Pesquisadora da Embrapa Agroenergia
Op-CP-38
Coautoras: Cristiane Vieira Helm e Patrícia Raquel Silva, Pesquisadoras da Embrapa Florestas
Com a industrialização e o aumento do poder de compra de todas as camadas sociais da população, surge a necessidade de produção cada vez maior de energia, na forma de combustíveis e energia elétrica. Segundo a Empresa de Pesquisa Energética Brasileira, em 2013, 41% da produção de energia brasileira originou-se de fontes renováveis, o que coloca o Brasil em uma posição de destaque mundial.
Embora o País apresente esse panorama favorável, não é possível a substituição total da matriz fóssil pela renovável. O aumento na demanda por energia, associado às recentes e contínuas descobertas de novas reservas fósseis, torna cada vez mais realista o conceito da integração das matrizes fóssil-renovável. O Brasil produz o álcool combustível mais competitivo do mundo, oriundo da sacarose contida na cana-de-açúcar.
No entanto, o cenário energético atual não permite que os países fiquem restritos a poucas opções de biomassas, principalmente quando existe um grande potencial para sua diversificação, como é o caso brasileiro. Uma opção interessante, mas ainda em fase de estudos e desenvolvimento em bancada, é o etanol a partir de biomassas florestais.
Elas se enquadram na categoria dos materiais lignocelulósicos, assim como a palha de cana-de-açúcar, que, neste ano, passou a ser matéria-prima para produção do biocombustível em escala comercial, com a inauguração da primeira planta do hemisfério sul, a GranBio (Alagoas). O setor florestal nacional apresenta grande potencial competitivo por possuir uma das melhores tecnologias do mundo para a implantação, o manejo e a exploração das florestas de eucaliptos.
Isso amplia o potencial de participação dessa biomassa no mercado de bioprodutos e de agroenergia, além das aplicações convencionais de papel e celulose, carvão vegetal e lenha. Nas últimas quatro décadas, o País tem investido na ampliação da área de florestas plantadas. Em 2012, havia, no Brasil, 6.664.812 ha de florestas com eucalipto (76,6%) e pinus (23,4%), segundo o Anuário Estatístico 2013 da Abraf - Associação Brasileira de Produtores de Florestas Plantadas.
A Embrapa Agroenergia e a Embrapa Florestas, em parceria com outras unidades da Embrapa e instituições de ensino e pesquisa, estão desenvolvendo um projeto que visa à obtenção de derivados energéticos a partir de biomassa florestal. Nesse projeto, existem linhas de pesquisa de produção de etanol combustível tanto a partir da biomassa florestal virgem como de resíduos da indústria de papel e celulose.
No primeiro caso, o objetivo é avaliar a qualidade tecnológica de madeira pré-tratada para obtenção do álcool, por rota biotecnológica, testando-se diferentes espécies florestais. Para ser convertido a etanol, o material deve passar por uma etapa inicial de pré-tratamento para “afrouxar” a ligação da lignina com a celulose e a hemicelulose.
É nessas duas últimas que encontramos açúcares que, na etapa seguinte, a hidrólise enzimática, tornam-se disponíveis para a fermentação a etanol. Dois processos de pré-tratamento da biomassa estão sendo avaliados no projeto citado: a explosão a vapor e um tratamento alcalino baseado no conceito de polpação Kraft. O processo Kraft é, atualmente, o mais utilizado no Brasil para a produção de polpa de celulose e poderia ser adaptado para a obtenção de etanol e outros produtos de interesse.
Isso possibilitaria às indústrias de celulose atuarem como biorrefinarias, podendo direcionar sua produção conforme o cenário econômico atual. Outras vantagens associadas a esse processo alcalino de pré-tratamento para a produção de etanol seriam: o aumento da disponibilidade de carboidratos com menor formação de inibidores para as etapas posteriores, além da menor geração de efluentes devido ao reciclo de químicos já existentes nas indústrias de papel e celulose.
A lignina poderia ser aproveitada para a geração de energia, assim como já acontece no processo industrial de polpação, ou ser direcionada para a obtenção de químicos e materiais de maior valor agregado. O pré-tratamento por explosão a vapor tem sido indicado como uma das opções mais eficientes no fracionamento de biomassa lignocelulósica.
Esse processo hidrolisa as hemiceluloses, além de modificar parcialmente a lignina presente. Nesse tratamento, o vapor é aplicado à biomassa contida em um vaso fechado e, dessa forma, penetra no interior da biomassa, que fica pressurizada. Sob pressão e temperatura desejadas e após um tempo definido, ocorre descompressão instantânea, causando fragmentação do material e facilitando a etapa posterior, que consiste na hidrólise enzimática.
As enzimas utilizadas no processo de hidrólise serão produzidas por diferentes grupos da Embrapa que trabalham com o tema, e os resultados, comparados aos obtidos com enzimas comerciais. Em relação à produção de etanol utilizando resíduos da indústria de papel e celulose, pretende-se avaliar diversos tipos de subprodutos sólidos gerados por esse setor que apresentem potencial de conversão em etanol, por conterem teores significativos de celulose.
Exemplos são os lodos gerados no processo de reciclagem de papel, cuja quantidade pode chegar a uma tonelada de lodo úmido por tonelada de papel produzido. A principal vantagem de seu aproveitamento seria o fato de essa matéria-prima não necessitar de pré-tratamento, por já ter sido submetida a um tratamento prévio das fibras durante o processo de produção do papel.
Outro ponto positivo é o custo negativo desse material, considerando que se trata de um resíduo que tem sido, normalmente, depositado em aterros, demandando grandes investimentos e áreas de estocagem. Nesse sentido, pretende-se avaliar a viabilidade de produção de etanol a partir de resíduo da indústria de papel, com o objetivo de minimizar custos e impactos ambientais associados à sua destinação, bem como ampliar a possibilidade de produção do bioetanol.
Também serão estudadas aplicações para os resíduos gerados nos processos de hidrólise e fermentação. Com base nos dados obtidos, serão feitas análises econômicas e financeiras preliminares dos novos processos propostos para a produção de etanol. Atualmente, os custos associados à obtenção desse biocombustível a partir de materiais lignocelulósicos ainda são mais elevados do que os envolvidos na produção do etanol de primeira geração.
Isso se deve a gargalos tecnológicos, como a necessidade de etapa adicional de pré-tratamento e os custos associados às enzimas hidrolíticas. No entanto esperamos que, com os avanços tecnológicos obtidos nas pesquisas e mudanças no cenário econômico, social e ambiental, a biomassa florestal possa se tornar mais uma alternativa viável para a produção de etanol no futuro.