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Gustavo Laporinê Baêsso

Diretor de Operações Florestais da Canopée Gestão Ambiental

OpCP68

Amazônia: projetos de impacto na construção de um planeta sustentável
Coautoria: Rui Pedro Ribeir, Diretor de Desenvolvimento de Negócios - Canopée Gestão Ambiental

Em abril deste ano, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) divulgou a última parte do Sexto Relatório de Avaliação (AR6), onde mais de 270 cientistas de 65 países que compõem o painel demonstraram, a partir da análise de mais de 18 mil estudos científicos publicados, que, para que tenhamos a chance de manter ao alcance o limite de 1,5 °C estabelecido pelo Acordo de Paris em 2016, as emissões de gases do efeito estufa (GEE) devem cessar seu aumento até o ano de 2025.
 
Embora o relatório indique que houve redução da taxa anual de incremento das emissões de GEE no período entre 2010 e 2019, quando comparado com o período entre 2000 e 2009 (média de 2,1% para 1,3% por ano), os esforços conjuntos globais para frear ou mitigar as mudanças climáticas permanecem longe do ideal. Mesmo conseguindo-se atingir o pico de emissões em 2025, o cenário futuro ainda se mostra desafiador: para se manter na meta de 1,5°C, até 2030 as emissões globais precisarão experimentar uma redução na ordem de 43% em relação aos níveis de 2019, ano-base do estudo.

Embora os resultados gerais apresentados pelo AR6 não sejam exatamente novidade para os estudiosos e entusiastas do assunto, a magnitude e a velocidade das mudanças climáticas observadas no mundo e evidenciadas pelo estudo reforçam e acendem um alerta sobre a necessidade de ação imediata, passando por metas mais arrojadas e prazos mais curtos para atingi-las, além do envolvimento e comprometimento de governos e da iniciativa privada, principalmente nas maiores economias do mundo. 
 
Segundo o IPCC, o G-20, grupo das 20 maiores economias do mundo, corresponde a 78% de todas as emissões. Apesar disso, apenas cinco países do grupo se comprometeram com metas de emissões zero a longo prazo. Falando do Brasil, o mais recente relatório do SEEG (Sistema de Estimativas de Emissões de GEE), do Observatório do Clima, indica que a maior parte das emissões brasileiras (46%) se devem à mudança no uso e ocupação do solo, fator associado ao desmatamento, em especial na Amazônia e no Cerrado. E quem conhece ou trabalha na região Norte conhece bem essa dinâmica. 
 
O processo de degradação das áreas florestais e conversão em pasto, mesmo que ilegal em área superior a 20% no bioma Amazônico, ainda acontece com maior frequência que o desejado e indevidamente agrega valor às terras convertidas, que passam a ser negociadas a preços superiores após a redução ou a remoção da cobertura florestal.
 
Nesse contexto, não podemos deixar de reconhecer e ressaltar a importância do Manejo Florestal Sustentável integrado aos projetos REDD+ (Redução de Emissões Decorrentes de Degradação e Desflorestamento Evitado) para auxiliar o processo de preservação das áreas de floresta nativa do Brasil, contribuindo também para a redução das emissões nacionais de gases do efeito estufa. 

A exploração sustentável não apenas dos recursos madeireiros, mas também dos múltiplos produtos provenientes das florestas (bioeconomia), associada à valorização da manutenção da floresta em pé pelo pagamentos de serviços ambientais (dos quais hoje se destaca a valorização da preservação de estoque de carbono através de projetos REDD, mas que no futuro integrarão a valorização de outros serviços ecossistêmicos, como a proteção de recursos hídricos, biodiversidade, solos, beleza cênica, etc.) representa a melhor alternativa para proteger os maciços florestais do avanço da fronteira agrícola, gerando recursos que, devidamente investidos e distribuídos, impactam positivamente a vida de quem depende da floresta para sua subsistência.

A integração dos povos da floresta nos processos de preservação é crítica para o sucesso da implementação dos planos de manejo integrados aos projetos REDD. O desenvolvimento e ampliação de projetos sociais que integrem os povos locais na preservação das florestas é fundamental para o sucesso da manutenção dos estoques de carbono e outros serviços ecossistêmicos e, com isso, garantir uma efetiva contribuição para os objetivos definidos pelos diversos protocolos. Na região Amazônica, vivem mais de 20 milhões de pessoas, a maior parte delas integradas e a viver da floresta. Não canalizar parte do valor gerado pelos projetos REDD+ e Manejo Florestal Sustentável para projetos de valorização e garantia de qualidade de vida dessas populações é fadar ao fracasso todos os esforços de efetivo impacto no planeta.   
 
Sob essa óptica, o Brasil, como maior detentor de florestas tropicais do mundo, deve sabiamente assumir seu papel de protagonista e aproveitar essa seara de oportunidades que se apresentam com o estabelecimento e a consolidação do mercado de carbono. Essas oportunidades passam, inevitavelmente, pelo desenvolvimento de metodologias de quantificação e precificação de serviços ecossistêmicos adaptadas à realidade brasileira (tropicalizadas e adaptadas às idiossincrasias do Brasil e da região Amazônica) e pela capacidade de desenvolver e certificar nacional e internacionalmente, através de entidades globais de certificação, projetos elaborados com o devido rigor científico e que resguardem todos os âmbitos que possam originar passivos associados a ele, de forma a promoverem boa aceitação dos projetos ambientais brasileiros no mercado internacional – onde ainda se encontra a maior demanda por créditos de carbono. 
 
A geração de créditos de serviços ambientais, nomeadamente falando dos estoques de carbono a serem utilizados para neutralização de emissões (ativo ambiental), não pode levar atrelados a eles passivos de outras naturezas, como questões de propriedade das áreas que geram os ativos, trabalhistas, tributárias, ambientais, entre outros. A garantia do cumprimento das mais elementares normas ESG deverá ser a base do uso dos créditos gerados pelos projetos de neutralização de carbono e de selos “Carbono Neutro”. 
 
A tropicalização de metodologias e certificações de carbono devem ser estudadas e desenvolvidas de forma a valorizarem os outros serviços ecossistêmicos não contemplados pelo carbono, além de incorporarem no valor dos créditos gerados parte dos custos econômicos, sociais e ambientais causados pelas emissões de gases de efeito estufa.  

Em todos os casos, não se podem perder de vista as garantias legais, sociais, ambientais e fundiárias primordiais para garantir a elegibilidade de terras e proponentes aos projetos ambientais de geração de valor. Os processos de certificação, além de garantirem a qualidade da condução técnica na aplicação das metodologias utilizadas, devem conferir aos projetos a lisura e transparência exigidas pelo mercado. 

Alcançar o pleno reconhecimento internacional através da qualidade técnica dos projetos ambientais brasileiros é passo fundamental para que o País exerça sua potencial liderança mundial em ações de sustentabilidade.