Coautores: Edimar Scarpinati, Operações ArborGen Brasil,
e Michael Cunningham, Desenvolvimento ArborGen USA
Eu acredito que o assunto melhoramento genético de eucalipto está sendo revisado no Brasil, se não por todos os interessados, pela maioria, como empresas dos setores de celulose e papel e siderurgia, instituições de pesquisa e desenvolvimento, universidades, etc. E esse fato se deve aos resultados que estamos colhendo ultimamente, como queda de produtividade e maior ocorrência de pragas e de doenças.
O salto de produtividade obtido com a clonagem talvez tenha nos deixado tão confortáveis com relação à nossa posição na produtividade mundial de eucalipto, que tenhamos nos distraído e não fizemos a lição de casa corretamente. Dessa forma, o setor de pesquisa bem como áreas ocupadas com base genética e que davam sustentação aos programas de melhoramento genético se tornaram custo nas empresas, ao invés de investimento. Com isso, equipes foram desmanteladas, e pomares de semente das mais variadas espécies – alguns de grande valor – viraram celulose, carvão, etc.
Mas a boa notícia é que algumas das introduções de materiais genéticos feitas no passado ainda podem ser acessadas, a área acadêmica manteve seu desenvolvimento, e, atualmente, entre outras tecnologias, temos ferramentas de análise de dados eficientes sendo utilizadas no setor, como:
1. ASRML: pacote de software estatístico para a montagem de modelos mistos linea-
res usando máxima verossimilhança restrita, uma técnica comumente utilizada em melhoramento de plantas e animais e genética quantitativa, bem como em outros campos. É notável por sua capacidade de ajustar eficientemente conjuntos de dados muito grandes e complexos, devido ao uso do algoritmo de informação média e métodos de matriz esparsa.
2. BLUP - Best Linear Unbiased Prediction: é a tecnologia utilizada para avaliação do valor genético dos parentais. Ou seja, indica cruzamentos a serem realizados visando à melhoria da população.
3. Selegen: aplicativo computacional Selegen-Reml/Blup, desenvolvido pela Embrapa, destinado à seleção genética no contexto do melhoramento de plantas. Fundamentado em procedimentos ótimos de estimação de componentes de variância e de predição de valores genéticos, o referido software conduz à maximização da eficiência dos programas de melhoramento genético de várias categorias de plantas, tais quais espécies florestais como eucalipto, pínus, acácia-negra, seringueira, leucena, grevílea, teca, mogno, entre outras culturas.
Essas análises são aplicadas comumente nos dias atuais em informações de campo como testes de progênie e testes clonais, entretanto o início da sua utilização ocorreu no final dos anos 2000. Para otimização de custos, uma alternativa interessante a ser avaliada na área de melhoramento genético é a criação de uma cooperativa que concentre a base genética para todas as empresas, como ocorre na cooperativa da North Carolina State University nos Estados Unidos, que vem trabalhando há mais de 60 anos.
Assim, cada membro da cooperativa trabalha com os indivíduos de interesse, como, por exemplo, 100 indivíduos, enquanto a cooperativa tem mais de 1.000 indivíduos de uso comum a todos os membros. Além disso, à medida que novos desenvolvimentos vão ocorrendo, vão sendo compartilhados na cooperativa e todos têm acesso. A cooperativa também é responsável pela análise de dados, uma parte crítica do processo, de forma que cada empresa não precisa dessa pessoa internamente. Por meio de uma cooperativa como essa, ganha-se eficiência com custos mais baixos.
Em se tratando da disponibilização de materiais genéticos ao mercado, atualmente nos deparamos com poucos clones, geralmente de boa adaptabilidade ambiental, média produtividade aos ambientes e variabilidade genética restrita. Porém algumas mudanças recentes, com maior profissionalização do setor florestal, também podem auxiliar neste processo de retomada de produtividade, uma vez que melhores clones vão sendo disponibilizados ao mercado e em maior número.
Uma dessas mudanças é o reconhecimento por parte das empresas de que os clones desenvolvidos são propriedade intelectual da empresa, a qual pode se beneficiar disso. Em tempos passados, foi comum algumas empresas “cederem” ao mercado seus materiais genéticos, “ultrapassados” ou não, e eles serem de uso comum. O pavio para essa mudança foi a Lei de Proteção de Cultivares, Lei nº 9.456, de abril de 1997.
A criação e posterior aplicação dessa lei mudou toda uma dinâmica existente, pois as empresas agora protegem seus clones e só os liberam para uso do mercado mediante contratos em que são acertados diferentes tipos de remuneração pelo uso do material genético. Tais acordos têm diferentes estruturas, mas o mais consolidado atualmente é o pagamento de royalties por mudas vendidas.
Um outro componente da cadeia afetado pela Lei de Proteção de Cultivares são os viveiros produtores de mudas. Eles, anteriormente, competiam por qualidade e preço, uma vez que vendiam os chamados clones de mercado, ou seja, vendiam o mesmo produto.
Ao serem comercializados clones protegidos, o responsável deve se estruturar e realizar tais acordos com o desenvolvedor do material genético e realizar o pagamento pela propagação e pela venda do material. Esse fato organiza o mercado e o faz obrigatoriamente mais profissional, o que é positivo para o setor florestal como um todo.
Uma importante fase dessa dinâmica também é a recomendação para plantio de material genético. Anteriormente, clones eram levados de uma região para outra sem testes prévios, o que provavelmente gerou muitos problemas para investidores do setor, uma vez que clones de eucalipto são muito responsivos ao ambiente, a chamada interação genótipo-ambiente. Assim, clones nunca devem ser plantados em locais sem antes serem testados por pelo menos 3-4 anos para acompanhamento do crescimento e de ocorrência de pragas e doenças.
Ao se profissionalizarem todas essas questões – propriedade intelectual, comercialização e recomendação dos materiais genéticos ?, temos uma drástica mudança favorável para o setor florestal. Um benefício adicional dessa profissionalização é a utilização de produtos mais eficientes para os diferentes setores. Nem todos os clones são ideais para a produção de celulose e energia.
No segmento de celulose, deve-se trabalhar com clones que produzem mais toneladas de celulose por hectare, enquanto, na produção de energia, deve-se trabalhar com materiais mais densos, que resultam em maior produção de energia por hectare. Ao utilizar essa lógica, pode-se produzir mais celulose ou energia em uma área menor, com custos de colheita, processamento e transporte de madeira mais eficientes e com economias que podem chegar a 30%.
Dessa forma, devemos trabalhar seriamente com as ferramentas disponíveis, visando ter um programa de melhoramento genético robusto, com ampla base genética, e, ao mesmo tempo, ampliar a gama de espécies de eucalipto para introduzir nas populações existentes genes de resistência à seca e a doenças, principal desafio atual.
Assim, o desafio da máxima produtividade via melhoramento genético consiste em utilizar as mais avançadas tecnologias disponíveis para recombinação (cruzamentos), experimentação, análise, seleção e recomendação de materiais genéticos para as mais diversas regiões do Brasil. Assim, acredito que temos como recuperar, a médio prazo, o tempo perdido e retornar a patamares de produtividade média acima dos atuais 36m3/ha/ano.
Para finalizar, gostaria de deixar uma provocação: devemos pensar na retomada dos trabalhos de geração de híbridos e plantio seminais. Acredito que não avaliamos bem a capacidade específica de combinação nos nossos cruzamentos. É possível explorar isso de forma operacional, gerar florestas de produtividade tão boa quanto as clonais, promover maior variabilidade genética e maior segurança econômica para os plantadores de florestas.