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Jorge Antonio de Farias

Diretor do Centro de Pesquisas Florestais da UF-Santa Maria

Op-CP-37

Fomento em áreas de atividades não florestais

Aos mais desavisados, pode parecer estranho um artigo de fomento florestal em uma atividade meio, isto é, onde a floresta é um insumo no processo de produção agrícola. A siderurgia é um bom exemplo para demonstrar essa necessidade. Na verdade, o objetivo do fomento em si, conceitualmente, é estimular a produção, fabricação, consumo de algo (bem ou serviço) decorrente ou vinculado a processos produtivos.

Especificamente, para o setor florestal, se imagina que o fomento é aquele que estimula produtores rurais e empreendedores a investirem em plantios florestais para constituir parcerias com empresas que tenham a floresta na sua base de produção, especialmente as indústrias de painéis e celulose. Entretanto a demanda de produtos de base florestal (energia, varas, escoras, toretes e toras) por diferentes setores da economia nacional é significativa e, infelizmente, não tem sido objeto das estatísticas oficiais e nem de políticas públicas.

Aliás, os casos de fomento florestal existentes no Brasil são, em sua maioria, de iniciativas do setor privado e não de ações de políticas públicas. Nesse particular, é oportuno mencionar que a existência de crédito subsidiado para o plantio de florestas (Pronaf florestal, Propflora, etc.) deveria ser instrumento de uma política, quando, na prática, acaba sendo uma ação isolada.

Este artigo aborda as experiências do setor do tabaco na realização de fomento florestal e contextualiza a relação entre a floresta e o cultivo do tabaco. O cultivo do tabaco é uma atividade desenvolvida de forma significativa nos três estados da região Sul, sendo o RS e SC os maiores produtores. A floresta é um insumo extremamente importante para essa cultura, pois as folhas de tabaco necessitam ser secas (curadas) e, para isso, é necessário energia, que é fornecida pela queima de lenha.

O RS tem aproximadamente 45 mil famílias que cultivam tabaco, distribuídas em 142 municípios, ou seja, 25% dos municípios. Contudo o mais importante nesse contexto é o consumo anual de lenha para a cura das folhas de tabaco, que gira atualmente na ordem de 2,3 milhões de m³ ou 3 milhões de mst. Para se ter uma correta dimensão desse volume, a Riocel-Klabin, até meados dos anos 2000, consumia, aproximadamente, 1,5 milhão de m³.

A fumicultura, por volta de 1986, tinha como base florestal o extrativismo vegetal e pouca área com florestas plantadas; as propriedades apresentavam, em média, 22,1% da área das propriedades com florestas nativas e 6,5% com reflorestamentos. Atualmente, no RS, a fumicultura apresenta uma cobertura de florestas nativas na ordem de 25% e de 12% para florestas plantadas.

Na década de 1980, a maioria da lenha era oriunda de florestas naturais; atualmente, o consumo de nativas, de forma ilegal, se situa abaixo de 1,5%. O setor é praticamente autossuficiente em lenha, sendo, em algumas regiões, exportador para a secagem de grãos, olarias e cerâmicas. O crescimento do setor florestal dentro da fumicultura se deu a partir dos anos 1990, quando não havia nenhum incentivo fiscal ou tributário para a atividade florestal, tampouco alguma linha de crédito.

Naturalmente que esses avanços não ocorreram apenas pelo espírito altruísta do setor, mas sim por questões estratégicas. A legislação acabou por restringir e inviabilizar o uso das florestas nativas, o que acarretou uma significativa pressão nos preços da lenha de reflorestamentos, sendo que o insumo lenha chegou a representar 12% do custo de produção.

A partir disso, iniciaram-se, por parte das empresas e da Afubra, ações para estimular e orientar os produtores rurais a formarem a sua própria floresta. O sucesso dessas ações pode ser observado em qualquer unidade de cura do RS, onde não se encontra mais lenha de matas nativas. A totalidade dos produtores/proprietários tem reflorestamentos, mesmo que ainda não autossuficiente, mas possuem plantios florestais.

E qual o segredo desse sucesso? Pessoas, o segredo são as pessoas; a fumicultura tem uma estrutura de integração que possibilita visitas técnicas para a orientação ao cultivo do tabaco durante o ano todo, e essa mesma assistência técnica se dedicou a estimular o plantio florestal. Além disso, as empresas financiaram os insumos para os produtores realizarem os plantios, e esses insumos foram pagos no momento da comercialização do tabaco, e, em muitos casos, sem nenhuma correção monetária.

O que acho oportuno destacar é a visão estratégica que o setor do tabaco sempre teve em relação à atividade florestal. A floresta é um insumo, mas também uma oportunidade de complementar renda para as famílias que cultivam tabaco. É também um fator de manutenção positiva da imagem do setor, uma vez que não há corte e nem consumo de matas nativas.

Os reflorestamentos estão pulverizados na paisagem. Além de tudo isso, o setor, literalmente, bancou essa mudança: zerar o consumo de nativas, ser autossuficiente em lenha. Mas ainda há muito o que fazer, as florestas ainda apresentam baixa produtividade em relação ao potencial do gênero eucalyptus.

Há necessidade de se definir a melhor espécie em função da densidade, de se pesquisar outras fontes de biomassa vegetal, de se seguir melhorando a tecnologia das unidades de cura, de se manter atualizada e motivada a assistência técnica para as atividades florestais e, uma questão fundamental, a integração com a entidade que representa os produtores para acessar o Pronaf florestal.