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Paulo Roberto de Souza Moutinho

Coordenador de Mudanças Climáticas do IPAM - Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia

Op-CP-11

Brasil: uma potência ambiental?

Além de potência agrícola, o Brasil pode se tornar uma potência ambiental, se nós, brasileiros, fizermos a escolha pela conservação permanente de nossas florestas, especialmente a amazônica. E mais, o crescimento econômico do país poderá ser fortemente impulsionado por tal escolha. Para tanto, é necessário que o Brasil trilhe por quatro caminhos claros:

1. Apóie e implemente os mecanismos de valoração da floresta “em pé”, especialmente aqueles que estão sendo discutidos no âmbito da UNFCCC - Convenção da ONU sobre Mudança do Clima;
2. Estabeleça uma política forte de incentivo à recuperação agrícola e florestal de áreas já desmatadas e abandonadas (só na Amazônia são quase 20 milhões de ha abandonados);
3. Incentive o uso sustentável de produtos florestais madeireiros e não madeireiros e, finalmente;
4. Promova incentivos à produção agrícola sustentável e socioambientalmente correta.

O primeiro caminho seja, talvez, o mais promissor. Sabe-se, hoje, que o desmatamento tropical e a degradação das florestas contribuíram, em média, com 18% (as estimativas variam de 9 a 28%) das emissões globais de carbono induzidas pelo homem, nos anos 90 (0,5 a 2,4 bilhões de toneladas). Reduzir estas emissões é de fundamental importância, se quisermos manter o clima planetário habitável.

Neste sentido, encontra-se sob negociação na UNFCCC um novo e fundamental regime, que poderá resultar na conservação florestal e em reduções do desmatamento nos países em desenvolvimento. Tal regime visa compensar aqueles países em desenvolvimento que, voluntariamente, demonstrarem reduções de suas emissões, via redução do desmatamento e da degradação de florestas, em seus territórios.

Assim, reduções gradativas na taxa de desmatamento, por exemplo, na Amazônia, abaixo de um patamar histórico de referência, poderia resultar em milhões em compensação para o Brasil. Para se ter uma idéia do volume de recursos, considerando um valor médio da tonelada de carbono praticada hoje no expoente mercado de carbono, uma redução de 5 a 10% da taxa de desmatamento amazônico, abaixo da taxa média histórica dos anos 90, geraria um montante de um bilhão de reais por ano.

Se um mecanismo deste estivesse valendo e remunerando as recentes reduções nas taxas de derrubada da floresta amazônica, o valor a ser recebido seria considerável e suficiente para promover ações de extinção, por completo, do desmatamento. O segundo caminho, a recuperação agrícola e florestal, em áreas já abertas e abandonadas, é de igual importância. Há cada vez menos espaço para uma expansão da agricultura ou da pecuária, que resulte em mais desmatamento.

Restrições ao comércio de grãos e carne são sinais evidentes de que um novo mercado, nacional e internacional, mais exigente do ponto de vista ambiental e social, está surgindo. No entanto, este caminho da recuperação de áreas necessita de incentivos firmes e de longo prazo, por parte do governo. Ainda hoje é mais barato converter uma área florestada em pasto ou campo agrícola, do que recuperar as terras abertas e já cansadas.

O caminho seguinte, o uso sustentável dos recursos florestais é, talvez, aquele em que o governo trilhou com mais afinco. A criação do Serviço Florestal Brasileiro e a lei de gestão florestal foram avanços importantes para se criar as bases de uso sustentável das florestas em larga escala, além de regular o setor madeireiro. É preciso superar os desafios que a falta crônica de poder de fiscalização governamental impõe.

É necessário encontrar os caminhos para que comunidades que detêm florestas possam usufruir de tais mecanismos de gestão florestal, de forma plena e competitiva. O quarto e último caminho sugerido, a geração de incentivos à produção agropecuária sustentável é a chave para que se concilie o aumento de produção do agronegócio com a preservação florestal ou ambiental, além de garantir a justiça social.

Como já afirmado, é evidente o aumento da demanda por produtos socioambientalmente sustentáveis, embora o setor produtivo ainda permaneça míope a este respeito. Por outro lado, há produtores que, de forma organizada e voluntária, estão promovendo práticas mais adequadas de cultivo da terra. É o caso, por exemplo, do Cadastro Socioambiental, ao qual grandes produtores do Mato Grosso estão atrelados.

Por este cadastro, que estabelece um protocolo de ações de recuperação de passivos ambientais, produtores estão buscando estabelecer relações harmônicas com o ambiente e populações tradicionais, nas regiões onde estão inseridos. Neste cadastro, já há mais de 60 proprietários de terra registrados, cobrindo uma área de quase dois milhões de ha.

Cada um está compromissado em cultivar, sem produzir novos desmatamentos, recuperar suas áreas de preservação permanente e reserva legal, além de executar várias outras ações de controle de danos ambientais, que vão além do exigido pela legislação corrente. Isto tudo tem sido acompanhado e controlado por diferentes instituições e poderá gerar, em breve, um reconhecimento, pelos consumidores, dos esforços que estão fazendo.

É provável que este reconhecimento resulte em um sobre-preço para seus produtos, criando, assim, um mercado mais sustentável. Que o Brasil tornar-se-á uma potência ambiental ainda é incerto, mas certamente é o país que reúne todas as condições políticas e ferramentas técnicas para que novos caminhos de sustentabilidade sejam trilhados. Dependerá da escolha que fizermos como brasileiros.