Coordenadora do Programa Cooperativo sobre Proteção Florestal do IPEF e Professor de Entomologia Florestal da FCA/UNESP-Botucatu
As florestas plantadas brasileiras, principalmente as baseadas em eucalipto e pinus, são reconhecidas mundialmente pela sua produtividade, baseada em sólidas pesquisas em melhoramento e manejo florestal. Entretanto, nos últimos anos, essa produtividade estagnou e, em alguns casos, até reduziu. O que tem acontecido? Uma das suposições está relacionada com os anos da crise econômica, iniciada em 2008, que fez alguns setores realizarem cortes nos investimentos, e mesmo em algumas operações, para sobreviver a esse período. Isso é verdadeiro para o setor de siderurgia, demandante de carvão vegetal de eucalipto, e o setor de madeira sólida, chapas e painéis.
Na área de proteção florestal, esses cortes aconteceram no controle de formigas cortadeiras e de pragas de parte aérea, como psilídeo-de-concha e percevejo-bronzeado, para o eucalipto. Entretanto, o setor de papel e celulose foi o menos afetado, pois a demanda mundial por esses produtos e os preços internacionais se mantiveram altos, além do câmbio, com a desvalorização do real, e rapidamente as despesas com controle de pragas e doenças se mantiveram. Porém, mesmo esse setor apresentou estagnação da produtividade na última década.
Pelo levantamento anual de pragas e doenças florestais, realizada pelo PROTEF (Programa de Proteção Florestal), do IPEF, começamos a ter uma série histórica, com 11 anos de dados. De 2010 a 2017, a área média afetada por pragas em florestas de eucalipto tem sido de 10% a 15% da área de efetivo plantio, excluindo formigas cortadeiras e cupins. De 2018 a 2020, a área atacada por pragas tem atingido média de 30% da superfície plantada, ou seja, praticamente dobrou o tamanho do problema, mesmo controlando essas áreas. Esse aumento se deve basicamente a três pragas: psilídeo-de-concha, percevejo-bronzeado e lagartas-desfolhadoras.
Por que essas pragas, mesmo com programas de controle biológico e uso de inseticidas químicos, têm aumentado seus danos (que podem reduzir o IMA entre 10% e 30%)? Uma das possíveis explicações está relacionada com as mudanças climáticas. A interação entre as mudanças climáticas e a ocorrência de pragas e doenças florestais já vem sendo evidenciada há quase dez anos, principalmente nos EUA e no Canadá. Porém, nas regiões tropicais, tem sido mais difícil evidenciar as mudanças climáticas.
Por outro lado, os fenômenos climáticos mais estudados, como o El Niño e La Niña, têm abrangência global e afeta diretamente o Brasil. Cruzando os dados dos levantamentos de pragas florestais e o histórico de ocorrência de El Niño/La Niña, verificamos que, durante os anos de La Niña, que se caracteriza por invernos e primaveras mais secas e com temperaturas mais amenas nas regiões Sul, Sudeste e parte do Centro-Oeste, ocorreram mais surtos das pragas de eucalipto, como lagartas-desfolhadoras, psilídeo-de-concha e percevejo-bronzeado. Nos anos de El Niño, em que as secas ocorrem com maior intensidade nas regiões Norte e Nordeste, verificamos surtos de lagartas-desfolhadoras na Bahia.
Essas evidências ainda carecem de análises estatísticas para serem confirmadas, mas permitem que as empresas e os produtores florestais possam se preparar melhor para um possível aumento de surtos durante a vigência desses fenômenos climáticos. Os efeitos de secas mais intensas e prolongadas, associados ao aumento da frequência de eventos extremos, como ondas de calor ou frio, por vezes intercaladas por diferença de duas a três semanas, como ocorreu durante os meses de agosto (geada) e setembro (onda de calor com máximas acima de 40oC) nos estados do MS e São Paulo em 2021, intensificam os estresses em árvores de eucalipto. Esses estresses podem aumentar a predisposição das florestas plantadas à ocorrência das pragas citadas e afetar as populações dos seus inimigos naturais, por ação direta sobre eles, que são menos resistentes que as pragas, e, por ação indireta, afetando o sub-bosque e fragmentos florestais, onde os parasitoides buscam seu alimento (pólen e/ou néctar).
Portanto, o cenário no campo é complexo, e, só com mais estudos e dados de séries históricas, é que poderemos compreender melhor os problemas com pragas que vêm ocorrendo no Brasil. Frente a isso, o que fazer? As empresas florestais sempre consideraram as formigas-cortadeiras como praga-chave para as florestas plantadas, independente da espécie plantada, e o controle de formigas é parte obrigatória em qualquer planejamento florestal, inclusive quantificando os custos de controle e incluindo nos orçamentos anuais.
Entretanto, as demais pragas florestais geralmente são deixadas em segundo plano e poucas vezes são incluídas na planificação dos novos plantios. Os dados dos levantamentos do PROTEF evidenciam que, desde 2018, as pragas de copa de árvores também precisam ser consideradas pragas-chave e devem ter seu controle previsto e orçado, para facilitar a tomada de decisão, caso seu controle seja necessário.
O segredo do sucesso no controle de pragas reside, em parte, na rapidez das decisões e das operações de controle e, na outra parte, na previsibilidade do risco de ocorrência de surtos e no planejamento do uso de controle biológico, que é de efeito mais lento, porém mais duradouro.
Outro caminho é considerar, dentro dos programas de melhoramento florestal, a avaliação de novos clones ou genótipos quanto à suscetibilidade/resistência às pragas florestais. A seleção de clones mais adaptados regionalmente auxilia na redução dos efeitos dos estresses abióticos e, sendo possível agregar a resistência às pragas ou, pelo menos, evitar o plantio de clones suscetíveis, permitirá reduzir sobremaneira os danos das pragas e manter os altos níveis de produtividade florestal.
Os avanços tecnológicos, como uso de drones na aplicação de inseticidas químicos e biológicos e na liberação de inimigos naturais, e científicos, como pesquisas de uso de RNAi (RNA de interferência) para controlar as pragas de forma mais específica e seletiva, também ajudarão a manejar melhor as pragas. As soluções para os problemas de pragas e doenças florestais só avançarão considerando uma abordagem multidisciplinar, com o esforço de pesquisas conjuntas entre as áreas de proteção, melhoramento e manejo florestal e a rapidez na transferência dos melhores resultados para o setor produtivo.