As alterações globais no planeta serão proporcionais às demandas que a população crescente fará sobre os ecossistemas. As matérias-primas, a água, o ar, a biodiversidade e os ecossistemas terrestres estarão pressionados ao máximo. O planeta está caminhando, a passos largos, para seu limite sustentável. Assim, o desempenho do setor florestal deverá ser visto frente aos desafios e oportunidades que estarão postos para todos os setores da economia.
Nesse sentido, o desenvolvimento tecnológico no setor florestal tem perspectivas muito interessantes para o médio e longo prazo, no atendimento das necessidades dos consumidores a partir da utilização inteligente e sustentável dos recursos naturais. Pensadores mundiais sobre o setor de base florestal apontam-no como um ator chave na construção de uma sociedade de base biológica (biobased society). Com inteligência competitiva, deveremos ser ponta na bioeconomia.
Dentro das várias visões que estão sendo estabelecidas para o futuro do setor de base florestal, três pontos são muito importantes na construção da nova estrada tecnológica, que facilitará a caminhada dos que nele trabalham ou que dele dependem. Em primeiro lugar, está a necessidade de um melhor conhecimento dos fenômenos que ligam fibras com outras fibras e com outros componentes, visando ao desenvolvimento de novas estruturas com pouco peso e maior funcionalidade.
Isso vai exigir uma intensiva pesquisa nas áreas de biotecnologia, nanotecnologia e ciência de materiais. Em segundo lugar, é preciso gerar tecnologias de fabricação e processamento que reduzam drasticamente o consumo de energia e de material, o que vai exigir um maior entendimento de propriedades físico-químicas relevantes, bem como de requerimentos das unidades de processamento. Em terceiro lugar, o desenvolvimento do setor deverá se pautar pelo fato de que ele, a sociedade e a natureza são interdependentes.
Ou seja, o manejo florestal sustentável das florestas e das plantações florestais comerciais, considerando todos os serviços ecossistêmicos que possam produzir, será um pré-requisito. Desse modo, ecologia, hidrologia e climatologia serão ciências básicas essenciais. Do ponto de vista científico, a inovação do setor dependerá de uma ciência de excelência, com cientistas bem treinados, dinâmicos, criativos e em quantidade suficiente.
Além disso, serão imprescindíveis empreendedores e empresas inovadoras apoiadas por um suficiente investimento em pesquisa e desenvolvimento. Assim, o setor poderá avançar em áreas importantes, como nanotecnologia, biotecnologia, tecnologia a laser para avaliação dos recursos florestais, desenvolvimento de materiais avançados visando à produção de multiprodutos, biocombustíveis, geração de produtos farmacêuticos e, ainda, nos sistemas de reúso e de reciclagem.
Confesso que, a esta altura do texto, fui tentado a enveredar na análise das tendências puramente científicas. Tratar de assuntos como propagação clonal; seleção assistida por marcadores; engenharia genética; genômica; fitorremediação; uso do laser no planejamento das operações florestais, na valoração econômica das florestas, na medição de crescimento florestal, na estimação de biomassa e nos danos sofridos por florestas e plantações florestais; biorrefinarias; uso da madeira na construção civil, etc.
No entanto, encantou-me a abordagem da principal tendência que deverá ter o setor para conviver com sucesso nesta nova sociedade em formação: biobased society. Nessa nova sociedade, a tendência é que as indústrias baseadas nas florestas e nas plantações florestais comerciais se apoiem na ciência e nas tecnologias para o desenvolvimento de novos produtos e conceitos de serviços produzidos na busca da emissão líquida zero de carbono.
No futuro, as empresas florestais de sucesso, certamente, serão as que estiverem aptas a substituírem um grande número de produtos baseados na energia fóssil e em recursos não renováveis por bioprodutos gerados a partir de recursos renováveis. Assim sendo, o setor de base florestal poderá se constituir um dos setores líderes da nova sociedade. Isso dependerá, no entanto, de nossos formuladores de políticas públicas, de nossos empresários e da percepção que os cidadãos do mundo passem a ter dos novos produtos de base florestal e da importância e responsabilidade postas nas atividades realizadas para obtenção dos mesmos.
Dentro do conceito de bioprodutos, o manejo sustentável de uso múltiplo das florestas e das plantações florestais comerciais será a tendência predominante no setor florestal do futuro. Sistemas de manejo que, além de ofertar bens, possam ofertar, afora matéria-prima, serviços como a conservação da natureza, manejo sustentável de bacias hidrográficas, recreação, preservação do solo e sequestro de carbono. No futuro, para muitos proprietários, a floresta não deverá ser sua principal fonte de renda; os sistemas serão integrados, e tais proprietários necessitarão de abordagens com orientações inovadoras.
Uma orientação que se constituirá uma ponte entre a ecologia da floresta e a disponibilização de produtos e serviços florestais. Novos sistemas de gestão que possam, futuramente, lidar com os objetivos múltiplos e auxiliar gestores de florestas na prestação de serviços ambientais e no crescente aumento nas qualidades e tipos de matérias-primas estão faltando, e será imprescindível a geração dos mesmos para o sucesso do setor. O impacto da governança e regulamentos relacionados com o multipropósito florestal e com a produção de bioprodutos e serviços também precisarão melhor compreensão.
Será necessário, com o tempo, um melhor conhecimento de aspectos tecnológicos, biológicos e de valor baseado na melhoria do planejamento e melhoria do manejo florestal considerando a multifuncionalidade. Os impactos do manejo florestal sobre os ecossistemas deverão ser muito mais bem conhecidos. Também será necessário um esforço para a valorização do setor e dos novos produtos junto à sociedade.
As partes interessadas no setor de base florestal, especialmente os tomadores de decisão, necessitarão compreender melhor o cenário do setor no ambiente internacional. E este parece apontar para uma prevalência de um manejo florestal diversificado e resiliente, gerido de forma sustentável por uma variedade de proprietários, inclusive cooperativos, que, auxiliados por novos sistemas de gestão multipropósito, possam explorar todas as funções da floresta, incluindo a produção de matéria-prima, a biodiversidade e as oportunidades de lazer.
Com a perspectiva do multipropósito, serão requeridas atividades de pesquisa e inovação que possam ir além das técnicas de produção. Haverá, por exemplo, necessidade de que sejam desenvolvidas ferramentas de avaliação e de comunicação eficazes para informar aos decisores políticos a importância dos serviços dos ecossistemas florestais em comparação com outros usos da terra.
Também serão imprescindíveis incentivos para os proprietários florestais privados de pequena escala para gerenciar ativamente florestas e plantações florestais para produção de madeira e outros novos serviços. Outro ponto importantíssimo diz respeito à melhoria do conhecimento dos trade-offs entre políticas de apoio à produção de energia à base de madeira e políticas que apoiam o uso da madeira na construção civil, na indústria de celulose e papel e na indústria de bioquímica e biomateriais, por exemplo.
Por fim, sabedores de que a sociedade tem um profundo valor emocional sobre as florestas, mas ainda desconfia muito das atividades ligadas às plantações florestais comerciais, o setor necessita estabelecer uma estratégia para desatar esse nó. Deverá, cremos nós, fortalecer o apreço pela floresta, mas, ao mesmo tempo, deixar claro para a sociedade que a modernização que tem ocorrido no manejo das florestas e das plantações florestais comerciais garante a produção sustentável e responsável dos produtos nelas produzidos.
Afinal de contas, a maioria de nossas florestas já é certificada por sistemas de aceitação global, tais como FSC and PEFC. Tais sistemas preocupam-se com a sustentabilidade das florestas, com a perda de biodiversidade, e não dá para continuar vendo os conflitos de interesses entre a gestão florestal sustentável e a conservação da natureza persistindo entre os cidadãos no Brasil e no mundo. Melhorar a compreensão pública de que o setor está se esforçando para alcançar e aumentar o envolvimento das partes interessadas será um fator crítico de sucesso. Do mesmo modo, a boa governança do setor deverá estar locada dentro do triângulo interdependente de Estado (leis e políticas), mercados (oferta e procura, preços) e sociedade (grupos de interesses coletivos e indivíduos).