Pesquisador da Embrapa Agroenergia
Op-CP-12
As chamadas rotas termoquímicas são muito conhecidas, há muito tempo. A principal delas é a combustão. Porém, não é a única. Além da combustão, que é o processo no qual todos os combustíveis são usados, também existe a gaseificação e a pirólise. Ambas ganham notoriedade nessa época de escassez e busca frenética por inovação tecnológica, na corrida por combustíveis limpos. O principal produto da pirólise rápida é o bio-óleo.
Da forma bruta como sai do processo primário de transformação, o bio-óleo é um combustível não veicular, mas serve para alimentar caldeiras e fornalhas, com altos ganhos em termos energéticos e de emissões de poluentes, quando comparado ao óleo combustível de origem fóssil. O refino do bio-óleo e o seu processamento secundário, aos moldes do que se faz hoje nas refinarias de petróleo, é uma opção de fonte de energia renovável e sustentável e também de matéria-prima.
Temos que lembrar que o petróleo não é somente energia e combustíveis, mas também materiais, insumos, etc, e a sua falta trará grande impacto em várias cadeias produtivas. A indústria de fertilizantes, por exemplo, que é profundamente dependente dos combustíveis fósseis e da extração de minerais, passará por profundas transformações energéticas e de fontes de matérias-primas.
A biomassa deverá suprir várias dessas cadeias, substituindo as matérias-primas tradicionais, baseadas em fontes fósseis. Como biomassa pré-processada, o bio-óleo tem toda a facilidade logística de estar no estado líquido. O bio-óleo é a própria biomassa liquefeita e constituída de seus componentes estruturais, como é o caso das celuloses e da lignina fragmentadas.
A biomassa no seu estado natural apresenta baixa densidade energética e, por isso, seu transporte não deve ser feito por longas distâncias, para não inviabilizar seu uso. O bio-óleo concentra a energia da biomassa. A aplicação em larga escala da pirólise rápida e a produção de bio-óleo, a partir de biomassa residual, poderão transformar o Brasil no celeiro mundial dos biocombustíveis, juntamente com o álcool e o biodiesel.
A gaseificação centralizada de bio-óleo, usando oxigênio pressurizado, é uma rota viável para a produção de gás de síntese e a subseqüente produção de hidrocarbonetos sintéticos, por catálise. Esses novos bio-hidrocarbonetos sintéticos levariam à substituição gradativa dos combustíveis fósseis e à completa renovabilidade da matriz energética mundial dos transportes.
A transição das refinarias de petróleo, como conhecemos hoje, seria, gradativamente, mudada para as futuras biorrefinarias de bio-óleo, provenientes da transformação de resíduos das culturas de alimentos agrícolas. A produção agrícola de alimentos e de agroenergia não são concorrentes, como erroneamente se propaga, mas sim complementares e ecologicamente desejáveis. Isso tudo dito, parece um sonho inatingível, mas, na verdade, é um grande sonho possível de ser implantado, nas condições brasileiras.
A agricultura deverá substituir a maioria dos produtos de origem mineral que a humanidade consome nos dias atuais, com grande vantagem econômica, social e ambiental, e sonhadores serão aqueles que não acreditam nisso. Os biocombustíveis brasileiros apresentam grande atratividade para os investidores e abrem um caminho promissor para o desenvolvimento e a aplicação de variada tecnologia na sua produção, ao longo de toda a cadeia produtiva. Historicamente, os programas de biomassa no Brasil são estudados e reconhecidos mundialmente pelo seu grande êxito.
Isso deve ser a nossa força para continuar desenvolvendo e melhorando o desempenho do setor. Tanto a produção de florestas energéticas, quanto o programa do etanol de cana são modelos para o mundo. A produção eficiente de matéria-prima é uma etapa fundamental para o sucesso de qualquer programa de biocombustíveis.
O conhecimento de processos industriais de altos rendimentos, baixo índice de geração de resíduos, menos poluentes e inovadores, constitue-se na outra etapa, igualmente fundamental, nesse ciclo virtuoso de uso sustentável e renovável da biomassa. Também devemos nos lembrar do importante setor siderúrgico a carvão vegetal. Esse setor necessita de mudanças tecnológicas e substancial aumento de sustentabilidade e renovabilidade na sua fonte de biomassa.
A manufatura de ferro-gusa, um precursor do aço, que usa o carvão vegetal de lenha, deverá usar o carvão de resíduos agrícolas, na sua forma pulverizada, briquetada ou peletizada. Somente desta forma a siderurgia brasileira a carvão vegetal conseguirá manter sua produtividade e continuar transformando o minério de ferro em produtos e divisas para o país.
Para atingir todas essas novas metas da agroenergia será necessário investir pesadamente na força inovadora e empreendedora dos brasileiros. A grande disponibilidade de biomassa não é sinônimo de sucesso, no mercado competitivo da agroenergia. Devemos ter a capacidade empreendedora de desenvolver as tecnologias mais apropriadas para produzir e transformar essas matérias-primas do campo em bens comercializáveis e geradores de renda e postos de trabalhos.
Para isso, os profissionais e as universidades estão todos convocados a contribuir. As incubadoras de empresas de base tecnológica darão contribuição no âmbito do empreendedorismo, da mesma forma que a transformação de idéias dá em empresas rentáveis. Se a agroenergia tem um papel fundamental no futuro da humanidade, e eu acredito que tem, o Brasil é o lugar onde as maiores taxas de viabilidade serão alcançadas, devido às suas condições naturais, excepcionalmente favoráveis, e à sua capacidade humana.