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Brígida Maria dos Reis Teixeira Valente

Gerente de Melhoramento, Biotecnologia e Tecnologia da Madeira da Eldorado

OpCP80

A produtividade florestal e as lições da genética
A produtividade florestal, especialmente em plantios clonais de Eucalyptus spp., tem apresentado notável incremento nas últimas décadas, resultado direto da aplicação sistemática de programas de melhoramento genético aliados a práticas intensivas de manejo.

Nesse cenário, o Brasil se consolida como referência mundial em silvicultura, alcançando produtividades médias superiores a 40m³/ha/ano, com registros que ultrapassam 60m³/ha/ano em ambientes altamente favoráveis. Esses avanços refletem o sucesso do processo de domesticação dessas espécies e ilustram o impacto positivo do investimento contínuo em genética e manejo.

Uma das lições mais valiosas proporcionadas pela genética é que o progresso sustentável da produtividade depende de investimentos contínuos em seleção e recombinação de genótipos superiores. O programa de melhoramento genético do Eucalyptus no Brasil, iniciado nos anos 1960, evoluiu significativamente: da introdução e seleção massal de procedências, avançou para estratégias mais sofisticadas, como a seleção intra e interespecífica, a hibridização controlada e a propagação clonal.

Mais recentemente, incorporou ferramentas biotecnológicas e genômicas, assegurando ganhos cumulativos e sustentados, não apenas no volume de madeira produzida, mas também na melhoria da forma do fuste e na resistência a estresses bióticos e abióticos.
Outro aprendizado central reside na importância das avaliações rigorosas e contínuas.

A base conceitual do melhoramento repousa na identificação e recombinação de genótipos superiores, a partir de avaliações fenotípicas e genotípicas conduzidas em diversas regiões produtivas. Esses ensaios possibilitam a estimativa de parâmetros genéticos fundamentais, como herdabilidade, variância aditiva e correlações genéticas, sustentando as decisões técnicas com dados robustos. A adoção de sistemas clonais, via micropropagação ou propagação vegetativa, potencializou a multiplicação em larga escala de indivíduos superiores, promovendo a homogeneidade dos plantios e a maximização dos ganhos genéticos por ciclo.

A prática do melhoramento também reforça que produtividade não se resume ao volume de madeira. Embora atributos de crescimento, como incremento médio anual, sejam determinantes, as características de qualidade da madeira, densidade básica, composição química e propriedades anatômicas são igualmente críticas, especialmente para a indústria de base florestal. Assim, o melhoramento busca um equilíbrio: elevar a produtividade volumétrica e, simultaneamente, otimizar a qualidade da madeira, adequando os materiais genéticos às crescentes demandas industriais.

Nos últimos anos, consolidou-se outro ensinamento essencial: a necessidade de integrar, de forma efetiva, as ferramentas biotecnológicas em todas as etapas do melhoramento e da gestão florestal. A genotipagem, por exemplo, desempenha papel central na garantia da identidade clonal e na oferta de informações confiáveis para a tomada de decisões, conforme ilustrado na figura X.

X-Genotipagem: ferramenta utilizada para confirmar a identidade clonal, avaliar a distância genética entre matrizes e garantir a confiabilidade nas fases do Programa de Melhoramento Genético e Plantio Comercial.


Além disso, contribui na avaliação da distância genética entre matrizes e na validação da identidade dos materiais ao longo das diferentes fases do Programa de Melhoramento Genético (PMG), assegurando a execução das melhores estratégias e a segurança na seleção de clones promissores.

A análise da interação Genótipos x Ambientes (GxE) evidencia mais um princípio basilar: o sucesso depende da capacidade de compreender e manejar essas interações. A correta interpretação dessa relação, como demonstrado na figura Y, na página seguinte, é decisiva para maximizar a produtividade, orientando com maior precisão as estratégias de seleção e manejo. Nesse mesmo contexto, a incorporação de métodos de inteligência artificial ampliou significativamente a capacidade de prever o desempenho genético, estimando a contribuição de cada variável e possibilitando a definição de níveis críticos de produtividade, além do refinamento contínuo dos critérios de seleção.

Y-Representação da interação genótipos x ambientes: ajustando o material genético às variáveis ambientais para máxima produtividade. Análise de interação genótipos-ambientes para 12 materiais genéticos e 4 diferentes ambientes de produção. Produtividade [Alta-amarela e Baixa-azul]


Um tema recorrente no setor é a dificuldade em superar clones antigos. Essa situação revela um aprendizado estratégico: o avanço depende da disposição em ajustar manejos e protocolos aos novos materiais, e não o contrário. Muitos procedimentos de manejo e tecnologias foram concebidos tendo como base clones antigos, consolidando uma espécie de "zona de conforto" que pode limitar a inovação, restringindo tanto a elevação da produtividade quanto a adaptação a novos desafios.


Além disso, transformar um clone em um “Clone Comercial” produtivo exige esforços que extrapolam as etapas clássicas do melhoramento genético, tradicionalmente compreendidas em um ciclo de 12 a 14 anos, com avaliações criteriosas, conforme ilustrado na figura Z, na página seguinte. 

No entanto, a consolidação efetiva de um clone demanda superar fases frequentemente negligenciadas, como a adaptação ao manejo de viveiro e campo. Não são raros os casos em que clones, mesmo após vencerem todas as etapas técnicas, ficam retidos por dificuldades nessas fases finais, que exigem ajustes específicos.

A figura Z sintetiza esse processo, destacando não apenas as etapas tradicionais, da hibridação à recomendação, mas também duas fases complementares e indispensáveis: a construção de protocolos para produção de mudas e o desenvolvimento de práticas específicas de plantio e manejo silvicultural. Assim, o sucesso de um clone resulta da combinação entre rigor técnico e integração operacional, permitindo a plena expressão de seu potencial produtivo.

Z-Etapas essenciais para transformar um material genético em um “Clone Comercial”.


 
Por fim, uma das lições mais duradouras deixadas pelo melhoramento genético é a necessidade de continuidade e visão de longo prazo. O êxito de um Programa de Melhoramento Genético Florestal depende de estratégias claras e sustentadas, com definição de metas, indicadores e adequada gestão da informação, assegurando o armazenamento seguro de dados em sistemas especializados.

O programa de melhoramento deve ser encarado como uma iniciativa contínua, que requer constância, acompanhamento sistemático e rigor na execução de cada etapa. Mais do que selecionar clones para atender a demandas imediatas, trata-se de construir um legado de ganhos sustentáveis ao longo do tempo.

Ademais, é importante reconhecer que o sucesso de um clone não depende exclusivamente da equipe de melhoramento, mas resulta de um esforço coletivo, envolvendo toda a empresa. A consolidação de materiais genéticos comerciais requer integração entre diferentes áreas, promovendo discussões multidisciplinares e ajustes contínuos de protocolos, de modo a garantir que o potencial genético se traduza em adaptação, produtividade e longevidade no campo.

Assim, cabe à organização atuar de forma coordenada e resiliente para impulsionar a produtividade, tanto no presente quanto no futuro, enfrentando com preparo os desafios que certamente surgirão: como novas pragas e doenças emergentes, alterações climáticas e, sobretudo, as novas exigências do mercado por diferentes produtos, que podem demandar rápidas adaptações nos materiais genéticos e nos processos produtivos.