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Gláucio Araújo de Oliveira

Procurador do Ministério Público do Trabalho de PR

Op-CP-20

Terceirização ou primarização?

As relações capital/trabalho ao longo de séculos sempre foram protagonistas de eventos que marcaram a evolução humana. Atualmente, em tempos de globalização, quando a economia mundial encontra-se em franco desenvolvimento, as relações de trabalho se fortalecem, ganham relevância, o mercado de trabalho se vê aquecido e se posta à disposição do capital de modo a atender à demanda de cada segmento do mercado.

Recentemente, observou-se uma momentânea retração da economia, denominada de crise econômica mundial. Ocorre que, em curtíssimo lapso temporal, houve uma surpreendente retomada dos processos produtivos. Enfim, as relações capital/trabalho sofreram significativos ajustes, com uma dinâmica jamais presenciada. Essa será a tônica no século XXI, mudanças em curtíssimo lapso temporal. 

Algumas atividades na área rural encontram-se no limiar de um processo, não mais de incremento de aspectos operacionais, tais como inovações tecnológicas e qualificação profissional do trabalhador, mas de afirmação de conquistas de espaços nas suas respectivas áreas de atuação. As atividades de silvicultura e reflorestamento, por exemplo, sofreram significativos processos de desenvolvimento.

Grandes grupos econômicos, não raro multinacionais, estão sedimentando posições ao adquirir extensas propriedades rurais. Para otimizar suas atividades, investem em maquinários de ponta, treinamento de pessoal, concentram as atividades no ramo florestal, conseguindo reduzir os custos operacionais. Nesse cenário, não haverá espaço para empresas de pequeno porte.


Pois bem, aliado a esse crescimento, impera uma conscientização ambiental sem precedentes. Os clientes da matéria-prima ou do produto final exigem conduta exemplar em toda a cadeia produtiva da extração da madeira. Todo processo de automação pode ser devidamente assimilado, e, gradativamente, ele chegará.

No entanto, o que se depara na extração de madeira, é a vertiginosa utilização de mão de obra terceirizada, proveniente de empresas sem idoneidade econômica, que se arvoram de empregadores quando, na verdade, não passam de ex-empregados rurais, muitos dos quais, pasmem, em tempos remotos, atuavam como empregados para a atual tomadora dos seus serviços.

Configura-se, aqui, a intermediação de mão de obra, geralmente acompanhada de relações de trabalho em total informalidade, sem qualquer amparo legal. A grande vilã é justamente a intermediação ilegal, alçada a um posto de maior relevância, notadamente em projetos de venda de florestas em pé.


Ela é a causadora das maiores incidências de infrações trabalhistas no segmento florestal. E, para agravar esse cenário, com a delegação de poderes para as falsas terceirizadas, o dono do negócio acaba perdendo o controle da sua atividade, podendo ser penalizado quando ocorrem flagrantes de precarização das relações de trabalho, como a mídia tem noticiado, em especial quando da existência de casos em que a fiscalização do Ministério do Trabalho e do Ministério Público do Trabalho se depara com situações tipificadoras de condições análogas à de escravo.

Ainda em um processo lento de conscientização e responsabilidade social, lampejam grupos econômicos que estão se destacando por respeitarem a dignidade do trabalhador ao lhe conferir um vínculo empregatício direto, possibilitando que os obreiros tenham aspirações de carreira na empresa. Trata-se da chamada primarização das relações de trabalho, inversão de valores comparada com a famigerada terceirização propagada nas atividades rurais.


Agora, novos métodos de trabalho, amparados na legislação laboral e na Constituição Federal, englobam o compromisso de se assumirem todas as etapas da cadeia produtiva, sob pena de não se dar credibilidade às certificações ou ISOs tão almejados no setor econômico, haja vista que a presença de intermediários inviabiliza a responsabilização por todos os atos praticados no processo produtivo, deixando de conferir autenticidade aos padrões de qualidade conferidos a uma determinada empresa.

Esclarece-se que o fato de uma empresa delegar a terceiros parcela de sua cadeia produtiva não representa ausência de responsabilidade na hipótese de serem constatadas irregularidades no meio ambiente do trabalho dos prestadores de serviços, configurando-se, na esfera judicial, a denominada culpa in eligendo ou culpa in vigilando, quando, não raro, não se cogitar de se fomentar típica precarização das relações do trabalho (condições degradantes do meio ambiente do trabalho) e, na pior das hipóteses, podendo-se caracterizar o trabalho escravo contemporâneo ao se permitir que pequenos empreiteiros, mais conhecidos como “gatos”, exerçam atividade econômica sem ter o devido lastro ou idoneidade econômica.

A tão propalada responsabilidade social no setor florestal não se resume a ações isoladas, manifestações por escrito, inserções na mídia ou adstrita apenas a atos de filantropia. Em uma sociedade democrática, o respeito aos direitos fundamentais do ser humano e a dignidade do trabalhador devem preponderar em relação a qualquer outro interesse do capital.