Pesquisador do Centro de Tecnologia de Recursos Florestais do IPT
Op-CP-11
As diferentes relações entre o setor florestal brasileiro e a situação atual das mudanças climáticas que ocorrem e ocorrerão no planeta têm sido objeto de inúmeras análises, veiculadas em revistas, seminários e congressos de todo tipo. São opiniões das mais distintas, umas sóbrias e realistas, outras totalmente catastróficas, simplistas ou complexas e elaboradas.
Mas, sem exceção, todas prevêem atuações marcantes do setor, como é o caso da neutralização de emissões de carbono e outros GEE - gases de efeito estufa. Em situações anteriores e em distintos fóruns, tive a oportunidade de avaliar criticamente a neutralização de emissões antropogênicas de carbono pelo plantio de árvores, ainda que esta seja, certamente, uma das mais simpáticas alternativas já apresentadas, na busca de soluções ao problema das mudanças climáticas.
Sou crítico do alto grau de oportunismo nessa movimentação por venda de árvores para seqüestro de carbono. Mais ainda, critico a falta de transparência na condução dos projetos anunciados e seus resultados, mas não condeno a iniciativa e não a comparo à venda de indulgências, como o faz Kevin Smith em “The Carbon Neutral Myth - Offset indulgences for your climate sins”.
O trabalho citado mostra como os mecanismos de neutralização de emissões apresentam ao público uma oportunidade de adotar a atitude de business as usual, em relação à ameaça das mudanças climáticas. Ao invés de encorajar indivíduos e instituições a mudar radicalmente seus padrões de consumo, especialmente no uso de combustíveis, a sociedade está sendo levada a acreditar que será suficiente pagar uma taxa extra por certos produtos e serviços.
A neutralização das emissões de CO2 é correta, lógica e sadia: atividades industriais, sociais, agrícolas ou florestais queimam combustíveis fósseis e renováveis, e emitem CO2 e outros gases para a atmosfera, contribuindo para o aquecimento do planeta. Com a fotossíntese nas árvores plantadas, o carbono é retirado da atmosfera e deposita-se nas células da planta, resultando no seu crescimento.
Ou seja, com o crescimento das árvores, o carbono é seqüestrado da atmosfera. E, quanto mais rápido for o crescimento da árvore, mais carbono será retirado da atmosfera e fixado nos tecidos da planta. O mecanismo é objetivo, inteligível, relativamente barato, e, principalmente, ambiental e socialmente aceitável. Assim, a aceitação crescente da idéia de neutralizar as próprias emissões de carbono, por empresas e instituições, faz com que prolifere a captação de projetos e recursos.
Paralelamente, crescem as oportunidades de prestação de serviços e da implantação de projetos de florestamento e reflorestamento, de recuperação de áreas degradadas e de matas ciliares. Um ponto importante a ser verificado é a real implantação das árvores negociadas, com a eventual substituição ou replantio daquelas árvores que não vingarem, e a condução do plantio, mediante boas práticas de manejo florestal sustentável, durante todo o período de duração do projeto.
Este poderá alcançar de 12 a 18 anos, de acordo com a espécie escolhida, o site florestal, a velocidade de crescimento das árvores e o sistema de manejo adotado. Estas iniciativas de neutralização de emissões antropogênicas de GEE pelo plantio de árvores, certamente, teriam aceitação e credibilidade ainda maiores, se tivessem suas bases técnicas cientificamente corroboradas por entidades idôneas, se fossem implementadas por agentes técnicos profissionalmente capacitados e endossadas por auditorias à prova de suspeitas.
Árvores em pé mantêm fixo o carbono capturado, imobilizado, durante toda a vida saudável do vegetal. O carbono e os GEEs somente começam a ser emitidos, quando as árvores deterioram-se, morrem, ou quando são queimadas. Entretanto, produtos como carvão vegetal, papel e madeira para construção e móveis retêm o carbono fixo pelo período equivalente ao prazo de vida do produto.
Estes são os chamados tempos de residência do carbono, e variam de produto para produto, podendo ser curtos, no caso do carvão vegetal e papel, ou bem mais longos, como na madeira serrada de uso permanente na construção habitacional ou usada na fabricação de móveis de boa qualidade. Os produtos da indústria de base florestal fixam o carbono livre, retirado da atmosfera, e não o carbono que já se encontra fixado na natureza, na forma de petróleo e seus derivados.
Neste caso, o carbono é extraído da natureza, passa a constituir o produto, seja ele combustível ou qualquer dos seus produtos derivados, e ao término do consumo ou de sua vida útil, é emitido para a atmosfera. Está aí a principal vantagem dos produtos florestais, em comparação àqueles à base de plásticos e metais, que requerem uso intensivo de energia para sua fabricação, além da proporção muito maior de emissões atmosféricas.
A estimativa do tempo de residência do carbono nos produtos de base florestal contribui para uma estimativa realista das emissões atmosféricas. Desta forma, contribui também para o inventário mais preciso das emissões, pois o carbono fixado nesses produtos de madeira não é imediatamente emitido para a atmosfera tão logo a árvore é cortada e a madeira processada, como pressupõe o método de cálculo adotado pelo IPCC - International Panel on Climate Changes, no cálculo das emissões. A prática representa uma ferramenta de incentivo ao uso da madeira como matéria-prima, ao aumento da vida útil dos seus produtos derivados, à agregação de tecnologia aos processos e produtos e ao planejamento de estoques de madeira, florestas e, última instância, de carbono.