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Maurício Dutra Costa e Júlio César Lima Neves

Professores do Departamento de Microbiologia e do Departamento de Solos, respectivamente, da UFV - Universidade Federal Viçosa

Op-CP-77

Estratégias para garantir a produtividade e a sustentabilidade de florestas plantadas
O Brasil possui, atualmente, cerca de 10 milhões de hectares plantados com espécies de Eucalyptus e Pinus, dentre outras. Estima-se que o setor de florestas plantadas seja responsável por uma receita bruta de mais de 260 bilhões de reais anualmente, gerando mais de 2,6 milhões de empregos diretos e indiretos. A pujança do setor tem como um dos pilares o uso sistemático de fertilizantes químicos para a manutenção da produtividade e da sustentabilidade dos plantios.
 
Para atender à demanda nacional, o Brasil importa cerca de 70% da matéria-prima utilizada na fabricação de fertilizantes, tornando-se extremamente vulnerável aos humores do mercado internacional. O setor florestal sofre frequentemente com as flutuações na oferta e nos preços de fertilizantes em função de conflitos geopolíticos envolvendo os países exportadores desses insumos. 
 
Outras preocupações atuais correspondem à queda de produtividade das áreas plantadas e aos efeitos das mudanças climáticas que já se fazem sentir, com eventos mais frequentes e severos de seca. O cenário torna-se ainda mais sombrio com o possível aumento nos surtos de doenças e pragas florestais ocasionados pelo desequilíbrio climático.  

Como melhorar a eficiência no uso de fertilizantes para nos tornamos menos dependentes das importações? Onde buscar novas estratégias que possam ser utilizadas para minimizar os efeitos negativos das mudanças climáticas sobre os plantios florestais? Como preservar a sustentabilidade das florestas plantadas?

A resposta para essas questões pode estar relacionada aos microrganismos associados às espécies florestais. As plantas associam-se com ampla diversidade de microrganismos que estão presentes nas superfícies da parte aérea e das raízes, no interior dos tecidos e no solo próximo às raízes. Esses microrganismos, que constituem o microbioma vegetal, contribuem com informações genéticas adicionais às das plantas e são usadas por elas quando enfrentam as condições ambientais onde vivem. 

Por não apresentarem motilidade, as plantas precisam expressar respostas adaptativas a condições adversas do meio no local onde se encontram. Nessas horas, elas lançam mão do microbioma associado para modular a fisiologia ou alterar a morfologia a fim de superar os desafios que o meio lhes impõe. 

O microbioma vegetal é tão estratégico para as plantas que elas alocam até 40% do carbono que fixam pela fotossíntese para manter a diversidade dos microrganismos associados. Estima-se que, ao longo da evolução, populações microbianas específicas foram recrutadas pelas plantas visando a melhor adaptação e a maior sobrevivência.

Os microrganismos associados podem aumentar a absorção e a eficiência de uso de água e nutrientes, ampliar o sistema radicular, promover melhor enraizamento de estacas, fixar nitrogênio, disponibilizar nutrientes pouco solúveis e aumentar a tolerância das plantas a estresses bióticos e abióticos, a exemplo da seca, temperaturas elevadas, pragas e doenças. Como resultado, ganhos significativos no crescimento e na produtividade vegetal são obtidos, com plantas menos dependentes de insumos químicos. 

O conjunto de microrganismos associados às plantas constitui uma fonte de recursos genéticos ainda pouquíssimo explorada visando o desenvolvimento de soluções biotecnológicas para o setor florestal. Para lançar mão desse recurso, torna-se necessário conhecer a diversidade microbiana associada às espécies florestais, isolar os microrganismos de diferentes locais do corpo da planta de interesse e testá-los quanto à capacidade de promover benefícios ao hospedeiro. Em geral, os testes envolvem a análise da capacidade de promoção de crescimento vegetal, bem como de mitigar os efeitos de fatores estressantes do meio, podendo ser feitos in vitro, em casa-de-vegetação, no viveiro ou no campo.  

Outros fatores que podem ser avaliados correspondem às interações espécie vegetal-microrganismo, clone-microrganismo e microrganismo-ambiente, visando selecionar isolados de compatibilidade hospedeira mais ampla e de maior eficiência em diferentes climas e condições de solo. Os microrganismos selecionados poderão constituir coleção a partir da qual isolados microbianos, individualmente ou em consórcios, poderão ser utilizados em diferentes situações visando a manutenção ou ganhos de produtividade. 

Com os avanços das técnicas analíticas, a engenharia de microbiomas vegetais inteiros tem sido também postulada como forma de melhorar a capacidade de adaptação das plantas ao meio, a produtividade e a tolerância das culturas aos estresses ambientais. Estima-se que os microbiomas das espécies perenes, a exemplo do eucalipto, sejam particularmente importantes para produzir respostas adaptativas às mudanças climáticas no curto prazo, enquanto ainda não houve tempo para que processos evolutivos naturais selecionem plantas mais tolerantes às novas condições.

As formas de se introduzir microrganismos benéficos nos plantios florestais pode ser feita pelo uso de inoculantes, que são produtos ou insumos que contêm microrganismos com a capacidade de promover o crescimento de plantas. Segundo a Associação Nacional de Produtores e Importadores de Inoculantes (ANPII), o setor movimentou cerca de 441 milhões de reais em vendas em 2023, com uma expectativa de crescimento de 17% em 2024. As culturas que mais consomem inoculantes microbianos são, em ordem decrescente, a soja, o milho, a cana, o trigo e o feijão. 
 
Apesar de todo o domínio técnico na seleção e formulação de inoculantes microbianos para a agricultura, a aplicação de microrganismos no setor florestal ainda é incipiente, com número muito limitado de produtos voltados para o controle de pragas. 

Em geral, quando há a oferta de inoculantes para o setor, esta resume-se a produtos que foram desenvolvidos, testados e registrados para outras culturas agrícolas, sem a garantia de eficácia para as espécies florestais. 

Finalmente, práticas de manejo florestal que promovam a conservação da diversidade microbiana podem também contribuir significativamente para a sustentabilidade dos plantios. Na planta, o equilíbrio das populações microbianas melhora o estado nutricional e sanitário dos indivíduos, que passam a requerer menos insumos químicos para sobreviverem. No solo, a manutenção da microbiota gera um círculo virtuoso de conservação do ambiente, onde os processos de ciclagem estarão em equilíbrio, com perdas mínimas de nutrientes e de matéria orgânica. 
 
O papel central da microbiota em contribuir para a estabilização do carbono no solo é plenamente reconhecido na atualidade, sendo essa atividade fundamental, portanto, para balancear as emissões de CO2 geradas pelas atividades humanas.  Atualmente, o microbioma vegetal é identificado como peça-chave para a próxima revolução verde. 

Diante das dificuldades enfrentadas pelo setor florestal, compreender a relevância dos microrganismos para as florestas plantadas e aproveitar este conhecimento para melhorar a produtividade e aumentar a resiliência ao estresse e às doenças, com conservação ambiental, tornam-se estratégia prioritária.