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Cibele Hummel do Amaral

Professora de Sensoriamento Remoto e Geoprocessamento Florestal da UF de Viçosa

Op-CP-56

As geotecnologias no contexto das florestas 4.0
Com o rápido desenvolvimento e a facilidade de acesso a novas tecnologias, as geotecnologias – dispositivos e sistemas para coleta e tratamento de informações espaciais – invadiram nossa vida cotidiana, os diferentes setores econômicos, o que inclui o setor florestal. A importância das tecnologias na garantia da correta tomada de decisão, gestão dos recursos florestais e execução de atividades com precisão, consagrou sua utilização no setor, com a chamada Floresta 4.0.

Essas ferramentas permitem, além do gerenciamento e da obtenção de informações em amplas áreas e ao longo do tempo,  a automatização de atividades, retirando  a subjetividade de processos antes manuais/visuais e reduzindo custos pela precisão na tomada de decisão e consequente execução de atividades.
 
Dentre os dispositivos de coleta de dados, podemos citar o Sistema de Navegação Global por Satélite (GNSS), com receptores que estão acoplados a diferentes plataformas móveis e fixas, a fim de que obtenhamos o posicionamento das máquinas, automóveis e colaboradores durante a execução das mais diversas atividades em campo. 
 
Destacam-se os sistemas com correção diferencial DGPS (Differential Global Positioning System) e RTK (Real-time Kinematic), que permitem a obtenção de coordenadas geográficas e altitude em níveis centimétricos/milimétricos, sendo que o último sistema ainda as disponibiliza em tempo real.

Esses equipamentos, antes mais restritos às atividades topográficas/geotécnicas, são fundamentais para localizar dados que chamamos de “verdade terrestre” para treinamento de algoritmos, obtenção de informações com sensores remotos e espacialização de atributos da floresta. Além disso, permitem a execução de atividades com precisão, como a aplicação automatizada de defensivos agrícolas. 
 
Não menos importante, os sensores remotos também são tecnologias de coleta de dados, de suma importância ao setor, e que devem ter seu uso ampliado nos próximos anos, não apenas no campo, mas também na indústria. Como o próprio nome diz, sensores remotos são dispositivos que realizam a obtenção de dados de um determinado alvo sem o contato direto com o mesmo. 
 
A partir dessa geotecnologia, podemos obter informações de alvos e fenômenos em diferentes perspectivas, em amplas áreas, em regiões de difícil acesso, ao longo do tempo e, ainda mais, de forma não destrutiva e rápida. Os produtos de sensoriamento remoto podem ser imagens ou dados pontuais, como, por exemplo, nuvem de pontos, no caso dos sistemas de perfilamento a laser, e assinaturas espectrais, oriundas de espectrorradiômetros. Os sensores, porém, não precisam estar a bordo de satélites ou aviões.

Seus produtos vêm sendo obtidos, cada vez mais, pelo próprio usuário a partir de outras plataformas, como Veículos Áreos Não Tripulados (VANTs), torres, automóveis e, até mesmo, manualmente, a partir de smartphones. Diversos são os sensores que estão disponíveis para o setor, desde câmeras visíveis (RGB) e infravermelho próximo (NIR), como sensores hiperespectrais – que permitem a obtenção de dados ópticos em centenas de bandas espectrais –, sensores termais e sensores LiDAR (Light Detection and Ranging).

Contudo nem todas essas tecnologias estão implementadas operacionalmente no setor florestal. Em minha opinião, ainda faltam pesquisas para o estabelecimento de relações empíricas entre dados de sensoriamento remoto – além dos tradicionais RGB-NIR – e atributos florestais de origem genotípica ou fenotípica e eventos, como doenças bióticas e abióticas.

Essa base de dados deve suportar a seleção de sensores e/ou bandas espectrais para discriminação de dado atributo ou evento e, consequentemente, a confecção de sensores aplicados (mais simples e mais baratos), o treinamento de algoritmos e a elaboração de programas específicos. Lembrando que essas aplicações podem ocorrer nos viveiros, nos talhões, nas fazendas e na indústria. 
 
O uso dessas tecnologias de forma operacional passa, também, pelo processamento dos dados. Obviamente, a análise visual de imagens, sem grandes processamentos, já nos garante melhorar o planejamento de ações, pela possibilidade de análise da distribuição de alvos e suas relações espaciais, como para o traçado de rotas e para a identicação de áreas florestadas afetadas por matocompetição ou incêndios. Contudo diversos são os algoritmos que podem ser implementados para resolver distintas “questões espaciais”.

Além de procedimentos básicos de Processamento Digital de Imagens (PDI), como a classificação de imagens e a álgebra de bandas – da qual são oriundos os Índices Espectrais de Vegetação, como o conhecido NDVI (Normalized Difference Vegetation Index) –, análises por componentes principais e análises de mistura espectral permitem a mineração de informações e a extração de dados em nível subpixel, respectivamente.

Esta última, por exemplo, pode nos dar informações de teor de clorofila e área foliar, concomitantemente, de forma mais precisa que índices de vegetação tradicionais, mesmo se tratando de dados multiespectrais. Quando exploramos dados hiperespectrais, essa análise nos permite, inclusive, a identificação genotípica de vegetações.

Aliás, acredito que ainda há muito avanço a ser feito com dados hiperespectrais dentro do setor florestal. Análises de profundidade de feição de absorção de energia ou mesmo regressões entre dados bioquímicos e de reflectância, como a PLSR (Partial Least Squares Regression), permitem-nos estimar e monitorar diversos traços, como compostos bioquímicos e água em florestas.    
 
Os sensores LiDAR também “chegaram para ficar” no setor florestal, uma vez que permitem a modelagem tridimensional do alvo, seja ele uma planta, um talhão ou uma fazenda. Além da enorme aplicabilidade dos Modelos Digitais de Terreno (MDT) para o planejamento de estradas, colheita e transporte, é possível “inventariar quantitativamente” florestas a partir das nuvens de pontos normalizadas.

Assim, com base em dados pontuais de campo, os produtos finais de processamento de dados LiDAR, obtidos por plataformas aéreas, são mapas de variáveis estruturais (e produtividade), que refletem informações contínuas passíveis de serem coletadas em campo apenas via censo (inventário 100%) – trabalho muitas vezes oneroso e inviável. Esses sensores, em plataformas terrestres, também são usados para mensuração de volume de madeira empilhada.
 
Pensando em tratamento de dados, ainda há uma série de processamentos que podem ser realizados em ambiente de Sistemas de Informações Geográficas (SIG), com a integração de dados multifonte, numéricos e categóricos. Cabe realçar a importância de algoritmos de aprendizado de máquina, como o Random Forest e o Support Vector Machine, que nos geram respostas – na maioria das vezes com elevada exatidão – sobre sistemas complexos, como as florestas, a partir de grandes bancos de dados (comumente chamados Big Data).  
 
De fato, as geotecnologias já fazem parte do setor florestal de forma irreversível, uma vez que almejamos obter respostas (e agir) de forma rápida e precisa. Já usufruímos dessas ferramentas em diversas etapas cotidianas do setor:  planejamento de campo, planejamento econômico de projetos e implantações, gestão ambiental, monitoramento das culturas, análise de sítio, planejamento de colheita e transporte, dentre outras. Passamos a utilizar de forma mais ousada tais tecnologias para fenotipagem, por exemplo, diante de cenários de mudanças climáticas. Assim, concluo que, diante do dinamismo tecnológico, cabe a nós muita criatividade (e competência) para exaurirmos as possibilidades de otimização de processos utilizando as geotecnologias dentro do setor florestal.