasil - com as devidas exceções que confirmam a regra - e a sustentabilidade, reside no fato de que a maioria, até hoje, cria departamentos ou gerências de sustentabilidade, outra grosseira contradição conceitual. Por definição, sustentabilidade é algo que só pode estar no centro do negócio, sem qualquer dimensão setorial. O único possível gerente de sustentabilidade é o CEO da empresa.

O resto é conversa para boi dormir. Muitos até inserem a sustentabilidade dentro da área de marketing, ou do vago conceito de responsabilidade social empresarial, algo que é exatamente o contrário de sustentabilidade: significa que a empresa assume que seu negócio impacta negativamente a sociedade e resolveu fazer alguma boa ação para não se tornar tão antipática aos chamados stakeholders.

Nem acredito naqueles que pregam a teoria dos passos progressivos, ou seja, que se começaria com responsabilidade social para avançar rumo à sustentabilidade. Balela. Se você escolhe o caminho de dar sobrevida a atividades obsolescentes, não escolherá aquele da inovação, pois não dá para fazer as duas coisas ao mesmo tempo, ou, pelo menos, nunca vi isso acontecer até hoje.

Buscar sustentabilidade significa fazer aquilo que um dos maiores economistas do século passado, Schumpeter, revelava nos anos 40 como essência do negócio: renovar o mesmo por meio de uma destruição criativa. Nesse sentido, sustentabilidade pressupõe ser mais competitivo, dando prioridade à eficácia em vez da eficiência, e adotar uma noção completa e abrangente do conceito de capitalismo, incluindo capital manufaturado, natural, humano, financeiro e social.

Muitos acham que a atual crise é do capitalismo, errando: é de um capitalismo manco, que desconsidera e despreza aspectos essenciais do capital. O setor florestal é um bom exemplo, aliás, dos melhores. Uma grande oportunidade de desenvolvimento para o Brasil está justamente na economia florestal. Só que estamos ainda reproduzindo – mesmo quando chegamos a padrões ótimos ou bons de manejo da floresta – um modelo que não agrega e não se torna hegemônico por meio da formação de arranjos produtivos, de cadeias, de indústria.

A economia florestal integrada deve ser abrangente, associando produtos a serviços e, assim, maximizando o valor da floresta. Além disso, deve avançar para as novas fronteiras da tecnologia, como a biomimética, a imitação da natureza, com a qual se vai definir a vantagem competitiva ao longo deste século. Pensar economia florestal só como metros cúbicos de madeira – mesmo que com corretos certificados FSC – não significa ainda sustentabilidade, e sim apenas uma boa prática, que, porém, nem necessariamente sabe competir com as atividades que convertem a floresta.


Continuo bastante convencido de uma definição que lancei num livro de 2004, o primeiro Manual de Negócios Sustentáveis (sairá neste ano uma nova edição, na qual aprofundo e amplio esta discussão): a sustentabilidade nada mais é do que um alvo móvel, que apresenta o desafio de tentar sempre se aproximar dela, sem nunca atingi-la. Isso porque, na medida em que você se aproximar do alvo, as condições que permitem a sustentabilidade já terão sido alteradas pela evolução da sociedade. É essa a visão dinâmica, de atualização permanente, que deveria finalmente pautar o debate. Sustentabilidade é para quem tem garra e determinação de liderar e assumir uma inovação radical, não para quem deseja publicar volumosos relatórios em papel reciclado com criancinhas sorrindo.