Diretor-presidente da Brasil Florestas
Op-CP-25
Desenvolvimento ou preservação? Crescer para atender à população de hoje ou cuidar para as próximas gerações? Essas são perguntas defasadas e que já não refletem os desafios para se harmonizar o crescimento humano e a vida na Terra. Na realidade, a pergunta correta não deve oferecer escolhas, mas sim partir de um pressuposto único: o desenvolvimento depende intrinsecamente da preservação para ter sucesso.
Os dois conceitos devem caminhar juntos, sob pena de a sociedade comprometer seu futuro, inexoravelmente, seja pela falta de preservação, seja pelo desequilíbrio do desenvolvimento. Vejamos o caso do bioma Mata Atlântica, região onde o Brasil fincou os alicerces do país moderno que hoje é e onde cerca de 70% da população e 80% do PIB acontecem.
Nessa região, onde já existiu uma das florestas mais ricas e diversas do planeta, hoje há menos de 10% das matas originais. O processo de desenvolvimento por que o Brasil passou nos últimos 500 anos – e que não cabe a nós, hoje em dia, fazer julgamento de mérito – removeu o ambiente natural e o substituiu por fazendas de cana, gado, café, além de cidades, estradas, barragens.
Foi com a madeira da Mata Atlântica que fizemos dormentes para os trens levarem o café que fez crescerem regiões como o sul de Minas Gerais e o interior de São Paulo. Tantos pisos de tábua corrida de peroba-do-campo orgulharam nossos avós e tios velhos, e, hoje, só podemos ter na lembrança, pois não mais existe a espécie comercialmente.
A água começa a faltar por conta do desmatamento descontrolado de cabeceiras e margens de rios. O modelo de desenvolvimento que o Brasil adotou para a região costeira fez o País crescer, mas acabou gerando um modelo não sustentável e, portanto, inviável no longo prazo. Crescemos e avançamos, sem fazer a preservação que deveríamos.
Como resultado, temos voçorocas na paisagem de nossas viagens de carro, baixa produtividade nas fazendinhas do interior, riscos de abastecimento de água nas cidades e não podemos fazer mais pisos de peroba-do-campo em nossas casas. De fato, o País cresceu, mas seu desenvolvimento foi comprometido pela falta de atenção à preservação.
Na Amazônia, o modelo de “desenvolvimento” se repete de forma idêntica, porém, com a tecnologia atual, os riscos para as gerações futuras são ainda mais sérios. O ciclo se repete: as madeireiras abrem a mata virgem para cortar árvores, outros ocupam as terras abertas e implantam cultivos e pastos.
No final, o Estado chega para punir – ineficientemente – ou legalizar a ilegalidade, dando, assim, ainda mais força para a ocupação ilegal de terras e os crimes de toda a natureza. Ao final, temos terras improdutivas, e o capital e a tecnologia já foram para outras áreas virgens em busca de recursos naturais abundantes e a baixo custo, perpetuando o ciclo perverso de empobrecimento paulatino e degradação da região.
Outro aspecto do paradoxo “desenvolvimento ou preservação” que precisa ser analisado diz respeito especificamente à preservação em si. Preservação de quê? Desse ente intangível para a maior parte das pessoas que se convencionou chamar de biodiversidade? Dos recursos naturais importantes para nossa vida – água, solos, florestas, minérios? Da qualidade de vida humana atual e futura? Dependendo do complemento à palavra “preservação”, estamos diante de estratégias, atividades e resultados completamente diferentes.
Uma ação voltada para preservar a biodiversidade pode ser oposta aos interesses da qualidade de vida humana, ou vice-versa. O importante não é priorizarmos a natureza em detrimento da humanidade. Ou os recursos para as gerações futuras em detrimento da biodiversidade de hoje. A preservação que buscamos deve ser aquela que nos traz qualidade de vida e harmonia com a natureza e seus ativos naturais. Preservar a natureza e os recursos naturais é uma consequência de termos qualidade de vida, e não o contrário.
Em síntese, não há dicotomia entre desenvolver e preservar. Ao contrário, o desafio é exatamente compatibilizar esses dois processos, sob pena de continuarmos vendo a exaustão dos recursos naturais e o empobrecimento de nossa qualidade de vida. Por fim, é muita presunção que uma espécie, a nossa, acredite ter o poder de alterar substancialmente o rumo da vida na Terra. O planeta Terra já viveu pelo menos três ou quatro grandes ciclos de extinções de espécies, o último há 65 milhões de anos, quando se extinguiram os dinossauros.
É, portanto, no mínimo, arrogância imaginar que essa espécie que existe há menos de 4 segundos – imaginando a história da Terra ter 24 horas – consiga danificar de forma cabal a vida no planeta. Temos, sim, o poder de arrasar a nossa qualidade de vida, caso não comecemos a olhar para o nosso futuro enquanto espécie. Cuide-se, ser humano, desenvolva-se e preserve-se. Quem está correndo risco é você.