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Heitor Scaramussa Dallapiccola

Pesquisador em Matologia Florestal na Suzano

OpCP82

Matologia geral
A silvicultura brasileira ocupa posição de destaque no cenário global, sustentada por produtividades médias estimadas de 34,4 m³/ha/ano para eucalipto e 31,1 m³/ha/ano para pinus. Esses índices refletem décadas de pesquisa, inovação e aplicação científica que transformaram desafios em vantagem competitiva.

Tal desempenho é resultado da integração de tecnologias avançadas, como mecanização, agricultura de precisão, melhoramento genético, manejo integrado e estratégias de proteção florestal. Recordes em produção, exportações e inovação evidenciam que o setor vai além do simples ato de plantar árvores: constrói um modelo de desenvolvimento sustentável, resiliente e competitivo. Em um contexto global marcado por incertezas, a silvicultura brasileira demonstra que é possível aliar eficiência, responsabilidade e visão de longo prazo.
 
O futuro exige ação imediata. Mais do que eficiência, requer decisões assertivas, investimentos responsáveis e respostas às crescentes demandas ambientais e sociais. Para isso, é indispensável adotar estratégias de manejo integrado capazes de proteger as florestas plantadas contra pragas, doenças e plantas daninhas, por meio de ações diretas e indiretas. 
 
A proteção florestal deixou de ser uma prática rotineira e evoluiu para inteligência estratégica. Compreender a dinâmica dos ecossistemas, estruturar processos e antecipar cenários tornaram-se requisitos para decisões consistentes. A transformação do setor depende da integração entre ciência, tecnologia e gestão para minimizar perdas e ampliar competitividade.

Essa mudança de paradigma é fundamental porque os desafios da proteção florestal se tornaram mais complexos. Durante décadas, acreditou-se que problemas poderiam ser resolvidos com respostas padronizadas. Em se tratando de plantas daninhas, a lógica era quase binária: 

identificar, controlar e repetir. Hoje, essa abordagem é insuficiente. Mudanças climáticas alteram ciclos de germinação; espécies antes secundárias tornam-se dominantes; bancos de sementes se comportam de forma imprevisível; expansão da fronteira; e novas resistências a herbicidas redefinem fronteiras técnicas. Nesse cenário, a floresta plantada opera em um ambiente que exige interpretação, não apenas execução. 

É aqui que a Matologia, ciência de estuda o manejo das plantas daninhas, deixa de ser atividade operacional e passa a atuar como instrumento estratégico de sanidade e proteção florestal.

O manejo de plantas daninhas, ou da matocompetição, deixou de ser uma operação complementar para se consolidar como um componente crítico da silvicultura moderna. A matologia, ciência dedicada ao estudo da biologia, ecofisiologia, dinâmica populacional e processos de interferência dessas espécies, vem ganhando protagonismo, influenciando diretamente decisões técnicas e econômicas.

Seus impactos não se limitam à redução da produtividade, amplamente documentada em pesquisas; estendem-se por toda a cadeia produtiva, afetando segurança operacional, gestão patrimonial, colheita, manutenção, logística e até processos industriais. Atualmente, é reconhecida como fator crítico, podendo representar até um terço do custo de formação florestal, o que demanda abordagens cada vez mais sofisticadas, integrando ciência, tecnologia e governança.

Em florestas plantadas, o manejo de plantas daninhas envolve duas abordagens: ações diretas, aplicadas sobre a infestação já estabelecida, e ações indiretas, voltadas à prevenção. Das ações diretas, o controle químico com herbicidas pré e pós-emergentes é principal ferramenta, seguido por controle mecânico por roçadas e gradagens, além de combinações entre esses dois métodos.

Essas intervenções exigem precisão e compreensão da dinâmica do banco de sementes, estruturas subterrâneas e mecanismos fisiológicos que regulam a germinação. A aplicação de herbicidas não se limita à eliminação visual da infestação; é uma intervenção em um sistema biológico, influenciando processos como absorção, translocação e metabolismo, além de interações ecológicas. Da mesma forma, a roçada não é apenas um corte físico: altera a interceptação luminosa, modifica relações de competição e pode estimular rebrota ou favorecer espécies oportunistas.

As ações indiretas atuam sobre os fatores que condicionam a instalação das plantas daninhas, abrangendo preparo do solo, espaçamento otimizado, regime de desbastes, manejo de resíduos, desenho da fertilização, uso de plantas de cobertura para supressão e genética, empregando clones com maior índice de área foliar (IAF). Essas medidas reduzem a pressão de infestação e aceleram o fechamento do dossel, sendo fundamentais para limitar a matocompetição. Historicamente tratadas como práticas isoladas, devem ser reconhecidas como parte da matologia aplicada, pois cada decisão silvicultural influencia a dinâmica populacional das plantas daninhas e, consequentemente, o risco de interferência no povoamento.

Esse entendimento consolida um novo paradigma: a integração estratégica entre ações diretas e indiretas no manejo de plantas daninhas. Não se trata de optar por uma abordagem isolada, mas de coordená-las de forma sistêmica, garantindo que práticas químicas, mecânicas e culturais atuem em sinergia com decisões silviculturais e manejo.

A ausência dessa integração gera paradoxos operacionais, como preparo de solo que estimula germinação indesejada, roçadas que favorecem rebrota de espécies perenes ou fechamento tardio do dossel que aumenta a idade crítica de controle da matocompetição. O equilíbrio não está na intensidade das intervenções, mas na compreensão de que a matologia define o momento, o método e a frequência das ações. Proteger a floresta não é apenas intervir, é interpretar processos, planejar estratégias e antecipar cenários.
 
A matologia propõe um novo modelo de manejo: a integração estratégica. Esse conceito não busca eliminar completamente as plantas daninhas, prática que, na maioria dos casos, seria antieconômica, mas manter a interferência abaixo do limiar de dano por decisões fundamentadas em ciência. Trata-se de construir florestas em que o fechamento do dossel ocorra no momento ideal, resultado de espaçamento otimizado, escolha de clones com maior IAF e sincronização com a sazonalidade.

Florestas em que o banco de sementes é manejado preventivamente, evitando emergências críticas; em que herbicidas são utilizados como ferramentas de precisão, e não como rotina indiscriminada; e em que a proteção começa antes do plantio, estendendo-se por todo o ciclo produtivo, mesmo quando não há plantas daninhas visíveis. 
 
O setor florestal brasileiro tem potencial para consolidar-se como referência global não apenas pela elevada produtividade, mas pela capacidade de inovar em modelos de manejo que integrem eficiência operacional, sustentabilidade e responsabilidade ambiental. Para alcançar esse patamar, será necessário romper paradigmas, como aqui na Suzano onde a área de matologia foi criada há mais de 5 anos para realização de pesquisa dedicada.

Assim, é possível adotar estratégias baseadas em ciência e assumir riscos calculados, reconhecendo que o futuro da proteção florestal dependerá de conhecimento, tecnologia e, sobretudo, da integração entre ações diretas e indiretas. No fim, a reflexão é inevitável: estamos preparados para proteger a floresta de forma estratégica ou continuaremos apenas combatendo o mato? 
 
1. Longevidade do manejo sequencial na entrelinha de plantio
2. Investimento em pesquisa na expansão da rede experimental de Matologia, Bataguassu-MS
3. Proteção integrada refletindo produtividade e estabilidade florestal, Açailândia-MA
4. Importância do fechamento do dossel na supressão germinativa, Mucuri-BA
5. Interferência das plantas daninhas no desenvolvimento inicial do eucalipto, Três Lagoas-MS