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Sonia Couri

Pesquisadora da Embrapa Agroindústria de Alimentos

Op-CP-12

Processo enzimático na produção de etanol, a partir de celulose

A qualidade de vida de um país e a robustez de sua economia requerem a segurança, a disponibilidade e a sustentabilidade no suprimento de alimentos e de energia. Desta forma, a produção de alimentos, a conversão de energia e os acessos aos mesmos estão entre os grandes desafios de nosso tempo. Um dos caminhos leva à continuidade da dependência de combustíveis fósseis e o outro, aliado à competência existente na produção do etanol, às diversas fontes de biomassas disponíveis e factíveis de serem processadas, por serem sustentáveis e ambientalmente amigáveis.

Levando-se em conta a estabilização na produção de etanol a partir de cana-de-açúcar, o sucesso do crescimento deste setor dependerá do desenvolvimento de um novo sistema, envolvendo o uso de resíduos agroindustriais e urbanos, madeiras excedentes e resíduos de florestas plantadas, plantas energéticas e outros.

Para que se alcance um grande avanço tecnológico, os programas de pesquisa, desenvolvimento e inovação deverão abranger toda a cadeia do biocombustível, visando à obtenção de processos viáveis técnica e economicamente. Muitas áreas do conhecimento estão sendo demandadas para responder a esses desafios e uma das mais poderosas é a biotecnologia, que é capaz de originar os mais importantes e inovadores processos de conversão de energia, entre eles o etanol a partir da celulose, material biológico mais abundante da Terra.

A celulose é uma molécula que consiste em 3.500 a 10.000 unidades de glicose, unidas por ligações 1,4-glucosídica, que a torna a matéria-prima com maior potencial para a indústria de fermentação, na produção de biocombustível. Na natureza, o material celulósico é hidrolisado pela ação de enzimas produzidas por bactérias, actinomicetes e fungos, sendo, porém, este processo de desarranjo estrutural, muito lento.

Quando o interesse é comercial, a conversão bioquímica da celulose a etanol envolve três etapas básicas:

1. o pré-tratamento, que causa o rompimento da hemicelulose, a transformação da lignina e o aumento do potencial de hidrólise da celulose;
2. a hidrólise da celulose por enzimas celulolíticas para a obtenção de uma solução rica em glicose e,
3. a fermentação alcoólica.

As principais pesquisas em andamento, em todo o mundo, estão sendo direcionadas para a conversão bioquímica da celulose. Os entraves técnicos estão associados à hidrólise enzimática e o principal desafio é reduzir o custo relativo ao uso das enzimas de US$ 0,30 – 0,50 por galão de etanol produzido nos Estados Unidos, para menos de US$ 0,05. Com este objetivo, a primeira etapa para o desenvolvimento do processo de produção de enzimas é a seleção de um microrganismo com alto potencial de síntese destas enzimas.

Em seguida, deverá ser buscado um melhoramento genético, seja através de técnicas de DNA recombinante ou mesmo através de técnicas de indução de mutação por agentes químicos e físicos, tendo em vista o aumento da atividade específica da enzima, da termotolerância e um melhor entendimento do sistema de regulação da síntese de celulases.

Atualmente, o mecanismo mais aceito para a hidrólise enzimática descreve sinergismo de, pelo menos, três enzimas, que são as endoglucanases (β-1,4-D-glucan-glucanohidrolase), exoglucanas (β-1,4-D-glucan-celobiohidrolase) e β-glucosidase ou celobiase (β-D-glicoside-glucohidrolase). O pré-tratamento da biomassa também tem sido alvo de vários estudos, uma vez que os processos atuais são onerosos e impõem condições severas para o rompimento da hemicelulose e da lignina, durante a exposição da celulose.

Para esta etapa, estão sendo investigadas novas enzimas, que sejam capazes de aumentar o rendimento do pré-tratamento e reduzir o custo deste processo. Na fermentação, a eficiência da conversão, pelo microrganismo, do açúcar em álcool pode ser comprometida por compostos formados durante o pré-tratamento e pelo aumento da concentração de etanol e sólidos.

Pesquisas em andamento podem contribuir para a eliminação da etapa de separação sólido-líquido, na co-fermentação de açúcares de carbono 5 e 6, no aumento da tolerância e resistência aos inibidores e, por último, no aproveitamento dos resíduos formados, retornando os minerais para o solo. As etapas de destilação, separação e desidratação terão que ser adequadas ao novo processo, uma vez que a composição do mosto fermentado será diferente para cada tipo de biomassa utilizada.

Hoje, o maior desafio para viabilizar economicamente a produção de álcool, através da hidrólise da fibra de celulose em açúcar fermentável, é fazer com que as quatro etapas, [1. a produção de enzimas sacarificantes (celulases, hemicelulases); 2. a hidrólise dos carboidratos componentes presentes na biomassa pré-tratada à açúcar; 3. a fermentação das hexoses (glicose, manose, galactose), e 4. a fermentação de pentoses (xilose e arabinose)] ocorram em uma simples etapa, chamada CBP - Bioprocesso Consolidado.

Neste contexto, a Embrapa Florestas lidera um projeto de pesquisa em rede, criado recentemente, denominado “Florestas Energéticas na Matriz da Agroenergia Brasileira”, no qual a Embrapa Agroindústria de Alimentos coordena um PC - Projeto Componente, que tem como objetivo geral a obtenção de produtos de alto valor agregado da biomassa florestal, destinados à geração de energia. Para isso, serão aprimoradas tecnologias e/ou processos para a obtenção de um extrato enzimático rico em atividade celulolítica, para a hidrólise de uma matriz lignocelulósica pré-tratada.