Presidente da AMIF e Presidente da Câmara Setorial de Florestas Plantadas do Ministério da Agricultura
Ouvidos atentos sobre as projeções para os próximos meses, o ano seguinte ou, em alguns poucos casos, para os próximos dois/três anos é uma atitude frequente nas rodas de conversa entre lideranças, entretanto, raro é ouvir conversas sobre como está nossa preparação para o médio, longo prazo, a próxima década.
Infelizmente aos mais céticos ouso dizer que não é alarmismo, é realmente preocupante não utilizar os “faróis altos” para enxergar o nosso negócio. Para a agroindústria florestal brasileira, aqui me proponho a focar, nesta conversa não usual, quais são os desafios que já enfrentamos hoje para nosso desempenho amanhã.
Acostumados aos ciclos longos da produção florestal, o exercício de enxergar, encontrar vulnerabilidades e buscar soluções e adaptações que nos conduzirão de forma mais segura ao longo prazo do negócio deve ser uma constante no exercício da liderança atualizada.
Atuando há quase duas décadas no setor florestal, aprendi em diversas situações que os maiores desafios nos encontram sempre onde acreditamos ser a morada de nossas forças. A velocidade da leitura real dos cenários restritivos, a adaptação às mudanças de forma produtiva e a importante geração ou agregação de valor adicional neste contexto diferenciam as empresas que estarão à frente em seu segmento.
Como presidente e conselheira, estou constantemente desenvolvendo o olhar estratégico e o diferenciando do tático, ambos importantes para minhas atividades. Aprendi que o olhar estratégico é o farol alto, acende a luz para o que ainda está longe, mas está se aproximando; e o tático é o farol baixo, ou seja, enxergamos o que está mais palpável à nossa frente. Entre estes dois focos, identifico sob a minha visão os principais desafios que a agroindústria florestal do amanhã já consegue mapear e que é preciso velocidade para encontrar o caminho correto.
Obviamente, são vários os desafios, a depender da leitura e do leitor, e destaquei os internos ao setor que, a priori, estão mais palpáveis para a gestão. Valoração dos ativos e valorização setorial: O setor precisa quebrar a barreira de valores praticados em seu mais precioso material, a madeira. Uma matéria-prima melhor valorada estende este prêmio aos demais elos da cadeia produtiva. Produtos valorados de forma inteligente são valorizados para além do aspecto financeiro. }
Uma cadeia de valor sem a devida alavancagem sistêmica em geração de valor econômico e financeiro aos seus integrantes não é prioridade em negociações relevantes; o seu “peso” médio torna-se relativamente baixo em uma decisão que pondera multimercado. Um exemplo clássico foi a espetacular valoração que o minério de ferro brasileiro passou nos meados dos anos 2000 e a consequente valorização atual, totalmente diversa daquilo que era antes.
A madeira oriunda de plantios comerciais tem todas as credenciais para ser valorizada de forma que nunca vimos no Brasil, mas o setor precisa suportar este processo com foco no futuro. Atração, integração de colaboradores e desenvolvimento de novos líderes: identificar, reconhecer, manter e desenvolver talentos é atualmente um dos maiores desafios enfrentados em grande parte dos setores da economia brasileira.
Não acredito que a distorção de valores sociais e a excessiva política assistencialista brasileira sejam as principais causas, apesar de toda relevância que possuem. O trabalho mudou, a população economicamente ativa mudou, as relações mudaram, os propósitos dos indivíduos também, porém, ainda oferecemos grande parte das vagas desenhadas nos modelos antigos com alguns “diferenciais”. O trabalho precisa ser relevante, interessante para a empresa e para o trabalhador inclusive, não apenas uma necessidade de troca de horas por salário.
Parece óbvio, mas não é. Tecnologia e inovação como aliadas: É preciso desenvolver soluções que aumentem a produtividade, eficiência e qualidade da porteira para dentro. Ainda estamos tímidos quanto ao estímulo à inovação (desenvolvimento e aplicação) em nossas operações. Com exceções das grandes corporações, ainda não assistimos a inovação aplicada e acessível aos demais perfis de produtores florestais.
Temos um ciclo longo de produção, e o desafio é potencializar neste tempo os resultados que vamos colher e que serão percebidos na produção dos produtos e subprodutos florestais. A tecnologia deve ser aliada na solução de problemas e ser priorizada inclusive no desenho de cargos e funções dos colaboradores. Proponho a seguinte reflexão: Estamos na grande parte dos nossos processos ainda analógicos em um mundo que conversa digitalmente?
Entregar o que o mercado global demanda: Imprescindível fazer constante leitura atenta e focada do comportamento do mercado global. Quais as tendências, onde estão as maiores demandas, como a madeira está inserida neste universo de possibilidades hoje e daqui a uma década? O produto que será consumido amanhã precisa ser desenvolvido ontem.
Nunca o setor florestal viu um cenário global tão promissor em relação à demanda por produtos renováveis, limpos, que sejam versáteis e, de preferência, que não se tornem resíduos – a madeira se encaixa naturalmente nesta tendência, porém o diferencial será a capacidade de inovar, em tempo reduzido e sem perder a qualidade, no desenvolvimento de bioprodutos que entreguem sustentabilidade ao consumidor.
As mudanças de comportamento acontecem mais rapidamente que os ciclos de nossas florestas, o que exige atenção redobrada. Nossa inovabilidade deve ser pautada para entregar soluções frente aos efeitos das alterações climáticas, do consumo desenfreado, das políticas restritivas e instabilidades econômicas cíclicas dos mercados.