Com a aprovação da denominada Lei da Terceirização, circularam vários posicionamentos a favor e contrários aos seus efeitos, todos, em sua maioria, defensáveis; mas, na verdade, o que está em jogo no Brasil neste momento? A indústria de base florestal vai colher benefícios ou pouco vai mudar?
Somos um país colossal, com dimensões e complexidades continentais que desafiam os melhores legisladores. Como formular normas que irão ser bem recepcionadas por tantas esferas e guetos diferentes de uma sociedade que, por origem histórica, é tão múltipla e, me arrisco a dizer, exclusiva em sua diversidade?
Opinião unâmime entre o setor produtivo, governo e sociedade civil é que o Brasil é muito menos produtivo do que poderia ser. Produzimos muito pouco do que, na verdade, nossa dimensão e a quantitativa força de trabalho poderiam oferecer. Nesse caso, produtividade não significa horas trabalhadas, mas resultados, vale o destaque. A questão não é o quanto se trabalha, e sim como se trabalha, como se qualifica, quanto conteúdo educativo é absorvido por essa força de trabalho.
Infelizmente, muitos ainda confundem trabalho com emprego formal, carteira assinada, com todos os benefícios que a CLT preconiza, conceitos que, há muitas décadas, iniciado no período getulista de nossa história, fazia um enorme sentido. Conquistas trabalhistas em um estado social onde cabia uma maior centralização de forças estadistas, quando precisávamos garantir que o trabalhador tivesse condições dignas de emprego, para puxar o desenvolvimento que o Brasil aguardava, certamente foram e são bem-vindas, dentro de alguns contextos dessa miscelânia que é o nosso país.
As leis trabalhistas brasileiras são direitos, conquistas que precisam ser atualizadas frente ao contexto mundial atual. Atualmente, a mão do Estado não consegue alcançar o caminho a que ela se propôs, o setor produtivo não consegue fechar as contas de um plano social mal dimensionado; sem projeção, o trabalhador não suporta mais a também pesada carga social de seu salário, ou seja, as regras precisam mudar, a sociedade mudou, a era da informação trouxe à sociedade uma nova perspectiva.
A boa nova é que trabalho não vai faltar, mas talvez o emprego formal, se continuar alicerçado sob o modelo do século passado, esteja com os dias contados. O cientista e sociólogo italiano Domenico de Masi, em seu livro O ócio criativo, publicado no iníco dos anos 2000, já nos alertava sobre os desafios da nova era de desenvolvimento mundial com baixa geração de emprego e renda, o que é, sem dúvida, um grande paradoxo ao próprio capitalismo. Domenico ensina que, para quem estiver disposto a atualizar seus conceitos sobre trabalho, força produtiva, equilíbrio, convívio social e família, necessariamente terá espaço produtivo garantido.
O que assistimos recentemente em nosso país, no debate sobre a terceirização, tem muito desses conceitos misturados, confusos ainda, mas que, certamente, evidenciaram uma nova era. O tempo de conciliar a garantia de direitos trabalhistas que traduzam segurança para o trabalhador desempenhar sua atividade, em segurança e eficácia, porém sem extrapolar o real dever do Estado e do contratante, tornando o Brasil uma pátria de inúmeras oportunidades de trabalho digno, real e justo, está chegando.
Entendo que a permissão do Estado para a terceirização é um sinal que muitos já entenderam que o País precisa crescer, precisa ser mais competitivo, girar suas engrenagens com mais postos de trabalho que oportunizem aos milhões de desempregados que viram seu emprego desaparecer, cortado em um contexto muito maior que a crise que atravessamos, a necessidade de sermos um país produtivo, em classe mundial. O Estado não deve intervir na gestão, na rotina operacional do setor produtivo, por um só motivo: isso não é a sua competência.
Ele assumiu seu papel, mostrou as regras claras e, agora, vai monitorar e fiscalizar como as empresas estão terceirizando, de forma a garantir a segurança e os direitos dos trabalhadores e o desenvolvimento exponencial do setor produtivo. Precisamos desmitificar o discurso que pouco aprofunda no conhecimento da legislação trabalhista e também pouco conteúdo possui sobre relações de trabalho saudáveis.
Para a indústria de base florestal, a oportunidade de terceirizar suas atividades diversas, sob os objetivos de redução de custos, maior especialização nas atividades, disponibilização de know-how de especialistas que investiram tempo e saber para serem terceiros porque este é o seu perfil, é a certeza de cenários bem mais promissores que o anterior.
O setor florestal possui certificações, licenças ambientais e demais atestados de manejo e produção sustentáveis que evidenciam o nível de exigência na equidade de direitos e tratamentos entre trabalhadores próprios e terceirizados, certamente o grande e primeiro mito que merece ser discutido. O segundo mito que ouvimos é sobre o temor que os terceirizados roubem empregos de trabalhadores, este é o mais difícil de compreender, pois trata o trabalhador terceirizado como um ser alienígena. O terceirizado é sempre um empregado de outra empresa, ele é considerado terceirizado dentro do contexto da empresa que contratou os serviços de sua contratante. Como ele roubou emprego, se é ele mesmo um trabalhador, ou melhor, o trabalhador em questão?
Mas esse discurso ainda existe. E, por último, tercerização não é fraude, é uma forma de contrato, é uma relação contratual entre duas partes dispostas e lícitas. A nova lei mantém a proibição da chamada “pejotização”, que, concordo, foi amplamente utilizada por interesses duvidosos, longe do real sentido da boa-fé contratualista.
Mas a tercerização de boa-fé é, sem dúvida, uma prática que traz inúmeros benefícos já mencionados, obviamente que sempre trará alguns pontos que merecerão melhorias, e, certamente, o setor produtivo contratante e contratado estará alerta para percebê-las para repasse ao poder legislador do Estado atuar como deve ser, atualizando a norma segundo a realidade social em que ela é reproduzida.
O momento, agora, é de reorganizar processos e buscar, no mercado, a força de trabalho produtiva que mais adéque à realidade de cada empresa. Vamos focar nos resultados, que devem ser positivos e seguros para o governo, o empresa e o trabalhador, que, certamente, vislumbrará novas oportunidades para dignificar sua trajetória. Muito há que ser feito e esclarecido para que a lei realmente seja eficaz, mas não deixemos os pessimistas frearem ainda mais o potencial enorme que este gigante Brasil tem e que o mundo aguarda.