O manejo de pragas e doenças do eucalipto enfrenta desafios crescentes. No Brasil, somente nas duas últimas décadas, ocorreu a introdução de quatro novas pragas do eucalipto, causando prejuízos de R$ 1 bilhão. Em abril de 2020, mais uma nova praga foi detectada.
Recentemente, enfrentamos a maior epidemia histórica de lagartas desfolhadoras; surgiram novas doenças bióticas e abióticas e, ainda, precisamos ter um bom manejo para as pragas endêmicas. Mas, afinal, como lidar com todos esses desafios? Para responder a essa pergunta, é necessário estabelecer tecnologias integradas ao processo produtivo, sistêmicas e que possam ser aplicadas para todo o setor florestal, uma vez que pragas e patógenos não respeitam fronteiras.
Apesar disso, é sempre bom lembrar que a ocorrência das mesmas pragas e doenças podem ter impactos muito diferentes, a depender da tecnologia e da estratégia adotada em cada empresa. Na tentativa de contribuir para esse tema, saliento a importância de, pelo menos, dois pilares de sustentação de uma boa estratégia de manejo integrado.
Pessoas e formação profissional: a construção de times engajados, com boa formação técnica e experiência é o ponto inicial de uma boa estratégia. O interessante é que, nessa área do conhecimento, a experiência prática tem tanto valor quanto a formação técnica e científica, uma vez que o adequado manejo de surtos de pragas e doenças depende de uma série de variáveis, dificilmente esgotadas nos cursos tradicionais de formação.
Isso me faz lembrar o início da minha carreira, quando descobri que havia muito mais coisas para aprender do que ensinar, mesmo com um título de doutor debaixo dos braços. Infelizmente, estamos passando por um processo de desaceleração dos cursos de pós-graduação em áreas tradicionais.
Isso começou com a aposentadoria de professores de referência e, mais recentemente, foi intensificado pela mudança do interesse das novas gerações por outras áreas do conhecimento. Tecnologias e governança: precisamos entender que o manejo de pragas e doenças na área florestal enfrenta alguns desafios diferentes, se comparado com áreas agrícolas.
Como sabemos, a duração do ciclo da cultura do eucalipto são anos e não meses, a altura das árvores são metros e não centímetros, como nas plantas agrícolas, e, para completar, as áreas de cultivo são grandes extensões de terra, geralmente em áreas marginais para produtividade e com grandes variações de clima e solo.
Por isso tudo, é preciso ter prioridade para uso da resistência de plantas, monitoramento com emprego de tecnologias de sensoriamento remoto, uso do controle biológico, além das demais técnicas de manejo integrado, para garantir efetividade e racionalidade em termos de custos.
Para complementar, as possíveis epidemias de pragas e doenças têm que fazer parte da matriz da companhia, sendo mais um risco que deve ser devidamente quantificado em um negócio de base florestal. Os surtos recentes apontam para alguns riscos preocupantes que podem causar ascensão das pragas e doenças.
Esses riscos devem ser considerados na tríade hospedeiro, agentes daninhos e ambiente. Sobre o eucalipto ainda pouco se conhece, mas muito provavelmente já convivemos com a erosão genética para resistência com o avanço das gerações de melhoramento.
Sabemos que a seleção de fenótipos para crescimento e produtividade pode causar uma perda de genes importantes para resistência, além de tornar o hospedeiro menos resiliente aos estresses do ambiente. Além disso, com a intensificação do mercado de mudas e permuta de clones, atualmente temos grandes extensões de área com baixa variabilidade genética.
Esse é um grande risco do setor florestal, que ainda convive com a dúvida sobre qual é a área máxima de plantio de um mesmo clone. É importante não esquecer o risco de introdução de novos agentes daninhos, bem como de possíveis adaptações da biodiversidade local.
Ademais, as variações dos padrões de clima, seja por efeito direto sobre os agentes daninhos ou, de forma indireta, sobre o hospedeiro ou população de inimigos naturais, podem causar grandes mudanças e afetar toda a estratégia de manejo. Se, por um lado, existem todos esses riscos, o que temos feito para contrabalancear? Posso citar pelo menos três bons exemplos de tecnologias.
O primeiro consiste no uso da resistência genética para o controle das principais doenças e algumas pragas. Por meio de protocolos específicos, os clones resistentes são eficientemente selecionados. Nesse caso, como principal oportunidade, é possível intensificar esse processo e tornar essa avaliação cada vez mais precoce no programa de melhoramento.
O segundo exemplo diz respeito ao uso do controle biológico. O mercado de controle biológico está em franco crescimento, e estamos nessa mesma direção. Temos dois laboratórios com capacidade para produzir mais de 50 milhões de inimigos naturais por ano, evitando a aplicação, nos últimos cinco anos, de um equivalente de 53 toneladas de agrotóxicos.
Para finalizar, é fundamental dispor de um bom sistema de monitoramento, para avaliar o ambiente (meteorologia), o hospedeiro (satélite e drones) e as pragas e doenças (armadilhas e inspeções de campo), a fim de embasar as melhores decisões de controle.
A história recente demonstra que o setor florestal é resiliente, graças ao investimento em pesquisa e inovação. Em 2005, quando diagnosticamos, pela primeira vez, Ralstonia solanacearum em viveiros, rapidamente desenvolvemos protocolos para erradicação do patógeno.
Em 2008, descobrimos e nomeamos uma nova doença abiótica, o Distúrbio Fisiológico do Eucalipto (DFE), cujos mecanismos de ocorrência foram elucidados e serviram, mais tarde, para o seu controle. Em 2014, registramos a primeira adaptação de um patógeno ao eucalipto, a bactéria Erwinia psidii.
No ano seguinte, desenvolvemos os protocolos para selecionar clones resistentes, de forma semelhante ao que é realizado para outras doenças (ferrugem - Austropuccinia psidii e murcha-Ceratocystis fimbriata).
Entre 2003 a 2008, ocorreu a introdução de psilídeo-de-concha (Glycaspis brimblecombei), percevejo-bronzeado (Thaumastocoris peregrinus) e vespa-da-galha (Leptocybe invasa), e, graças à mobilização de todo o setor florestal, foi possível realizar a importação e a descoberta
de novos inimigos naturais para o controle.
Além do que normalmente fazemos no estado da arte, existe ainda espaço para ser mais assertivo. Por exemplo, para o controle da praga mais importante e recorrente, ou seja, as formigas cortadeiras, o conhecimento está, de certa forma, estagnado; a única opção de controle está sujeita à baixa concorrência de mercado, barreiras e restrições, que não fazem sentido do ponto de vista técnico e ambiental.
Precisamos também destravar as discussões sobre uso de biotecnologia, investimento em novas tecnologias, uso de modelagem preditiva, inteligência artificial para tomada de decisão, equipamentos com sensores para coleta de dados e ajustes da aplicação em tempo real, entre várias outras, que precisam sair do modismo e, de fato, virar realidade nos plantios de eucalipto.