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Ivar Wendling

Pesquisador de silvicultura clonal e propagação de plantas da Embrapa Floresta

OP-CP-34

Hormônios e reguladores de crescimento: realidades e mitos na clonagem de eucalipto

A produção de mudas florestais no Brasil presenciou inúmeros avanços tecnológicos durante as últimas décadas, sendo o eucalipto (plantas dos gêneros Eucalyptus e Corymbia) o maior responsável por tal mérito. O desenvolvimento da clonagem e os primeiros plantios clonais visando à resistência a doenças e a melhoria da produtividade e da qualidade dos produtos obtidos foram um marco histórico empreendido no final da década de 1970.

A partir de então, o desenvolvimento de novas técnicas de produção de mudas teve grande impulso. A produção de clones de eucalipto é rotina em grandes empresas florestais desde a década de 1980, mediante o uso da técnica de estaquia e, em pequenas e médias empresas, tem se tornado tecnologia comercial de grande utilidade desde 1990, com o advento da técnica de miniestaquia.

Hormônios são substâncias naturais produzidas pela própria planta, e reguladores de crescimento são produtos sintéticos aplicados nas plantas ou em partes dela, com ação similar aos hormônios naturais.

No entanto, na prática de viveiros de propagação clonal, o termo “hormônio” é usado de forma generalizada também para substâncias aplicadas e, consequentemente, neste artigo, será utilizado o termo “hormônio” aplicado para referência aos reguladores de crescimento aplicados previamente ao processo de enraizamento.

A aplicação de hormônios em estacas de eucalipto vem sendo realizada desde os primórdios da implementação da técnica de estaquia, sendo reconhecidamente uma prática indispensável para a melhoria do enraizamento, tanto em termos de percentuais quanto de velocidade para formação de raízes e vigor do sistema radicial formado.


Inúmeros estudos foram desenvolvidos visando à definição dos tipos de hormônios mais indicados, concentrações e formas de aplicação adequadas ao processo de clonagem via estaquia, no qual, em geral, 6000 mg L-1 (antigo ppm ou partes por milhão) do ácido indolbutírico (AIB) têm sido os mais recomendados, bem como a aplicação via pó em vista das maiores facilidades operacionais.

No entanto variações de juvenilidade do material propagado, principalmente referente à idade da planta matriz a ser clonada, podem ditar alterações na concentração recomendada.

Cabe ressaltar que, atualmente, a estaquia é somente utilizada para o resgate de material selecionado do campo, sendo a miniestaquia a técnica de clonagem massal utilizada após aquela etapa.

De maneira similar à estaquia, nos primórdios do desenvolvimento da técnica de miniestaquia, uma série de estudos foram realizados visando à definição de hormônios e suas concentrações a serem aplicados em miniestacas. Inicialmente, havia certo consenso de que dosagens variavam de 0 a 2000 mg L-1, dependendo, principalmente, do clone/espécie a ser clonado(a).


Com o desenvolvimento científico e tecnológico, ficou claro que a necessidade de aplicação de hormônios na técnica de miniestaquia é função do manejo adotado na produção e no enraizamento das miniestacas, ou seja, há grandes chances da não necessidade de sua aplicação quando as minicepas fornecedoras de miniestacas estão nutridas e manejadas corretamente e enraizadas em estruturas adequadas. Os sistemas de manejo de minicepas em sistema semi-hidropônico com areia média foram decisivos para tal conquista.

Em outras palavras, nesses quase 15 anos de utilização comercial da técnica de miniestaquia, os sistemas de nutrição e manejo das minicepas e enraizamento das miniestacas evoluíram de maneira a dispensar a aplicação de hormônios para melhorar o enraizamento. Exceções ainda valem para certos materiais genéticos, principalmente os subtropicais, com maior dificuldade natural de enraizamento.

Em relação aos conteúdos hormonais internos (hormônios naturais) em estacas e miniestacas, a literatura e a crença popular consideram que altas concentrações de auxina, principalmente o ácido indolacético (AIA), forma natural do AIB, seriam necessárias para promoção de enraizamento efetivo.

No entanto estudos recentes (em fase de publicação) sobre híbridos de Corymbia citriodora x C. torelliana e Eucalyptus pellita, desenvolvidos pela Embrapa Florestas em parceira com pesquisadores da University of the Sunshine Coast (Queensland, Austrália), demonstraram não ser exatamente assim, ou seja, não existe correlação das concentrações internas de AIA com enraizamento.

Naqueles estudos, as concentrações de AIA variaram significativamente entre clones, de 224 a 771 ng por grama de matéria seca para Corymbia torelliana x C. citriodora e de 200 a 840 ng g-1 para Eucalyptus pellita.

A resposta de tecidos à auxina pode ser regulada por fatores como a sensibilidade da célula àquele hormônio e a concentração de fatores inibitórios do enraizamento na base do propágulo, o que pode explicar essa falta de correlação entre os conteúdos endógenos de hormônios naturais com a resposta ao enraizamento.

Esses resultados, de certa forma contraditórios, de conteúdos hormonais internos em propágulos de eucalipto, indicam que ainda há necessidade de se avançar na compreensão fisiológica dos processos envolvidos na iniciação e no crescimento de raízes em propágulos vegetativos, e, para tanto, novos estudos básicos e aplicados serão imprescindíveis para a obtenção de avanços significativos nessa linha do conhecimento. Estudos de fisiologia básica serão base também para o efetivo desenvolvimento e/ou aprimoramento de outras técnicas biotecnológicas, como a embriogênese somática, por exemplo.