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Maria José Brito Zakia

Diretora da Práxis Assessoria Socioambiental

Op-CP-31

Gestão compartilhada de território

Colaboração: Karin Rettl e Wilson Stavarengo

Com a evolução do conceito de Sustentabilidade, surgiram novos desafios e obrigações para as empresas florestais, em especial àquelas certificadas (FSC e Cerflor) e de capital aberto. Ganhar em eficiência produtiva deixou de ser suficiente. É necessário contribuir para a melhoria da qualidade de vida de seus stakeholders e criar caminhos para anular as externalidades negativas.

Essa mudança de posicionamento materializa-se globalmente nos processos de planejamento e elaboração de políticas públicas, concretizando-se na forma de leis, normas, certificações e políticas nacionais, regionais e internacionais que regulam todas as etapas da cadeia de valor. Concepção que contribuiu para levar o tema Responsabilidade Social Corporativa (RSC) a fazer parte do planejamento estratégico das organizações.

O desafio estava posto – os modelos de gestão devem permitir que outras partes interessadas tomem parte do seu modelo de governança, influenciando os processos de tomada de decisão e na gestão do negócio florestal. Colocado em uma única frase: era preciso mudar o modelo mental e quebrar paradigmas, ou substituir as generalidades abstratas pelas peculiaridades concretas das populações locais.

Mas como operacionalizar esses conceitos? O PDRT (Programa de Desenvolvimento Rural Territorial) desenvolvido junto e com a área de sustentabilidade da Fibria é uma experiência interessante de gestão compartilhada de território.

É preciso destacar o espírito inovador da equipe de sustentabilidade da Fibria que  acreditou, apoiou e criou  as condições para que a gestão compartilhada do território começasse a acontecer em uma região até então marcada por conflitos.

A Unidade Aracruz da Fibria ocupa uma área de plantio de 202,8 mil hectares intercalados com 128,7 mil hectares de áreas destinadas à conservação, formando extensos blocos de florestais. Esse modelo de ocupação contribuiu para o isolamento de comunidades rurais.

Como essas comunidades têm no acesso à terra sua base de geração de capital social e econômico, a concentração fundiária limitou suas alternativas de geração de trabalho e renda, influenciando no modelo de organização social estabelecido.

O PDRT nasceu em setembro de 2010, com o propósito de qualificar o diálogo entre empresa e comunidades. Partiu-se do princípio que, ao se incentivar a organização de cadeias produtivas, seria possível fortalecer e qualificar os arranjos sociais locais e o protagonismo de seus membros.

Propósito que orientou a definição do objetivo geral do PDRT: “Promover o desenvolvimento de comunidades rurais vizinhas através do fortalecimento das associações comunitárias e suas redes, focando no apoio à suas cadeias produtivas”. O PDRT tornou-se a principal ferramenta de engajamento da Fibria com comunidades rurais vizinhas.

Todo o processo de tomada de decisão passa a privilegiar e a valorizar o protagonismo da comunidade, o desenvolvimento de lideranças legítimas, a construção de capital social, o resgate da cidadania e a autoestima. Em 2010, em versão piloto, 8 comunidades rurais do extremo sul da Bahia foram engajadas no Programa, beneficiando 197 famílias.

A primeira característica inovadora do programa reside na construção de um processo de diálogo com metodologias e ferramentas participativas que possibilitassem:

 

  • conhecer o nível de organização sociopolítica, econômica e cultural dos grupos atendidos;
  • a disseminação desse conhecimento para as outras áreas da empresa, envolvendo-as na compreensão dos problemas, na definição e na implantação de soluções;
  • a construção de uma linguagem capaz de ser entendida pelas comunidades e pela empresa;
  • o exercício de implantar modelos participativos de decisão;
  • a transferência de informações sobre sistemas de manejo alternativos como forma de apresentar oportunidades de geração de trabalho, garantir a segurança alimentar, a conservação dos recursos naturais e a autossuficiência econômica;
  • a transferência de informações sobre os princípios, os objetivos e os canais de acesso às políticas públicas;
  • o estímulo à consolidação de redes locais produtivas como forma de organizar e definir o território.

O processo de engajamento está baseado na organização de um ciclo de diálogos estruturados com o objetivo de definir combinados claros entre os grupos que compõem as organizações de base comunitária e a empresa. Esses grupos podem estar oficialmente constituídos em associações ou cooperativas, ou estar informalmente organizados. O ciclo está subdividido em 5 fases, que se correlacionam.

A primeira fase, o diagnóstico participativo, propicia a coleta de informações, que são sistematizadas, oferecendo um panorama:

1. das necessidades e do tipo de acesso que a comunidade tem a um conjunto de serviços públicos;
2. das questões ambientais relacionadas à forma de ocupação do espaço pela comunidade;
3. da vocação e do potencial econômico das famílias, além dos canais de comercialização e formas de acesso ao mercado.

Na segunda fase, são definidos os objetivos da parceria, que devem ser orientados para o fortalecimento das cadeias produtivas já instaladas. A materialização dos combinados acontece com a elaboração de um plano de ação conjunto. Essa fase também é composta por 3 oficinas de 4 horas de duração, cada uma. Os combinados são sistematizados em um modelo de matriz, especificando:

a. os objetivos de longo prazo da parceria;
b. as metas a serem alcançadas conjuntamente durante o período de um ano;
c. as ações que deverão ser realizadas para o atingimento das metas;
d. o detalhamento das ações em atividades, com definição dos responsáveis;
e. a definição de um calendário de trabalho.

A elaboração dos planos de fortalecimento das cadeias produtivas, terceira fase, é dedicada ao levantamento do perfil econômico de cada família, das práticas de manejo adotadas, das variedades de cultivos e/ou criações de animais e da área disponível. Ao final desse processo, a previsão orçamentária e o cronograma de atividades estarão finalizados e validados.

A quarta fase é a da execução e do monitoramento do Plano de Ação. A quinta fase acontece a cada 12 meses, quando os processos vividos passam por uma avaliação compartilhada e por um replanejamento para um novo ciclo de 12 meses, baseado nas lições aprendidas.

Um dos principais aprendizados registrados relaciona-se à importância de definir indicadores de impacto. Em geral, os programas de investimento socioambiental financiados por instituições privadas e públicas adotam práticas de monitoramento focadas no controle da aplicação dos orçamentos e da execução das atividades planejadas.

O PDRT conta com um sistema de indicadores de efetividade, que, além de qualificar o investimento, oferece informações gerenciais que possibilitam a definição e a gestão de metas, de estratégias de expansão e de correção de rumos, que têm potencializado os ganhos de capital social e o protagonismo das associações de base.

O Sistema de Gestão dos Planos de Ação, aliado aos indicadores, também possibilita a disseminação de informações entre as diferentes áreas da empresa e a instalação de um processo de gestão do conhecimento, que impacta na melhoria contínua de sua operação e na qualificação de sua participação no desenvolvimento local.