Coautor: Marcelo Chiabai, especialista em soluções para o setor florestal da Sotreq
Imagine concluir uma operação de colheita florestal e, de imediato, ter acesso a um mapa de produtividade preciso, revelando com clareza quais áreas da floresta entregaram melhor desempenho e quais exigem atenção no próximo ciclo. Imagine, ainda, que essas informações permitem tomar decisões sobre o próximo ciclo de plantio, ajustando o manejo conforme as condições de solo, clima e outros fatores ambientais.
Mais do que uma projeção futura, essa possibilidade já é realidade: as tecnologias embarcadas nos equipamentos atualmente utilizados em campo são capazes de gerar dados estratégicos em tempo real. No entanto, apesar da disponibilidade, essas soluções seguem subutilizadas, representando uma lacuna importante entre o que a tecnologia permite e o que, de fato, é aplicado na gestão florestal brasileira.
No contexto atual, em que o crescimento da produtividade das florestas se tem estabilizado, mesmo com os avanços genéticos e de manejo, o uso de equipamentos adequados, além dos dados operacionais gerados no campo, se torna essencial. As máquinas modernas utilizadas na colheita florestal, como os harvesters, já possuem tecnologia capaz de registrar o volume individual de cada árvore colhida, junto com sua localização georreferenciada. Esses dados, quando organizados, formam uma camada de informação estratégica sobre a produtividade da área.
O cabeçote do harvester, por exemplo, registra automaticamente o diâmetro, o comprimento e, portanto, o volume da tora. Esse volume, cruzado com a posição de cada árvore colhida, resulta em um mapa de produtividade de alta resolução. Esse tipo de recurso, embora esteja embarcado nas máquinas há anos, ainda não é plenamente explorado.
Esse potencial, no entanto, vai além da colheita. Hoje, já existem tecnologias embarcadas para todas as etapas da produção florestal. A seguir, destaco os principais avanços:
Preparo de solo — Tratores de esteira com piloto automático: Esses equipamentos utilizam sistemas de GPS para executar a subsolagem com alinhamento preciso, eliminando falhas humanas e otimizando o uso do terreno. O piloto automático garante consistência na operação e melhora o aproveitamento da área.
Plantio — plantadeiras com georreferenciamento: O plantio mecanizado conta com sistemas satelitais que registram a localização exata de cada muda plantada. Esse dado gera um histórico completo da floresta, árvore por árvore. Essa rastreabilidade cria uma nova camada de controle e análise que pode ser usada ao longo de todo o ciclo produtivo.
Colheita — Harvesters com sensores embarcados e mapeamento georreferenciado: Os harvesters não apenas realizam a colheita e processamento da árvore, como também medem automaticamente o volume, o diâmetro e o comprimento da tora, georreferenciando cada ponto. Isso permite gerar mapas de calor da produtividade e avaliar variações por talhão. Além disso, os forwarders, que fazem o transporte da madeira, contribuem para preservar a estrutura do solo, evitando compactações excessivas.
Essas tecnologias oferecem uma precisão que muda o patamar da operação florestal. Quando bem utilizadas, elas fornecem elementos valiosos para diagnósticos mais rápidos e ações corretivas mais assertivas. A coleta automatizada de dados permite que a gestão se antecipe aos problemas e planeje com base em evidências, e não apenas em estimativas ou percepções de campo.
Ainda existe uma percepção de que adotar tecnologia exige uma ruptura complexa ou investimentos altos. Na prática, há uma gama de ferramentas já embarcadas nas máquinas. O desafio está na estrutura de apoio, como capacitação e integração com os processos existentes. Entretanto, o benefício é claro: ao transformar os dados de colheita em informações estratégicas, é possível avaliar a performance, entender as razões para a baixa produtividade de uma área e aplicar as correções no próximo ciclo.
Um estudo de caso realizado por Rafael Donizetti Dias, publicado na revista AgriEngineering, demonstrou como é possível obter dados de produtividade com alta precisão usando harvesters equipados com sensores e GNSS (sistema de navegação por satélite). O estudo confirmou a viabilidade de se obter mapas de produtividade em nível de árvore individual, além de correlacionar esses dados com atributos do solo, otimizando a recomendação de fertilizantes, por exemplo.
Atualmente, a prática mais comum para avaliar a produtividade de florestas ainda é baseada em inventários manuais com baixa resolução espacial. Esse método, embora amplamente utilizado, apresenta limitações importantes: é demorado, impreciso e não reflete a variabilidade real da área. Já os mapas gerados a partir das máquinas proporcionam informações mais densas e representativas, permitindo ações mais assertivas e sustentáveis.
O setor florestal brasileiro, reconhecido mundialmente por sua eficiência, tem agora a chance de dar um salto significativo, unindo tecnologia à gestão operacional. O caminho é conhecido, o recurso já está nas máquinas, mas é preciso mudar a mentalidade para transformar dado em decisão, informação em inteligência e operação em produtividade.