Diretor Industrial na Aperam South America e Presidente do Conselho da AMIF - Associação Mineira da Indústria Florestal
A produção florestal brasileira vive um momento de transformação. Líder global no setor, o País precisa agora responder a uma nova equação: aliar eficiência silvicultural, sustentabilidade e foco nas demandas do mercado. Mais do que produzir em larga escala, o desafio é garantir que cada hectare cultivado entregue valor ao cliente final e faça sentido para a sociedade.
Produzir madeira com alto rendimento por hectare continua sendo um objetivo central, mas os critérios de sucesso estão se modificando. A produtividade florestal, hoje, está diretamente ligada à previsibilidade de entrega, à adequação às especificações do cliente, à rastreabilidade da produção e à governança de toda a cadeia de valor.

A cultura agrícola florestal passou a ser vista como o ponto de partida de uma cadeia integrada que precisa operar em sintonia com as exigências de um respectivo mercado. As métricas de produtividade levadas em consideração atualmente estão muito longe de serem avaliadas somente como volume de madeira por hectare produzido; para este contexto necessitamos vislumbrar o negócio em que estamos inseridos e o que realmente fará a diferença dentro da cadeia produtiva de um determinado produto. A ideia deste texto consiste em contextualizar uma visão mais específica da siderurgia integrada com produção de carvão vegetal.
Produção de carvão vegetal para siderurgia: Um dos modelos de negócio que temos no Brasil é a siderurgia integrada, onde as siderúrgicas utilizam carvão vegetal para abastecer os seus Altos Fornos. Este modelo coloca o Brasil em destaque na produção de aço sustentável.
O produto substituto do carvão vegetal é o carvão mineral, o qual, por sua vez, não é um produto renovável, sendo derivado do petróleo e, quando utilizado pelos Altos Fornos, emite uma grande quantidade de CO2 para a atmosfera. Ao contrário do carvão mineral, o carvão vegetal, oriundo do cultivo da cultura agrícola do eucalipto, apresenta um balanço positivo na emissão de CO2, pois as florestas plantadas neutralizam praticamente todo o CO2 emitido pelos Altos Fornos.
Este balanço positivo retira da atmosfera em torno de 2,9 toneladas de CO2 por tonelada de gusa, através da manutenção dos plantios florestais, da realização de fotossíntese pelas florestas plantadas e das vegetações nativas que são preservadas nos projetos. Hoje, para cada hectare de florestas plantadas de eucalipto, temos em média 0,6 ha de preservação de vegetação nativa.
Além dos atributos ambientais, estes plantios florestais levam desenvolvimento para as regiões onde estão inseridos e fomentam cada vez mais o crescimento sustentável das regiões. Devido a todos estes atributos, várias empresas que possuem uma governança que pratica e compartilha todos estes valores na cadeia de produção se posicionam como produtores de aço verde.
Plantando a floresta com foco no cliente: Neste modelo voltado à produção de carvão vegetal através do cultivo da cultura agrícola do eucalipto, podemos destacar diversos paradigmas que foram quebrados ao longo do tempo, muitos deles por não terem o negócio do aço inserido no planejamento e que tinham somente a visão da produção de madeira por hectare.
Nos dias de hoje, podemos visualizar um melhoramento genético voltado para características que ofereçam um melhor rendimento nos Altos Fornos da indústria do que volume de produção de madeira por hectare propriamente dito. Temos clones desenvolvidos e direcionados exclusivamente para produção de carvão vegetal. No passado, os clones eram multifunção e não eram especializados como hoje. Desta forma, temos visto materiais genéticos (clones) com maior densidade, outros que possuem menor tempo de secagem no campo (naturalmente), clones que possuem menos galhos nos troncos e várias outras características.
O espaçamento entre plantas tem sido uma ferramenta poderosa para que possamos especializar cada vez mais os plantios, pois podemos determinar o diâmetro e o formato do tronco. Tudo isso aliado a uma nutrição e um manejo florestal exemplares que devem trazer diversos benefícios que irão conferir ao carvão vegetal uma excelente resistência mecânica, granulometria média e carbono fixo ideais para o rendimento dos Altos Fornos.
Vale destacar que as necessidades dos Altos Fornos variam de empresa, capacidade e setores de atividade (produção de aço, produção de ligas, etc.); para cada situação, são exigidos diferentes clones e práticas silviculturais e de produção de carvão vegetal.
Atualmente o carvão vegetal é um insumo importante nas matrizes de custo de diversos tipos de aço, pois podem chegar a 30-40% do custo total. Desta forma, a sua eficiência afeta diretamente a competitividade da cadeia produtiva dos aços. Pensar no cultivo da floresta desde a escolha do melhor clone até o rendimento do carvão vegetal nos Altos Fornos é um pilar importante para garantirmos a competitividade do negócio.
Tecnologia a serviço da previsibilidade: Ferramentas de sensoriamento remoto, Big Data, Inteligência Artificial, dentre outras, estão sendo integradas à gestão dos negócios, e em nosso setor da agroindústria florestal não é diferente. Com o objetivo de antecipar riscos e otimizar os processos, estas novas soluções permitem um planejamento mais assertivo e/ou mais eficiente, pois podem fornecer informações para uma virada de chave e/ou novos cenários, além de conectar os diversos elos da cadeia, garantindo um tempo de resposta mais ágil e assertivo.
A interface entre a floresta que produz o carvão vegetal e a indústria que produz o aço é fundamental para uma logística eficiente. Como exemplo temos a classificação e o blend das cargas de carvão conforme a necessidade dos Altos Fornos, levando em consideração a qualidade do carvão produzido.
Integração e interfaces de processos até o cliente: A colaboração entre os diversos processos da cadeia produtiva (da muda até a bobina de aço entregue ao cliente), abrangendo os processos logísticos, industriais e comerciais, passa a ter um papel fundamental na performance das empresas. Ao mesmo tempo que necessitamos de uma excelente relação cliente-fornecedor, também precisamos de uma colaboração madura, pois atualmente, com os cenários mudando a todo o momento, o tempo de resposta passou a ser crucial nos negócios. Ter flexibilidade e rapidez são diferenciais que podem definir as empresas de sucesso.
Essa integração permite alinhar objetivos, clarear metas e antecipar gargalos e garantir que as empresas estejam em sintonia com as necessidades dos clientes.
Clima, mão de obra e a moeda da sustentabilidade: Entre os fatores que mais desafiam o setor estão os eventos climáticos extremos, como estiagens prolongadas e chuvas irregulares, que afetam diretamente o desenvolvimento das plantações e a qualidade das matérias-primas como o carvão vegetal.
A presença de novas pragas e doenças também exige vigilância constante. Soma-se a isso a dificuldade crescente de encontrar mão de obra qualificada e não qualificada para operações no campo e na indústria.
Desta forma, buscar um manejo sustentável, clones resistentes à seca e um manejo baseado em técnicas de conservação do solo e da água nunca foram tão importantes.
Por outro lado, investir em educação e desenvolver as comunidades onde atuamos é fator preponderante para reforçarmos o presente e construir o futuro. Precisamos olhar para as competências necessárias e agir através de parcerias para que possamos estimular e suprir estas competências.
Os clientes que compram aço ainda não entendem e ainda não pagam pelos benefícios da produção de aço via utilização de carvão vegetal, por isso, transparência e comunicação clara são fundamentais para que os atributos deste modelo de negócio sejam cada vez mais reconhecidos e atestados pela sociedade.
Produzir com sustentabilidade é, acima de tudo, ser reconhecido como tal. A comunicação deve ser estratégica e com propósito, e o discurso tem de estar alinhado com as práticas. A sustentabilidade não é mais um diferencial e sim um atributo que precisamos ter em nossos negócios.
Enfim, o olhar sistêmico e crítico em toda a cadeia de valor da siderurgia e, ao mesmo tempo, o entendimento do que é importante para os clientes finais tornarão a agroindústria florestal cada vez mais estratégica e efetiva. Acredito que, no futuro próximo, o nosso aço verde possa receber o carimbo social e que este participe integralmente na construção de um mundo melhor para se viver.