Professor de Industrialização da Madeira da Universidade Federal de Lavras
Op-CP-12
No Brasil, a atividade de carvoejamento da madeira está intimamente ligada ao setor siderúrgico. Este setor, grande produtor e consumidor de carvão vegetal, utiliza-o como termorredutor, na redução do minério de ferro para produção do ferro-gusa. Segundo a AMS - Associação Mineira de Silvicultura, em 2006, o consumo de carvão vegetal no Brasil foi da ordem de 35 milhões de m³ (mdc).
Minas Gerais participou com 60% desse total, tendo a produção de ferro-gusa sido responsável por 65% desse consumo. Apesar da expressiva participação da siderurgia no consumo do carvão vegetal, este produto também é matéria-prima de outros setores industriais. A elevação do consumo, aliada à valorização do carvão vegetal, têm contribuído para a retomada da discussão por diferentes segmentos, seja acadêmico, técnico ou industrial, sobre os entraves relativos à sua produção.
O que será benéfico para o aprimoramento da produção e devida valorização tanto da madeira, como do carvão vegetal, um produto sempre marginalizado da cadeia produtiva. Para resolver essa situação desfavorável, os produtores e utilizadores do carvão vegetal devem investir em tecnologia, tanto na seleção de matéria-prima de alta qualidade, como em sistemas ou processos mais eficientes e que, ao mesmo tempo, não provoquem conseqüências desfavoráveis ao homem e ao ambiente.
Isto requer, inicialmente, um entendimento de alguns pontos da cadeia produtiva envolvida com esse importante biocombustível. A carbonização pode ser definida, como sendo a operação de decomposição térmica que a madeira sofre na ausência ou presença controlada de ar (oxigênio), gerando um resíduo sólido, chamado de carvão vegetal, além de gases.
Trata-se, especificamente, de uma reação de combustão incompleta ou indireta da madeira. Este fato indica que a eficiência da carbonização está diretamente ligada ao controle sobre a combustão incompleta, ou seja, sobre o manejo e o controle eficiente, em relação à admissão de ar (oxigênio) no sistema. Vários fatores exercem influência sobre a eficiência da carbonização da madeira, dentre eles, destacam-se a matéria-prima e o sistema ou processo de carbonização utilizados.
Com relação à matéria-prima, sabe-se que características químicas, como o teor de lignina e certos extrativos, exercem importante papel. É interessante que a matéria-prima tenha elevado teor desses componentes químicos, para que se obtenha a máxima eficiência do processo de carbonização. Além disso, são importantes a densidade básica, a taxa de crescimento volumétrico, a produção de massa seca, entre outras.
Sempre que possível, deve-se conciliar o incremento volumétrico da madeira, com as características desejáveis e sua conversão em carvão vegetal. Dessa forma, podem-se criar as condições necessárias para a implantação da Floresta Energética, com material selecionado, de alta qualidade. Em relação à matéria-prima, muitos estudos já foram realizados por diversos pesquisadores, no Brasil.
Outro fator muito importante é relativo ao sistema ou processo de carbonização utilizado. Dentro desse contexto, pode-se dizer que existem diversos tipos de sistemas, os quais podem ser usados para a produção de carvão vegetal. Com relação ao sistema de produção, a taxa de aquecimento, a temperatura final de carbonização e a pressão de trabalho são as variáveis mais importantes e que definem tanto a quantidade, como a qualidade do carvão vegetal produzido.
Os sistemas de carbonização da madeira podem ser classificados, quanto à evolução, em: primitivos, descontínuos e contínuos. Os sistemas primitivos são os mais rudimentares sistemas utilizados. São compostos pelas medas ou caieiras, sendo ainda utilizados em algumas regiões do Brasil. Este sistema caracteriza-se pela ineficiência, desperdício e heterogeneidade do carvão vegetal produzido.
O sistema descontínuo surgiu da necessidade de se melhorar a eficiência da carbonização, facilitar a sua operação, fixar as frentes de carbonização (formação das baterias e carvoarias) e dar melhores condições de vida aos carvoeiros. O sistema é formado pelos fornos de alvenaria e metálicos, indo desde o forno de encosta ou barranco, até o de superfície, com câmara de combustão externa.
Atualmente, outros tipos de fornos estão em evidência, fornos retangulares de grande porte, os quais permitem a mecanização da carga e descarga, reduzindo o trabalho braçal do homem. Entretanto, este sistema ainda provoca grande desperdício de material, uma vez que a conversão é baixa, cerca de 25 a 27%, em relação à matéria seca utilizada, e dificultando o aproveitamento dos gases energéticos gerados.
Além disso, devido à grande dimensão dos fornos, ocorre uma distribuição não uniforme da temperatura no seu interior, o que contribui para a produção de um carvão vegetal mais heterogêneo. O sistema contínuo constitui o ponto máximo de desenvolvimento da tecnologia de carbonização de madeira. É formado pelas retortas, que são vasos em forma de reatores.
A grande vantagem deste sistema é o controle completo da combustão incompleta, gerando produção de carvão vegetal mais homogêneo, alto rendimento da carbonização, aproveitamento dos gases energéticos pelo sistema e, conseqüentemente, ausência de poluição. Apesar de todas essas vantagens, possui como desvantagem o alto investimento inicial.
Este pode ter sido o fator determinante pelo seu não desenvolvimento no Brasil, tendo em vista o relativo baixo custo de construção dos fornos de alvenaria. Atualmente, uma empresa multinacional está investindo em um sistema contínuo de produção de carvão vegetal, a Valourec & Mannesmann. O sucesso desse empreendimento pode mudar toda a perspectiva da discussão sobre a produção de carvão vegetal no Brasil.
Logicamente que o valor de mercado do carvão vegetal pode influenciar positivamente a retomada e incremento da discussão sobre esse jeito todo tecnológico de produzir carvão vegetal, adotando os princípios da sustentabilidade, onde os vértices socialmente justo, ambientalmente adequado e economicamente viável, deverão ser respeitados, para promover um desenvolvimento mais integrado.