O tema "os rumos da mecanização versus a escassez de mão de obra" está cada vez mais presente nas rodas de discussão do setor florestal, pois, de um lado, é possível ver que o setor demanda o desenvolvimento de novas tecnologias e, por outro, não está fácil encontrar mão de obra disponível.
A tecnologia florestal está em constante evolução e a demanda mundial de sustentabilidade desafia, cada vez mais, o desenvolvimento de soluções que emitam menos carbono, possuam maior eficiência energética e otimizem a operação, tanto no quesito custo quanto em ergonomia, métodos produtivos e segurança.
Nesse cenário, enxergo três desafios quando se fala de mão de obra:
1. disponibilidade ou escassez;
2. qualificação e
3. custos.
No primeiro ponto, nota-se que está cada vez mais difícil contratar pessoas dispostas a trabalhar no campo e os bons profissionais são realmente disputados pelas companhias. No segundo desafio, vemos diversas iniciativas isoladas de qualificação de mão de obra, um esforço junto a instituições de ensino, mas uma ausência de estruturação e adoção de metodologias integradas de preparo dessa mão de obra. O terceiro desafio é o que mais impacta o valor total da madeira colhida, pois, por uma questão inflacionária de conjuntura econômica, o custo de mão de obra tem aumentado ano após ano.
Além disso, com o advento das novas tecnologias, o avanço da mecanização, a digitalização dos processos, eletrificação das máquinas e, num futuro próximo, podemos ter a operação florestal remota; é evidente, então, que o perfil do profissional florestal também está mudando. Saímos de profissionais que antes possuíam uma alta demanda de trabalho manual e pesado para gerenciadores de máquinas e dispositivos. Com isso, se não tivermos um preparo adequado desse profissional, será muito difícil conquistarmos essa transição de forma eficaz.
Hoje é possível ter até três gerações trabalhando na floresta, com históricos diferentes e habilidades também distintas. Isso traz inúmeros ganhos para as empresas. Mas, ao mesmo tempo, é preciso que todos tenham a capacitação contínua necessária para atuar na forma como o mercado está exigindo.
Eu tenho refletido muito sobre o papel de cada agente do setor florestal na formação dessa mão de obra especializada. Vejo que temos iniciativas isoladas de qualificação. Explico: as empresas de base florestal investem em centros próprios de treinamento, as indústrias fabricantes também possuem seus investimentos próprios para transmissão de conhecimento e algumas instituições de ensino, como por exemplo a escola técnica de Ortigueira-PR e alguns cursos ofertados pelo Senai-SP, também possuem suas iniciativas de qualificação, vislumbrando o aumento da demanda do nosso setor.
Porém, acredito que o mercado brasileiro carece de uma metodologia de ensino e profissionalização da mão de obra para o setor florestal e, nesse viés, vejo que o caminho seja a colaboração.
Um possível caminho a seguir: Quando falo em colaboração, quero aqui acionar todos os agentes do mercado florestal: associações e entidades de classe, empresas, fabricantes, instituições de ensino, governos municipais, estaduais e federal. Precisamos nos unir para organizar a capacitação dessa mão de obra ao nível nacional, assim como os grandes países produtores florestais da Europa.
Na minha opinião, podemos começar analisando criticamente o nosso CBO (Código Brasileiro de Ocupação) para Operadores de Mecanização Florestal, registrada sob o número 6420-10. Precisamos vislumbrar as mudanças no perfil profissional que citei acima e atualizar as atribuições dos operadores, conforme a evolução da profissão no campo.
A partir disso, na minha opinião, deveríamos percorrer um caminho ao lado do Ministério da Educação, criando oportunidades de cursos técnicos e personalizados para que as pessoas interessadas no setor possam ter acesso ao conhecimento. Toda essa articulação política poderia vir de uma organização da classe, por meio de associações. Juntos teremos a força necessária para conquistar esse degrau importante para qualificação da mão de obra atual e também para o futuro.
Modelo brasileiro de operador florestal: Qual seria o modelo ideal para sairmos dos centros de treinamentos isolados? Deveríamos criar um modelo brasileiro de formação do profissional florestal. Eu, como parte de uma empresa fabricante, sei que estamos disponíveis a enviar delegações brasileiras para conhecer o modelo europeu.
Por exemplo, na Finlândia, onde existe um dos modelos de escola de formação para operadores e mecânicos florestais, os interessados ficam por dois a três anos em capacitação. No primeiro ano, mecânicos e operadores têm uma instrução muito semelhante e, nos anos seguintes, se distinguem entre as duas profissões.
Aqui no Brasil vivenciamos uma realidade florestal muito diferente dos países nórdicos, é verdade. Mas, sobretudo, é urgente a adoção de um método de ensino eficaz que valorize a profissão e que mostre, não só aos jovens, mas também para quem já está no mercado de trabalho, que o meio florestal é extremamente importante para o futuro, que envolve tecnologia e, acima de tudo, é seguro.
É urgente porque sabemos que, quando falamos em educação de base, ela não resolve o problema de qualificação que existe no dia zero de implantação. Porém, quanto mais tempo esperarmos para criar e aplicar esse modelo, mais tempo teremos essa lacuna na formação desses profissionais.
O pontapé inicial: Estamos muito perto de conseguir implantar o nosso modelo e superar os três desafios que citei no começo do artigo. Temos uma forte influência política de uma associação de classe. Com ela, temos todas as grandes empresas que demandam essa mão de obra qualificada, sejam as empresas florestais, ou as fabricantes de máquinas, todas elas com o mesmo desafio.
Temos o capital. Todas as empresas envolvidas nesse processo já têm dinheiro sendo aplicado. Se fizermos isso de uma maneira estruturada, talvez usando uma instituição de ensino, como, por exemplo, o Senai (cito o Senai porque tem capilaridade e está praticamente em vários municípios onde temos operação florestal), ou outra instituição, podemos ter grande sucesso.
Portanto, se conquistarmos essa organização, com os grandes produtores de celulose, os fabricantes de máquinas florestais, o lobby político que a nossa associação de classe pode ter em Brasília; somado a um com eventual parceiro, como uma instituição de ensino, teremos todos os elementos necessários para superar os três desafios.
Somado a isso, temos ainda as escolas europeias que têm muito interesse em apoiar iniciativas como essa e na transferência de conhecimento no ponto de vista de metodologia de ensino, programa de ensino. Elas se dispõem a prestar consultoria para criar um modelo brasileiro e também para aprender mais sobre as nossas necessidades.
Com isso eu provoco: Vamos nos organizar e criar um modelo brasileiro de educação técnica florestal?