Desnecessário citar a importância que o setor de base florestal, advinda de plantios, tem na economia brasileira. Os avanços realizados ao longo de aproximadamente meio século foram impressionantes, principalmente no ganho de produtividade em dois gêneros: Pinus e Eucalyptus.
Mas, como qualquer outro setor, o de base florestal passa por mudanças advindas de vários fatores, que já foram reconhecidos pela antiga Abraf – Associação Brasileira de Produtores de Florestas Plantadas, hoje Ibá, em 2012, em um relatório sucinto e interessante, denominado “Planejamento Estratégico do Setor de Florestas Plantadas”.
Nesse relatório, a Abraf fez um gráfico de evolução da curva de maturação do negócio florestal brasileiro, dividindo em 4 estágios: a) introdução; b) formação da base florestal; c) consolidação; e d) operação de classe mundial, sendo que os três primeiros estágios foram definidos como a floresta “vital para suprimento da indústria”, e o último estágio, como a floresta “sendo a indústria”, e mais: em cada um dos estágios, foram apresentados vários fatores que influenciaram para que aquele estágio tivesse sucesso.
Por que esse comentário inicial? Simplesmente porque, para que cada estágio fosse alcançado, profissionais com as devidas qualificações deveriam existir no mercado, pois, obviamente, sem eles, o setor de florestas plantadas não teria tido o sucesso que teve.
Nesse ponto, os cursos de Engenharia Florestal existentes no Brasil conseguiram suprir o mercado de profissionais que apoiassem as empresas nos desafios que existiam. Porém a questão é: esses profissionais estão saindo das universidades com a formação adequada para os desafios do futuro?
Alguns outros pontos desse mesmo relatório podem nos ajudar a responder a essa questão. A própria Abraf coloca como missão “suprir a sociedade com produtos florestais oriundos de florestas plantadas sustentáveis”. Ora, a missão deixa claro que o foco é a sociedade (não a indústria) e deve ser sustentável (ou seja, outros conhecimentos devem ser adicionados para o alcance da missão proposta).
Assim, o profissional deve incluí-los em sua formação, além daqueles que existam anteriormente, tornando-o mais holístico, tendo que ver e, preferencialmente, anteceder o que a sociedade deseja do setor de base florestal, e, portanto, conhecimento na área de humanas torna-se importante para esse entendimento e consequente aplicação de técnicas/tecnologias para suprir a sociedade, somando-se que deve ser sustentável (o famoso tripé econômico/sócio/ambiental).
Ou seja, não há como o negócio florestal contemporâneo querer ser competitivo se não atuar junto com os stakeholders. Portanto somente o conhecimento técnico não é mais suficiente para o profissional florestal. Esse ponto se torna crucial para a boa formação dos engenheiros, e as universidades devem acompanhar essa demanda com mudanças curriculares adequadas para o novo tempo e para as mudanças altamente dinâmicas que ocorrem atualmente.
O primeiro ponto importante se dá na concepção conceitual na formação desses profissionais, que devem entender que o seu papel é, como citado, “suprir a sociedade”, ou seja, verificar qual é o desejo/necessidade das pessoas (sim, é para elas que atuamos) e realizar as florestas de forma adequada para atendê-las (não há como não citar o famoso e simples conceito de demanda derivada, em que a dinâmica do processo vem do mercado final e impacta as várias fases do processo produtivo, e não o inverso).
Por que a mudança no processo conceitual na formação dos profissionais? Porque, por viés colocado já no início da carreira florestal no Brasil, se internalizou que a floresta é o foco do engenheiro florestal, quando, na verdade, o foco do engenheiro florestal são as pessoas, a sociedade, sendo a floresta o seu “instrumento” para conseguir supri-las de forma adequada (famosa maximização da satisfação do consumidor/cliente), pois, se assim não for, a sociedade irá procurar em outro setor/segmento os produtos/serviços que deseja.
Isso já ocorre com vários produtos que poderiam ser de base florestal. É só olhar no seu consumo se não haveria possibilidades de substituir algo por um produto de base florestal, iniciando por sua residência, por exemplo. Obviamente nem todos os sucessos ou fracassos foram determinados por esse profissional, já que o negócio florestal é multidisciplinar, mas, para ele, especificamente, alvo deste artigo, a mudança do paradigma de sua profissão e, por consequência, de sua formação, é fundamental para apoiar o contínuo aumento da competitividade da atividade florestal.
O espaço para o modelo de atuação realizada nas décadas passadas já está ultrapassado. Novos desafios e oportunidades têm aparecido; a sociedade está exigindo, cada vez mais, que, nas atividades realizadas, os componentes social e ambiental estejam presentes, inclusive com mudanças de padrões de consumo, seja ele realizado de forma espontânea ou imposta pelo estado (como exemplo, a recente decisão no Rio de Janeiro de proibir canudos plásticos, o que gera uma oportunidade para o setor de base florestal).
Esses desafios mudam muito rapidamente neste novo mundo altamente globalizado e, portanto, esse profissional deve ser altamente dinâmico para rápida adaptação aos desafios que rapidamente surgem, para dar as respostas adequadas. Assim, a complexidade aumentou, e a competência dos profissionais deve acompanhá-la.Se os currículos da graduação são menos flexíveis, devem esses profissionais procurar estar continuamente complementando seu conhecimento durante sua carreira, principalmente na área de gestão, quesito que é pouco focada na graduação.
Quando falamos em gestão, fala-se de treinamento em como atuar com pessoas – sim as pessoas são o foco, sejam elas internas ou externas à empresa –, atuar com foco nos retornos que a empresa deseja, financeiros e não financeiros, mas que estão intimamente interligados, sendo um consequência do outro.
Devem ser treinados para olhar para o futuro, ou seja, treinados em visão estratégica, planejamento estratégico, até porque o que é realizado hoje terá a consequência no futuro, e, portanto, conseguir entender o que poderá acontecer é fundamental para qualquer atividade, principalmente em um mundo altamente dinâmico.
Iniciativas nesse sentido estão em andamento. Já se verifica que cursos de graduação colocam esse conhecimento em seus currículos, de forma ainda não adequada (até porque deve existir um limite, pelo volume de conhecimentos que deve ser repassado), mas não se verifica a mudança do paradigma da função do engenheiro florestal nessa fase de sua formação.
Onde ocorre, então, a maior dinâmica na complementação desses conhecimentos? Em cursos complementares ainda na graduação, como o realizado pelo IPEF em curso de curta duração denominado “PPGF - Programa de Preparação de Gestores Florestais”, ou cursos de pós-graduação, como o curso de MBA em Gestão Florestal da UFPR, que visa complementar o conhecimento com temas na área de mercados, estratégia, economia e temas atuais que envolvem o setor de base florestal.
Como citou Jack Westboy (engenheiro que trabalhou na FAO) décadas atrás, “Forestry is not about trees, it is about people and it is about trees only insofar as trees can serve the needs of peoples”. Em uma tradução livre “Silvicultura (podemos, então, falar a floresta) não é sobre árvore, é sobre pessoas e é sobre árvores somente se as árvores puderem servir às necessidades das pessoas”.