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Hugo Vitor Gomes Cardoso e Benone Magalhães Braga

Analista de Projetos e Gerente de P&D e Novos Negócios da Aperam BioEnergia, respectivamente

OpCP82

O setor florestal diante do clima em mudança: riscos, adaptação e inovação
As mudanças climáticas deixaram de ser uma abstração ambiental para se tornarem um fator operacional decisivo no setor florestal. 
A variabilidade de chuvas, o avanço de períodos secos, a intensificação de ondas de calor e o risco crescente de incêndios impõem novos desafios ao manejo das florestas plantadas no Brasil. 
 
No Vale do Jequitinhonha, região que já convive historicamente com irregularidades hídricas, essa pressão climática tem exigido uma combinação de ciência, tecnologia e integração entre unidades florestais e industriais para garantir produtividade, segurança ambiental e estabilidade da cadeia de suprimento.

A base florestal, que funciona como pilar e coração das operações industriais da região, passou a demandar estratégias de manejo adaptativo. Rotinas como seleção genética, definição de idade de corte, adubação racional, conservação de solos e manutenção de corredores ecológicos ganham nova relevância diante de um clima mais imprevisível. Em ciclos mais secos, a taxa de evapotranspiração se eleva, o solo perde umidade mais rapidamente e o estresse hídrico pode afetar desde o desenvolvimento do eucalipto até sua densidade básica — um parâmetro essencial para a etapa seguinte da cadeia: a conversão da madeira em carvão vegetal.
 
Esse ponto é crucial, porque a qualidade da biomassa determina a performance metalúrgica. Em um ambiente climático mais instável, o setor florestal precisa garantir que a madeira entregue ao processo de carbonização mantenha padrões consistentes de densidade, umidade e composição. 
 
Variações climáticas não controladas podem resultar em carvão com menor teor de carbono fixo ou maior presença de voláteis, o que impacta diretamente a eficiência dos altos-fornos e a qualidade dos aços produzidos. Isso explica por que a climatologia deixou de ser um dado contextual para se tornar variável crítica no planejamento operacional.
 
Ao mesmo tempo, o clima influencia o próprio ciclo de carbono das florestas. Secas prolongadas reduzem o ritmo de crescimento, diminuem o sequestro de CO? e podem aumentar a mortalidade em áreas mais sensíveis. Alterações no regime hídrico também ampliam o risco de incêndios, que, além de prejuízos ambientais evidentes, representam perdas significativas de carbono estocado. 
 
Assim, a manutenção de áreas nativas, a proteção de nascentes e a criação de zonas de amortecimento não são apenas medidas ambientais: tornam-se parte da estratégia de resiliência frente às mudanças climáticas. O avanço tecnológico tem desempenhado papel central nessa adaptação. A automação dos fornos de carbonização, o aproveitamento dos gases da pirólise e a conversão de alcatrão em bio-óleo exemplificam como a cadeia industrial responde a um ambiente climático mais desafiador.
 
O bio-óleo, derivado da condensação de vapores do processo, emerge como alternativa energética renovável em um cenário global de transição e volatilidade dos combustíveis fósseis. Empresas de setores intensivos em calor, como mineração e metalurgia, já testam e aplicam o bio-óleo como substituto parcial ou total de óleo combustível, reduzindo emissões diretas e ampliando segurança energética frente a riscos climáticos que podem afetar cadeias de suprimento.

Outro desdobramento relevante é o biochar, um material sólido e altamente estável gerado durante a pirólise. Em tempos de maior pressão climática sobre áreas agrícolas, o biochar se torna ferramenta de adaptação, pois melhora a retenção de água no solo, reduz sua densidade e aumenta a estabilidade estrutural. 
 
Além de mitigar emissões por meio do sequestro de carbono de longa duração, ele oferece respostas concretas a uma agricultura que enfrenta solos mais compactados, erosão e maior irregularidade de chuvas — fenômenos amplificados por mudanças climáticas.

Essas soluções não anulam os impactos do clima, mas criam um ecossistema mais resiliente. Tecnologias de monitoramento remoto, inventários de carbono mais frequentes e modelos de crescimento baseados em clima permitem antecipar riscos e ajustar o planejamento florestal. 

Sistemas de certificação e rastreabilidade fortalecem a transparência e a credibilidade ambiental, atributos essenciais em mercados que exigem comprovação rigorosa de desempenho climático.

Em síntese, se antes a floresta era vista como aliada estratégica no enfrentamento das mudanças climáticas, agora ela também precisa ser protegida e adaptada para continuar cumprindo esse papel. 

A interação entre clima, manejo florestal, processos termoquímicos e inovação industrial mostra que a transição sustentável não depende apenas de capturar carbono, depende de garantir que as bases produtivas permaneçam saudáveis, resilientes e tecnicamente capazes de sustentar cadeias industriais de baixo carbono. 

No Vale do Jequitinhonha, essa visão integrada já orienta decisões e projeta o futuro de um setor que precisa se preparar não para um clima estável, mas para um clima em transformação contínua.