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Robert Cardoso Sartório

Gerente de Manejo e RN do Centro de Tecnologia da Fibria

OpCP45

O manejo do eucalipto e as mudanças climáticas
O estágio avançado de desenvolvimento e os resultados da aplicação do conhecimento tecnológico florestal gerados nas áreas do melhoramento genético clássico e do manejo do eucalipto no Brasil são incontestáveis. Associado ao aprimoramento contínuo dos sistemas de gestão, planejamento e a capacitação dos colaboradores nos diversos níveis das organizações, o setor de florestas plantadas alcançou, em pouco tempo, produtividades em bases sustentáveis muito acima daquelas observadas em outros países, ocupando uma posição de destaque em âmbito mundial. Entretanto novos e complexos desafios relacionados às mudanças climáticas se fazem presentes. Pressionam os ganhos contabilizados até aqui e a qualidade demandada da matéria-prima dos muitos usuários do eucalipto. 
 
MUDANÇAS DO CLIMA:
Nas últimas quatro décadas, os especialistas ligados ao manejo dos plantios investiram muito esforço na busca e na combinação de alternativas para redução de custos com o aumento ou manutenção da produtividade, bem como no atendimento a requisitos de qualidade da madeira, a partir de plantações colhidas em ciclos cada vez mais curtos e controlados.
 
Mais recentemente, a importância dos plantios florestais em relação às alterações climáticas foi foco das atenções, e a sua positiva contribuição para amenização do aquecimento global através do sequestro de carbono atmosférico foi ratificada e ressaltada.  Não obstante o avanço do conhecimento e as contribuições do setor, em regiões que, há poucos anos, caracterizavam-se por condições excepcionais para crescer florestas, hoje se percebe a queda da produtividade acompanhada de uma maior intensidade de alguns fenômenos climáticos. No curso das investigações, surgiram alguns fenômenos inéditos, na maioria de origem abiótica, ligada à inadaptação genotípica frente a essa nova condição, que tem exigido investimentos extras para entendimento do problema e busca de soluções. 
 
COMO LIDAR COM ESSA NOVA REALIDADE? 
A experiência recente com a ocorrência do Distúrbio Fisiológico do Eucalipto nos plantios do extremo sul da Bahia e do norte do Espírito Santo, bem como com o déficit hídrico prolongado em algumas regiões do Sudeste do País, foi a forma escolhida para explorar e compartilhar, a seguir, algumas das novas abordagens e ações adotadas para fazer frente à complexidade dos novos desafios.
 
DISTÚRBIO FISIOLÓGICO DO EUCALIPTO-DFE:
De forma ampla, o DFE incidiu sobre vários materiais genéticos, diferentes regimes de manejo, altitude, declividade, tipo de solo e idade dos plantios, desafiando empresas e produtores, demandando extrema atenção e rápida ação de pesquisadores, especialistas e gestores florestais nas regiões afetadas. 
 
A fim de entender as causas dessa anomalia e desenvolver opções de mitigação ou de solução do problema, foi estruturada uma ampla base de dados que foi processada numa abordagem Big Data, associada a ferramentas de análise preditiva. Base de dados essa gerada em cerca de 20 anos de atividade silvicultural e monitoramentos. 
 
Essa nova abordagem sobre um grande volume de dados possibilitou ampliar o poder de análise pela velocidade de processamento e por considerar, de forma conjunta, um grande volume de variáveis de diferentes naturezas, sejam elas numéricas e ou categóricas, de difícil realização em análises convencionais. 
 
Os resultados permitiram desenvolver modelos de alto desempenho para melhor compreender as causas do DFE, definir quais as principais variáveis relacionadas com a doença e quanto cada uma dessas variáveis explicava a sua presença. 
 
A partir desse conhecimento, foi possível mapear e estimar o risco de ocorrência, estratificar as áreas por nível de susceptibilidade à doença, recomendar os clones mais adequados ao plantio, a sua alocação no campo e as ações específicas de manejo.
Os produtos obtidos foram e continuam sendo determinantes para adequar o manejo florestal nas áreas de ocorrência. Além disso, estabeleceu-se um paradigma inédito de aplicação bem-sucedida dessa ferramenta para fenômenos biológicos e as interações genótipo-ambiente. 
 
O DÉFICIT HÍDRICO “PROLONGADO” – DHP:
 A ocorrência de déficit hídrico é cada vez mais frequente e em eventos extremos na região Sudeste, onde estão localizados grandes maciços de florestas de eucalipto. Entre os anos de 2013 e 2014, estima-se que mais de 100.000 hectares de plantios foram perdidos em consequência da seca, especialmente no estado de Minas Gerais.
 
Para se ter uma dimensão da situação, em 2015, no estado do Espírito Santo, onde historicamente chovia 1.300 mm anuais, choveu 560 mm, ou seja, menos da metade do volume de água necessário para a manutenção das condições hidrológicas locais, isto é, recarga dos sistemas e manutenção da vazão das bacias hidrográficas para seus diversos usos. 
 
Assim como no exemplo do DFE, as predições e as recomendações para aplicação de medidas de manejo diferenciado dos plantios para mitigação dos efeitos do DHP somente foram possíveis com uso de ferramentas de modelagem, devidamente calibradas e ajustadas para as condições locais e regiões de interesse. 
 
Tais ajustes têm como base uma robusta rede experimental, sensores e monitoramentos climáticos, ambientais, ecofisiológicos e de solos, além dos resultados de inventário florestal. A investigação focada em relações diretas de causa e efeito deu lugar a uma pesquisa multifacetada de elevada complexidade, demandante de novos paradigmas, novos conhecimentos e ferramentas. Com isso, a modelagem puramente empírica vem dando lugar aos modelos de natureza processual.
 
Além disso, as práticas de manejo estão cada vez mais atreladas a análises prévias da capacidade de suporte local – condições edafoclimáticas –, permitindo orientar melhor o espaçamento de plantio, a seleção genotípica para demandas específicas, induzir por práticas de manejo a formação de um plantio mais resiliente ou tolerante às condições extremas, além de orientar o manejo da paisagem para produção de água e outros fatores de crescimento.
 
Inúmeros são os pontos para a reflexão sobre o manejo do eucalipto frente aos novos desafios relacionados às mudanças do clima. Contudo vale destacar aqueles que demandam maior atenção. Para que a indústria de base florestal faça frente aos novos desafios, é fundamental ampliar o seu entendimento em relação às interações solo-planta-clima. A evolução desse entendimento deverá estar alinhada às novas tecnologias e práticas de manejo e ao conhecimento em áreas como ecofisiologia vegetal, modelagem climática, hidrológica e análise integrada de extensa base de dados.
 
Muitas dessas ações se somam aos esforços de diversas iniciativas em curso e que devem ser incentivadas, tais como os programas cooperativos Techs e o Eucflux, que abordam a tolerância de clones de eucalipto ao estresse, e o uso dos recursos naturais pelos plantios, assim como estudos de nutrição mineral e carbono orgânico do solo como fator de crescimento associado à disponibilidade de água no solo.
 
A abordagem e os recursos computacionais utilizados para modelagem e análise, citados neste artigo, são poderosos e, cada vez mais, devem ser considerados, mas não sobrevivem ou perdem a razão de ser sem os monitoramentos, a experimentação básica e aplicada, essenciais para a geração dos dados e a realização de análise de qualidade.

Soma-se a isso a atuação de especialistas em plantações em larga escala, de expertise multidisciplinar, capazes de dar a fundamentação técnica necessária durante as análises, a interpretação e a aplicação efetiva dos resultados. A estruturação e o investimento em equipes que agreguem diversidade de conhecimento nas organizações devem ser considerados. 
 
Finalmente, cabe ressaltar que as mudanças climáticas e os seus efeitos já são presentes, e as incertezas em relação às previsões são reais. Sua intensidade é variável, considerando um país de dimensão continental como o Brasil. Assim como as pragas e as doenças não obedecem a fronteiras, as ocorrências de alterações do clima também não respeitam limites geográficos ou temporal. As ocorrências e seus efeitos atingem a todos sem distinção. 
 
Sendo assim, é fundamental nos anteciparmos na construção de uma visão sistêmica das nossas vulnerabilidades diante de tais mudanças, adotando o princípio da precaução no gerenciamento dos riscos e nas escolhas dos caminhos a serem seguidos em nossas operações. A aplicação prática e rápida da abordagem descrita permitirá diferenciar os concorrentes e gerar um novo salto de produtividade do eucalipto.