Coordenadora do Programa Cooperativo sobre Proteção Florestal do IPEF e Professor de Entomologia Florestal da FCA/UNESP-Botucatu
O cultivo de eucalipto é seriamente ameaçado por diversas pragas capazes de promover a redução da produtividade. O crescimento da extensão dos plantios ao longo dos anos é um dos fatores de aumento do número de ocorrências de pragas. De acordo com o relatório anual da Industria Brasileira de Árvores – IBÁ, a área total de árvores plantadas no Brasil, em 2021, foi de 9,93 milhões de hectares, com crescimento de 1,9% comparado a 2020. Nos últimos anos, pudemos observar tendência de aumento na ocorrência de pragas. De acordo com dados do levantamento anual de pragas florestais, do Programa Cooperativo sobre Proteção Florestal – Protef, do Instituto de Pesquisas e Estudos Florestais – Ipef, em 2021, tivemos 46% das áreas levantadas atacadas por insetos-praga (excluindo formigas cortadeiras), um aumento de 16% comparado a 2020 (30%).
O aumento das áreas afetadas por pragas gerou também aumento no registro e uso de inseticidas químicos e biológicos em plantios florestais.
Nesse cenário, a adesão intensiva das empresas aos processos de certificação florestal ganha destaque, incentivando a implementação de métodos mais sustentáveis no manejo de pragas em plantios florestais do Brasil.
O MIPF – Manejo Integrado de Praga Florestais, caracterizado não só pelo uso de diversos métodos de controle, mas também pela sustentabilidade econômica, social e ambiental, é amplamente adotado por empresas florestais que possuem selo de certificação florestal, principalmente aqueles com reconhecimento internacional.
O conceito de MIP surgiu na década de 1970, após a manifestação de problemas, como resistência das pragas aos inseticidas, desequilíbrio biológico com a redução de populações de inimigos naturais, além de problemas de contaminação ambiental gerados pela utilização excessiva de químicos no controle de pragas, doenças e plantas daninhas. Ainda, com o surgimento do MIP, ressurgiu também o controle biológico, porém com novos enfoques, por meio da conservação e multiplicação de inimigos naturais, introdução de agentes benéficos e utilização de entomopatógenos no controle de pragas.
O manejo integrado de pragas pode ser definido como um sistema de decisão para uso de métodos de controle de forma isolada ou associados, empregados em uma estratégia de manejo baseada no custo-benefício, considerando a sustentabilidade. O MIP é composto pela diagnose ou avaliação, tomada de decisão e seleção dos métodos de controle, sendo o planejamento uma ferramenta de extrema importância em todos esses componentes.
No processo de diagnose, são identificadas e monitoradas as populações das pragas, seus inimigos naturais, e os fatores que influenciam na ocorrência deles. Na tomada de decisão, escolhemos controlar ou não. A decisão é baseada em planos de amostragem e em índices de tomada de decisão. Para isso, é necessário determinar o nível populacional que causa o prejuízo econômico, sendo também preciso avaliar o parasitismo ou a predação e a tendência de crescimento populacional do inseto baseada no histórico da área. Por fim, a escolha do método de controle, com ênfase a métodos menos impactantes, como controle biológico ou resistência de plantas. Quando for necessário o uso de químicos, a escolha é orientada para os inseticidas mais seletivos e específicos às pragas-alvo e, atualmente, menos tóxicos aos polinizadores.
Em plantações florestais, vem aumentando a utilização do MIP, apesar da dificuldade de determinação do nível de dano econômico. O estabelecimento de uma ampla rede de monitoramento, com o uso de técnicas adequadas e a evolução tecnológica, vem auxiliando nessa questão. Os principais exemplos de MIP em eucalipto no País são para lagartas desfolhadoras, formigas cortadeiras e pragas de viveiro.
As lagartas desfolhadoras foram destaque em 2021, com ocorrência relatada em mais de 850 mil hectares, de acordo com dados do Protef/Ipef. Para as lagartas desfolhadoras, o sistema de monitoramento é, muitas vezes, baseado no uso conjunto de diferentes técnicas, como a determinação da intensidade de desfolha, a contagem do número de lagartas por folhas, a avaliação de excrementos e a instalação de armadilhas luminosas. O manejo desse grupo de pragas é realizado com a integração de diversos métodos, como a resistência de plantas a insetos, o controle químico e o controle biológico com parasitoides, predadores e entomopatógenos.
Na cultura do Pinus, como exemplos de MIP, podemos citar o manejo de espécies do pulgão gigante do Pinus, Cinara spp., e da vespa-da-madeira, Sirex noctilio. A vespa-da-madeira é o melhor exemplo de MIP em Pinus, considerando as pesquisas realizadas pela Embrapa Florestas, com a determinação dos danos e perdas pela praga, desenvolvimento do método de amostragem e monitoramento, com árvores-armadilha e sensoriamento remoto aéreo, e escolha do método de controle, principalmente biológico, com uso do nematoide parasita Deladenus siricidicola e de parasitoides como Ibalia leucospoides e Megarhyssa nortoni, além de métodos silviculturais, como os desbastes para reduzir o estresse das árvores.
O controle biológico clássico também é uma das principais estratégias de manejo para as pragas exóticas do eucalipto. Podemos citar a importação do parasitoide do psilídeo-de-concha Psyllaephagus bliteus do México, em 2005, do parasitoide da vespa-da-galha Selitrichodes neseri da África do Sul, em 2015, e do parasitoide do percevejo-bronzeado Cleruchoides noackae da Austrália, em 2012.
O manejo dessas pragas também envolve o uso de outros agentes de controle biológico, inseticidas e materiais genéticos resistentes. Para o percevejo bronzeado, o parasitoide C. noackae foi liberado em diversos estados, como MG, SP, ES, RS, PR, MS, BA e MA, com redução evidente das infestações e danos nos anos seguintes à sua liberação. Atualmente, C. noackae pode ser encontrado presente em praticamente todas as populações de T. peregrinus no Brasil.
Outro caso importante foi o manejo do gorgulho do eucalipto Gonipterus platensis, no ES. Essa praga chegou ao Espírito Santo em 2004 e causou extenso desfolhamento, atingindo aproximadamente 70 mil hectares entre 2004-2005. Na empresa, foi desenvolvido o método de monitoramento, considerando avaliação visuais e amostragem de ramos.
Foi realizada a busca do parasitoide de ovos Anaphes nitens em florestas de eucalipto no RS, trazidas para a Unesp-Botucatu para iniciar a criação de laboratório, e o envio dos parasitoides para um laboratório de criação em massa, na época da Aracruz Florestal, para posterior liberação no campo. Até o aumento da produção do parasitoide, a praga foi combatida com aplicações do inseticida biológico à base do fungo Beauveria bassiana. No início de 2006, a praga já se encontrava controlada, permanecendo assim até hoje.
O uso de técnicas integradas para o manejo de pragas em culturas florestais já é uma realidade, apesar de todas as dificuldades, por se tratar de florestas plantadas. Com a adoção do MIP, notamos não só a redução de danos nos plantios, com consequente diminuição das perdas de produtividade, mas também o uso mais racional de inseticidas químicos, contribuindo para a sustentabilidade do setor florestal. No entanto, ainda há muitas oportunidades de melhoria e desenvolvimento de novas tecnologias, como o uso de drones para monitoramento e controle de pragas e adoção de ferramentas biotecnológicas, como uso de plantas geneticamente modificadas (OGMs).