Presidente da Voith Paper
Op-CP-17
No setor de papel e celulose, a crise passou pelo seu ponto mais crítico, mas deixará suas marcas. A profundidade será diferente em cada região do mundo, mas elas serão indeléveis. O consumo de papel nas principais economias desenvolvidas caiu drasticamente, chegando a mais de 20% em alguns países. Para os maiores fabricantes internacionais de papel, a consequência dessa queda foi devastadora.
Causou enormes prejuízos às maiores empresas americanas e conduziu algumas delas à concordata. Na Europa, as grandes empresas verificaram significativa redução dos lucros e até mesmo prejuízo. Houve fechamento de unidades produtivas e consolidação de empresas. Mesmo na China, houve paralisação e postergação de investimentos.
A modificação dos volumes de consumo e a consequente queda dos preços do papel estão demarcando uma nova realidade. Hoje, muitos analistas consideram improvável, nessas economias mais desenvolvidas, o retorno do preço e do volume de produção aos patamares anteriores. Mas houve algumas raras exceções.
Empresas que previram a mudança na geografia do consumo mundial e que se prepararam sofreram pouco com a crise. Na economia brasileira, a queda no consumo do papel foi menor. A redução do consumo de celulose, aliada à redução dos estoques das principais empresas consumidoras para gerar liquidez, gerou parada geral desse mercado no início da crise. O Brasil, por ter grandes exportadores, recebeu dois impactos distintos.
O primeiro, gerado pela redução drástica de receita, aliada à abrupta desvalorização cambial e à falta de liquidez, resultou em perdas enormes nos hedges de exportação. Em alguns casos, o impacto foi amplificado devido à utilização de derivativos cambiais. O segundo ocorre neste momento. O volume exportado se aproxima, em toneladas, ao registrado antes da crise, mas sem melhorar a rentabilidade dos produtores, pois não tem havido elevação do patamar inferior de preço estabelecido durante a crise.
Mesmo com preços mais baixos e com custo mais elevado, devido à revalorização do Real, o setor continua competitivo. O cash cost médio de US$ 220/ton para a produção de celulose é imbatível, mas a crise reduziu, com raras exceções, o ímpeto de crescimento dos produtores da América do Sul. Estes necessitarão de alguns anos para se recuperarem financeiramente e mais alguns para readquirirem a confiança para voltar a investir.
Gostaria de comentar também que o setor de bens de capital, participante ativo da cadeia de suprimentos, tem dado competitividade ao setor de papel e celulose. Bastante desenvolvido e com alta tecnologia, tem se preparado durante anos para fornecer máquinas, equipamentos e mão de obra especializada, para possibilitar a instalação, na América Latina, de modernas plantas de produção de papel e celulose.
As máquinas para o setor de celulose e papel estão incluídas em grandes projetos, cuja duração média é de 1 a 2,5 anos. Esse setor, no início da crise, passou por dificuldades nos projetos que já estavam em andamento. O fluxo de caixa dos investimentos passou a ser controlado com mãos de ferro. Setores que trabalham com projetos de média duração não são, normalmente, atingidos fortemente no início da crise, mas sim no meio ou no final dela.
No início, estão trabalhando nos projetos já vendidos, mas, depois, quando estes vão sendo terminados, têm dificuldades para vender novos projetos para repor os que tinham em carteira. Historicamente, essa dificuldade foi amenizada pela vulnerabilidade financeira do Brasil nas crises. A moeda sofria desvalorizações importantes, que permitiam, ao fornecedor brasileiro, compensar a falta de mercado interno com exportações. Mas esta crise tem se apresentado de forma distinta.
Não está ocorrendo esse efeito anticíclico, pois a desvalorização cambial foi de menos de 10%, e isso reduz a competitividade externa dos exportadores. Além disso, moeda sobrevalorizada em uma economia aberta afeta negativamente as decisões de investimento interno. Em um projeto para instalação local de uma máquina de papel, a valorização da moeda eleva os valores de serviços e materiais, como montagem e construção civil, em comparação aos praticados em outros países, e isso inviabiliza o investimento.
Essa elevação de custo, somada aos problemas já conhecidos e tão debatidos de nosso país, tais como a taxação excessiva sobre investimento, a logística complicada e cara, a burocracia exagerada, entre outros, elimina a vantagem competitiva do nosso baixo custo de matéria-prima. Por fim, o investimento é postergado ou é direcionado a outros países.
Perde o Brasil, perdem os brasileiros. Por essas razões, considero existir uma ameaça iminente para o setor de bens de capital. Ele se desenvolveu exemplarmente nas últimas décadas, mas, como a crise está apenas começando para ele, muitas empresas ainda podem sucumbir ou mudar de direção, abandonando o mercado de papel e celulose para se tornarem fornecedores de equipamentos para setores que se apresentam como ilhas de prosperidade, como mineração, petróleo, etc.