A pauta de escassez de mão de obra no Brasil não é novidade, visto que, há um bom tempo, se discute sobre esse tema, mas é certo que atualmente esse assunto se intensificou com a ampliação dos projetos florestais, nos quais a oferta de mão de obra, especialmente a rural, está extremamente crítica.
Esse déficit traz desafios importantes e urgentes para as empresas, que precisam executar o planejamento de ampliação e manutenção dos projetos florestais, além de garantir o abastecimento das suas fábricas. A implementação de ações ousadas, como a mecanização das operações, é necessária, principalmente com foco nas atividades de silvicultura, visto ser a maior demandante de mão de obra neste momento.
Mesmo que algumas empresas já tenham avançado de alguma forma com a mecanização, em maior ou menor escala, estamos sempre correndo contra o tempo, uma vez que, com o investimento florestal dos grandes players, a disputa por mão de obra aumentou consideravelmente, trazendo a necessidade de ações estratégicas do ponto de vista operacional e de gestão de pessoas.
Para falar sobre esse tema de escassez de mão de obra, vemos como oportuno trazer à tona a necessidade de definição de estratégias das áreas de Recursos Humanos e de Treinamento e Desenvolvimento, que antecede a execução das estratégias operacionais. Para ganhar performance operacional, muito se busca o desenvolvimento de máquinas e implementos.
Porém, muitas empresas se esquecem que o maior diferencial está em quem “comanda” esses equipamentos, fazendo investimentos robustos em máquinas e pouquíssimo em desenvolvimento de pessoas. Cada função requer um perfil adequado de colaborador, o que traz maiores probabilidades de se extrair o máximo do “conjunto” máquina e operador. Se isso não for levado em consideração, teremos performance menor e, consequentemente, maior demanda de mão de obra, o que está na contramão da situação atual.
Logo, definir com base em dados concretos as soft e hard skills necessárias para cada função deve ser o ponto de partida para maximização da mão de obra disponível. E isso tem de ser considerado na entrada de colaboradores no menor nível hierárquico das empresas, pois esses cargos devem “oxigenar” as demandas internas de postos mais complexos, o que requer a definição de estratégias já no processo de Recrutamento e Seleção, atraindo e selecionando colaboradores com potencial para ocupar outras posições, sendo fundamental para fortalecer a cultura da empresa e reduzir a demanda de mão de obra mais especializada no mercado.
O foco deve estar nas características comportamentais, uma vez que a parte técnica pode ser repassada pelos colaboradores seniores de cada função, sendo uma alternativa de valorização do quadro interno. Percebe-se com isso que não podemos pensar em mecanização sem pensar em pessoas.
Superada a questão do perfil do colaborador para suportar a mecanização, o desafio continua, afinal, é preciso contratar esse colaborador, e as dificuldades se tornam ainda maiores. A disputa entre os empregadores está acirrada e, de certa forma, até desleal, prevalecendo, muitas vezes, o poder econômico das empresas, que têm definido salários e benefícios acima do normal. Mas temos a convicção de que isso não é tudo, pois ainda há a necessidade de encantar e desenvolver o colaborador para que ele queira permanecer na empresa.
Dessa forma, o diferencial se inverte, entrando em cena a essência maior que é a liderança de pessoas, na qual o dinheiro não é mais o fator preponderante. É necessário confiança, proximidade, empatia, humildade, vulnerabilidade, enfim, é preciso foco na experiência do colaborador. Ou seja, contar apenas com o poder econômico não é mais suficiente, felizmente. Considerando o nível de mecanização das atividades da silvicultura brasileira, percebemos o horizonte de oportunidades que ainda existe neste setor.
Podemos confirmar essa afirmação através do levantamento realizado, em 2022, pelo PCMAF - Programa Cooperativo sobre Mecanização e Automação Florestal, que avaliou o nível de mecanização da silvicultura das empresas parceiras deste programa e outras que foram convidadas, totalizando 20 empresas, um extrato muito significativo das florestas plantadas no Brasil.
As operações foram divididas em oito níveis, variando de manual (níveis 1 e 2), semimecanizada (níveis 3 e 4), mecanizada (níveis 5 e 6) e automática (níveis 7 e 8). No geral, o grau de mecanização por nível ficou conforme demonstra o quadro em destaque.
Como pode ser visto, ainda estamos no nível 2, ou seja, essencialmente manual. No levantamento, foram consideradas as operações de preparo de solo, plantio, adubação, controle de matocompetição, controle de pragas e condução de brotação, mostrando a profundidade e representatividade da pesquisa.
Diante disso, a mecanização não pode ser vista mais como uma alternativa, mas como uma regra. E percebemos que nunca tivemos tantas alternativas como neste momento. Para todas as operações florestais, nós já dispomos de, pelo menos, uma alternativa de mecanização.
Agora, é necessário apostar e entrar no processo para contribuir com o desenvolvimento, caso contrário, os resultados serão postergados e a disputa pela mão de obra disponível continuará acirrada e cada vez mais cara. A mecanização deve ser vista como alternativa para ganho de escala, garantia de execução do planejamento operacional e estratégico, acesso a áreas antes inviáveis para o plantio econômico de florestas, melhoria considerável das condições de trabalho, etc.
Isso proporciona oportunidades de otimização dos custos operacionais, sendo hoje o grande desafio para implantação da mecanização, pois ainda está latente a comparação com os custos das atividades manuais, mesmo com a ausência de mão de obra para realizar tais operações, como o que ocorre com o plantio manual, um dos maiores demandantes de mão de obra atualmente.
Os desafios futuros são ainda maiores em relação ao processo de Recrutamento e Seleção, pois as gerações atuais estão impondo condições que são incompatíveis com o ambiente e a realidade das operações manuais. Diante disso, mecanizar também significa ter uma esperança de atraí-los. Máquinas com tecnologia embarcada cada vez melhores e mais interativas, operações realizadas remotamente, treinamento com simuladores e com realidade virtual, uso de inteligência artificial para otimização das operações, uso de drones, entre outros, são exemplos que podem atrair a geração atual.
Mas tudo isso não será suficiente se o ambiente de trabalho não for acolhedor e tiver um propósito maior, o que novamente se remete ao foco em pessoas e na experiência do colaborador.
Portanto, o processo de mecanização não acontecerá apenas com o desenvolvimento de máquinas, terá de ser pensado, construído e executado com a participação intensiva da área de gestão de pessoas. Logo, a empresa que não considerava a área de Recursos Humanos um setor estratégico, terá de transformá-lo com a máxima urgência.