Gerente de Pesquisa Florestal e Meio Ambiente da ArcelorMittal BioFlorestas
Op-CP-35
Nunca me esqueço de um professor na universidade que me disse que todo processo que não está ligado a um avanço tecnológico está fadado a desaparecer. E, realmente, ao longo dos anos, vários exemplos do nosso dia a dia nos mostram tal realidade; um dos que eu cito e que marcou toda uma indústria foi a transição da máquina fotográfica convencional a filme para a tecnologia digital.
A própria criadora da máquina convencional desenvolveu a tecnologia digital, mas não acreditou que ela pudesse ter sucesso, então a concorrente encarou trocar o “velho” pelo “novo” e emplacou a tecnologia que utilizamos hoje. Esse processo de substituição do “velho” para o “novo” é conhecido como processo de “destruição criadora”, em que a figura do empreendedor é de fundamental importância para a concretização do processo de inovação (Schumpeter; Jacobson).
Ainda bem que o setor florestal tem muitos exemplos positivos de inovação e de melhorias para citar: o avanço no controle de pragas e doenças; a definição e a diversificação de material genético e domínio nas práticas de clonagem; a elevação da produtividade – em poucas décadas –, a produtividade passou de 12m3t/ha para 40 m3t/ha, assim como a redução dos custos de implantação, em mais de 50% nesse mesmo período; a adoção de práticas silviculturais ambientalmente corretas; a incorporação da variável “impacto social” nos projetos, contribuindo para o desenvolvimento regional; a disseminação da importância do bom manejo florestal; a gestão de áreas de preservação de florestas nativas (Preservação Permanente e Reserva Legal) da ordem de 2 milhões de hectares; e um banco genético bastante completo das espécies de eucalipto e pinus existentes no mundo, contando, inclusive, com material já extinto em suas áreas de origem.
Os exemplos citados são o resultado de um grande investimento público e privado nos últimos trinta anos na indústria de base florestal, inicialmente com os recursos advindos dos incentivos fiscais. Com o fim dos incentivos fiscais ao reflorestamento/florestamento, em especial a partir de 1989, uma nova tendência na evolução tecnológica da silvicultura brasileira surgiu. Antonangelo e Bacha relatam que, a partir do final da década de 1980, houve uma melhor distribuição dos trabalhos entre todas as áreas de pesquisa (manejo, melhoramento genético, produção de mudas, controle de pragas e doenças, adubação, mecanização e controle gerencial).
Além dessa melhor distribuição dos trabalhos, teve início também uma maior preocupação com pesquisas que proporcionassem eficiência, isto é, diminuição de custos, aumento da produtividade, maior qualidade e maior competitividade. Destaco dois grandes exemplos de parceria universidade pública-empresa no Brasil: a Sociedade de Investigações Florestais (SIF), na Universidade Federal de Viçosa, que completa, em 2014, 40 anos de serviços prestados ao setor florestal, e o Instituto de Pesquisas Florestais (IPEF), na Esalq/USP.
De acordo com Labate, a parceria universidade pública-empresa é o grande diferencial para o futuro dos estudos científicos no Brasil, colocando o País em vantagem no cenário mundial. Ao longo desses anos, as empresas investiram em sistemas de gestão integrada, aperfeiçoaram seu planejamento estratégico, realizaram inovações tecnológicas, porém ainda há muito a ser desenvolvido para que possamos ampliar nossa participação no mercado mundial, no qual, diga-se de passagem, temos a melhor produtividade florestal e o menor custo de madeira posto fábrica.
É interessante destacar que esse avanço tecnológico não ficou restrito às grandes empresas florestais, as quais, através, principalmente, de seus programas de fomento florestal, transferiram suas práticas para os produtores florestais como sendo um produto final entregue à sociedade, no momento em que ele se torna um instrumento facilitador de desenvolvimento econômico regional. Por que falar de ciência, tecnologia e inovação?
As tendências globais nos mostram um aumento da população, até 2050, em 9 bilhões de pessoas, uma competição acirrada pelo uso da terra e um aumento da pressão sobre os recursos naturais; estima-se que, em 2050, serão necessários 250 milhões de ha de florestas plantadas para atender à demanda mundial. Plantações bem manejadas serão uma alternativa para superar desafios: a ciência e a tecnologia serão o grande diferencial competitivo entre os países em um curto intervalo de tempo.
A ciência e a tecnologia no âmbito nacional de florestas plantadas têm dois fenômenos atuais os quais estão intimamente ligados com os desafios futuros que necessitarão de respostas técnico-científicas: o primeiro deles é a globalização, e o segundo, que considero crítico, são as mudanças climáticas.
Ocorrências de doenças emergentes e insetos exóticos cada vez mais ameaçam a produtividade e a sustentabilidade das plantações comerciais de eucalipto, isto é devido ao crescente movimento global de pessoas e produtos – às vezes, sem intenção, pessoas sem conhecimento do assunto transportam sementes, mudas ou outros propágulos vegetativos contendo tais vetores.
Conforme detalharam Paine e Daane (Accumulation of Pest Insects on Eucalyptus in California: Random Process or Smoking Gun): “Entre 1983 e 2008, mais de 16 pragas de insetos australianas de eucalipto se estabeleceram no Estado da Califórnia. Os modos ou vias de introdução nunca foram determinados, no entanto, exames de diferentes padrões temporais e espaciais sugerem que as ocorrências foram processos não aleatórios.
É possível que eles ocorreram por causa do aumento do comércio e dos movimentos de pessoas, mas também há a hipótese de que houve introdução intencional”. Em termos de mudanças climáticas, nossos melhoristas e ecofisiologistas terão que se empenhar no desenvolvimento de materiais genéticos tolerantes à seca, ao frio e aos ventos; para isso, novos cruzamentos deverão ser realizados com espécies muitas vezes não tradicionais na eucaliptocultura nacional.
A quantidade de variabilidade genética que ainda existe para ser testada é imensa, e, em tempos de discussão sobre OGM’S, é sempre importante lembrar que a transformação genética pode ser uma alternativa, mas não substitui o melhoramento genético clássico.
Além de pragas, doenças e melhoramento, outros temas na produção de florestas plantadas ainda precisarão de muito desenvolvimento tecnológico, os quais destaco: formação de plantios e regeneração, biotecnologia, hidrologia, sistemas agroflorestais e tecnologia da madeira.
Outros desafios tecnológicos, como a redução dos gases de efeito estufa, a melhoria na eficiência de uso dos recursos, a redução na perda de habitats e o aumento de área e produção, também deverão constar na agenda dos pesquisadores. Aliado a tudo isso, o setor ainda precisará se fortalecer no desenvolvimento de novos modelos de negócios, assim como aperfeiçoar o rastreamento de cadeias de valores, buscando critérios de sustentabilidade.
As demandas e as prioridades de ciência e tecnologia florestal estão cada vez mais complexas e requerem soluções inter e transdisciplinares. Para aumentar as chances de sucesso, devemos implementar projetos em redes de pesquisa, integrando os esforços de várias instituições nacionais e internacionais; avaliar os efeitos na árvore, ao nível da paisagem e à escala local e regional; priorizar a solução dos problemas alinhados às demandas econômicas e sociais; investir na formação profissional, sendo urgente a inserção de novos pesquisadores e silvicultores nos desafios técnico-científicos presentes e futuros da silvicultura nacional.