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Rubens Cristiano Damas Garlipp

Superintendente da Sociedade Brasileira de Silvicultura

Op-CP-04

Mecanismo estratégico e de novas oportunidades

Em 1903, o chefe do escritório central da Cia. Paulista de Estradas de Ferro, Engº. Adolpho Pinto, propôs um plano de fomento florestal, preocupado com o crescente emprego de madeiras, sem o cuidado de se replantar as matas. “Sendo a mais interessada no fomento, por ser a maior consumidora e porque tal riqueza natural poderá constituir-se num dos mais abundantes elementos do tráfego de suas linhas, a ninguém cabe, com mais razão, o encargo dessa obra, de alcance tão benfazeja e de tão fecundos resultados, para a economia da empresa e para todo o Estado.”

Constaram em ata: “1) distribuir prêmios pecuniários aos lavradores que se dedicarem à cultura florestal; 2) fundar um viveiro botânico; 3) divulgar aos lavradores instruções práticas e 4) adquirir terrenos para estabelecer florestas.”

Estavam lançadas as bases conceituais do fomento: doação de mudas, assistência técnica e remuneração aos produtores. Desde então, a atividade disseminou-se no Brasil. Surgiram diferentes modalidades de parcerias, envolvendo governos estaduais, prefeituras, instituições de ensino e pesquisa, empresas consumidoras e produtores rurais. Em cada modalidade, ações e compromissos assumidos pelas partes.

O fomento evoluiu no tempo e a atuação das empresas de celulose e papel foi fundamental para consolidar a atividade. Nas décadas de 60 e 70, os agricultores próximos das fábricas buscavam as mudas de árvores nas empresas, sem compromisso formal. Na década de 80, o produtor contava com o fomento de extensão, recebendo mudas e assistência técnica.

Na década de 90, com o fim dos incentivos fiscais, estruturou-se o fomento contratual, garantindo mercado. Hoje, além de mudas e assistência técnica, o produtor recebe insumos, planejamento da produção, orientação para melhoria ambiental de sua propriedade e adiantamento financeiro. O fomento tornou-se estratégico para a expansão do setor.

Para o produtor rural, constitui-se em poupança verde, promove utilização de terras ociosas ou degradadas, melhor aproveitamento da propriedade e de máquinas e equipamentos, obtenção de produtos não madeireiros, madeira para benfeitorias, renda adicional, rentabilidade superior a várias atividades agrícolas e valorização do imóvel.

Para a indústria, significa retorno do investimento a custos compatíveis, fonte complementar de abastecimento, menores investimentos em terras e máquinas e integração com a comunidade. Para sociedade e governo, cumpre funções ambientais e sociais, como conservação de solos, preservação de ecossistemas, redução da pressão sobre recursos naturais, geração de empregos, fixação de mão-de-obra no campo, dinamização da economia local, melhoria da qualidade de vida e pólos de crescimento.

Tais características inserem-se nas políticas públicas e privadas do setor e ganharam relevância, a partir de marcos importantes, como: o risco de apagão florestal, diagnosticado no final dos anos 90, as metas do Programa Nacional de Florestas, preconizando que um terço dos plantios anuais sejam feitos por pequenos produtores e a formatação de linhas oficiais de crédito - ainda que passíveis de ajustes – para produtores rurais.

O fomento cria novas oportunidades. Responderá, em breve, por 30% ou mais do consumo. Em 2005, dos 553 mil hectares plantados no país, 130 mil foram feitos por agricultores. O fomento chega ao ponto de não-retorno, amplia a responsabilidade socioambiental do setor e contribui para legitimar a silvicultura sustentável. A produção de madeira delegada aos milhares de pequenos e médios produtores será superior a 40 milhões de m³/ano, na próxima década, o que configura novo cenário para governos, produtores rurais, empresas, institutos de pesquisa, fornecedores e profissionais do setor, para manter as vantagens comparativas, conquistadas pela silvicultura nacional.

Nesse sentido, ações integradas devem focar as novas demandas:

1. Transferência de tecnologia e extensão florestal, mediante parcerias formais de assistência técnica, entre todos os agentes do fomento, para assegurar aos produtores rurais os altos índices de produtividade e qualidade contidos no pacote tecnológico das empresas;
2. Adequação operacional, da silvicultura de larga escala, para a silvicultura em pequena escala, praticada pelos produtores rurais;
3. Estímulo a prestadores de serviços para fomentados, pois a pulverização e a conseqüente desconcentração relativa dos plantios demandarão módulos e sistemas específicos para áreas menores e descontínuas;
4. Adequação do cultivo às realidades regionais: sistemas agro-florestais, viáveis em muitas situações, e a formação de florestas sem abandono de culturas tradicionais, diversificam a produção e antecipam receitas;
5. Flexibilização da modalidade de fomento, considerando estrutura fundiária e perfil investidor do proprietário rural;
6. Fortalecimento do negócio florestal, mediante apoio aos fomentados, do plantio à comercialização da madeira;
7. Disponibilização de informações de mercado e dos resultados dos programas de fomento;
8. Constituição de cooperativas, de modo a organizar a produção em nova relação de mercado;
9. Incorporação dos preceitos e serviços ambientais da silvicultura nas pequenas e médias propriedades;
10. Consolidação de arranjos produtivos locais, a exemplo do que já ocorre nas regiões onde cadeias produtivas - laminadoras, serrarias e móveis, desenvolveram-se ancoradas em florestas plantadas no entorno das indústrias;
11. Certificação florestal, em grupo ou de cooperativas, para cumprir as exigências de percentuais mínimos de madeira certificada.

O fomento tem promovido, de modo voluntário, uma mini-reforma agrícola, estabelecendo florestas sociais, em sintonia com os anseios da sociedade e com os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, formulados pela ONU. Concebido há 100 anos, constitui-se em paradigma atual de desenvolvimento. O Engº Adolpho Pinto, mentor deste projeto, foi modesto na época, pois os desdobramentos de sua iniciativa foram fecundos no país.