Coautor: Lúcio Guimarães, Coordenador de Pesquisa da FuturaGene
A talhadia do eucalipto é uma prática essencial no manejo florestal, pois permite aproveitar a capacidade de rebrota das cepas após o primeiro corte. Essa técnica reduz significativamente os custos de implantação e acelera o início de um novo ciclo produtivo. Contudo, seu sucesso depende diretamente da sanidade das cepas remanescentes, que devem permanecer íntegras e fisiologicamente ativas para sustentar o estabelecimento das novas brotações.

Após o corte, as cepas permanecem expostas, apresentando ferimentos abertos e tecidos tenros. Essas condições as tornam altamente vulneráveis à infecção por microrganismos oportunistas. O vigor das rebrotas depende da integridade do câmbio e do sistema vascular, responsáveis pela condução de água e nutrientes. Assim, doenças que afetam o xilema, o câmbio ou os tecidos próximos à superfície de corte figuram entre as principais causas de falhas de rebrota e mortalidade de cepas.
Entre os patógenos de maior relevância para sistemas de talhadia, destacam-se a murcha causada pelo fungo Ceratocystis fimbriata e a murcha bacteriana provocada por Ralstonia solanacearum, ambos patógenos vasculares associados a severas perdas de produtividade; além do fungo Austropuccinia psidii, que, embora foliar, possui caráter agressivo em tecidos tenros, tendo impacto significativo nas brotações.
Murcha de Ceratocystis fimbriata: A murcha causada por Ceratocystis fimbriata é considerada uma das doenças mais severas em plantios de eucalipto. O fungo, que é um habitante natural do solo, pode estar presente previamente ao plantio ou, ainda, ser disseminado por meio de mudas contaminadas.
O patógeno pode colonizar o sistema vascular de algumas plantas do stand de forma lenta, permanecendo no povoamento desde o primeiro ciclo sem necessariamente causar a morte da árvore. Entretanto, os ferimentos gerados durante a colheita favorecem sua dispersão entre as cepas, e o estresse pós-corte facilita a rápida colonização dos tecidos.
Os sintomas incluem escurecimento dos vasos do xilema, murcha progressiva das brotações e morte completa da cepa. Em sistemas de talhadia, o patógeno encontra condições ideais devido à presença de ferimentos frescos. Em cortes transversais, nas plantas infectadas, é comum observar lenho escurecido em padrões radiais, característico da colonização fúngica.
Murcha Bacteriana (Ralstonia solanacearum): A murcha bacteriana, causada por Ralstonia solanacearum, é uma doença vascular altamente destrutiva, especialmente em regiões quentes e úmidas. Semelhante à Ceratocystis fimbriata, a bactéria pode persistir no solo, ser introduzida por mudas contaminadas ou penetrar nas plantas por ferimentos recentes, colonizando os vasos do xilema e bloqueando a condução de seiva.
Os sintomas incluem murcha súbita das rebrotas, amarelecimento foliar, necrose ascendente e morte da cepa. No corte transversal, do caule da planta infectada, observa-se escurecimento dos vasos do xilema e uma exsudação bacteriana de coloração leitosa, característica que auxilia na diferenciação em relação à infecção por Ceratocystis, já que os sintomas na copa podem ser semelhantes.
Medidas Integradas de Controle: Tanto Ceratocystis fimbriata quanto Ralstonia solanacearum apresentam elevada capacidade de sobrevivência no ambiente e forte associação com ferimentos pós-colheita, o que torna a talhadia especialmente vulnerável. Na Suzano, já fizemos diversos estudos internos e com parceiros externos e chegamos à conclusão de que, neste momento, não existem métodos curativos eficazes.
Desta forma, o manejo é exclusivamente preventivo, baseado em duas estratégias centrais:
• Uso de mudas sadias, provenientes de viveiros com rigoroso controle sanitário e substratos livres de patógenos, o que assegura uma melhor sanidade no primeiro, assim como nos ciclos subsequentes da floresta; e
• Adoção de clones resistentes, uma vez que há no eucalipto variabilidade genética suficiente para obtenção desses materiais. Sendo mais frequente a resistência para o fungo Ceratocystis fimbriata e relativamente limitada para murcha de Ralstonia.
Em talhões onde esses patógenos já foram registrados, a condução da talhadia é desaconselhada se os clones forem suscetíveis, pois ambos persistem no solo e nos restos de raízes, reinfectando as novas brotações e comprometendo a viabilidade econômica do sistema.
Ferrugem do Eucalipto (Austropuccinia psidii): A ferrugem, causada por Austropuccinia psidii, é a doença foliar mais importante da cultura do eucalipto no Brasil e um dos principais fatores de redução do vigor em rebrotas jovens. O patógeno infecta folhas novas, brotos e hastes tenras, formando pústulas alaranjadas e levando à desfolha precoce. Durante a fase inicial da rebrota, a ferrugem pode provocar morte de brotos, deformações e redução drástica do crescimento, sobretudo em clones suscetíveis e em condições de alta umidade ou prolongado molhamento foliar.
Em situações severas, o impacto sobre o estabelecimento da talhadia é expressivo, afetando diretamente o número e o vigor dos brotos.
O manejo baseia-se principalmente em:
• Resistência genética, por meio do uso de clones resistentes;
• Monitoramento fitossanitário contínuo, com possibilidade de aplicação de fungicidas em situações de alta pressão da doença; e
• Evitar áreas excessivamente sombreadas ou densamente plantadas, que favorecem a infecção e aumentam a severidade da ferrugem.
Outros patógenos também podem limitar e até mesmo inviabilizar a talhadia. Nos últimos anos, têm sido frequentes perdas de stand por fungos da família Botryosphaeriaceae, como Neofusicoccum spp. e Botryosphaeria spp. Esses fungos vivem como endofíticos e tornam-se patogênicos após o estresse desencadeado na colheita, embora ainda tenham menor impacto documentado que os patógenos principais citados.
A sanidade das cepas e das rebrotas é um elemento central para o sucesso da talhadia do eucalipto, especialmente em sistemas produtivos que dependem da redução de custos e da aceleração dos ciclos de corte. Esses patógenos representam ameaças diretas à sustentabilidade do manejo, prejudicando a capacidade de rebrota, o vigor inicial das plantas e a longevidade produtiva dos povoamentos.
O manejo preventivo, iniciado já no primeiro ciclo, com o uso de mudas sadias, substratos livres de patógenos, resistência genética e monitoramento sistemático, constitui a estratégia mais eficaz para reduzir a incidência e o impacto dessas doenças. Em áreas com histórico de contaminação, a decisão sobre a condução ou não da talhadia deve ser avaliada com rigor técnico, considerando o risco de reinfecção, suscetibilidade do clone plantado e a viabilidade econômica do sistema.
A integração de práticas sanitárias, manejo adequado do ambiente e seleção de materiais genéticos mais resistentes permitirão não apenas mitigar perdas, mas também fortalecer a resiliência dos plantios frente às principais doenças associadas às talhadias de eucalipto. Esse conjunto de ações é essencial para garantir produtividade e sustentabilidade no longo prazo.

-----
1. Escurecimento radial do lenho, sintoma típico da murcha-de-Ceratocystis
2. Exsudação de pus bacteriano, devido a infecção por Ralstonia solanacearum
3. Sintomas de Murcha de Ceratocystis em condução
4. Talhão com plantas murchas e mortas devido infecção por Ralstonia solanacearum