Diretor da Teca e Daplan - Gestão e Serviços Florestais, Admi- nistrador da www.facebook.com.br/comunidadeDeSilvicultura
A criação do extinto IBDF, em 1965, seguida da Lei dos Incentivos Fiscais para reflorestamento, em 1966, são marcos importantes no desenvolvimento florestal do Brasil. O IBDF, apesar de muitas limitações, era o gestor do patrimônio florestal. Todas as questões de legislação, de comercialização, de proteção, de pesquisa, enfim, tudo que se tratasse de floresta estava sob a administração do IBDF. Havia restrições e dificuldades, mas todos sabiam quem era o responsável pelos assuntos florestais do País.
Mesmo sem tanta tecnologia disponível e com recursos humanos e financeiros sempre aquém de suas atribuições, indiscutivelmente, todos conheciam o “locus institucional” do setor. Com os incentivos fiscais para o reflorestamento, a instituição se agigantou. Apesar de muitas polêmicas e abusos na aplicação dos recursos incentivados, para muitos a política de incentivos foi a grande alavanca para o crescimento e desenvolvimento dessa parte do setor. As estatísticas mostram a existência de mais de duas mil empresas em atividade, na época.
E os programas de plantios anuais giravam em torno de 400.000 hectares. Até então, o reflorestamento era o setor florestal! É fácil perceber a movimentação e as demandas que se criavam e se multiplicavam. A pesquisa e a ciência florestal deram passos gigantescos, e as indústrias à base de madeira foram se consolidando com muita rapidez. Até o movimento ambientalista encontrou nos plantios de eucalipto e pínus as razões para se fortalecer e se multiplicar.
O sucesso e envolvimento social, econômico e ambiental do reflorestamento, no entanto, apagou e inibiu o desenvolvimento de outras áreas do setor florestal. Foi um período de muito sucesso, mas gerou um mundo de polêmicas. Algumas com razões, e muitas só para atrapalhar e frear o crescimento das áreas plantadas. Abusos e erros de empresas “picaretas” deram força e razão aos movimentos adversos, e daí surgiram as primeiras entidades representativas em defesa da atividade.
Para muitos, a continuidade dos incentivos e os resultados positivos alcançados pelos reflorestamentos bem-feitos e conduzidos por boas empresas só foram possíveis graças ao incansável trabalho das entidades representativas estaduais e nacionais na luta por soluções dos problemas institucionais que pipocavam a todo instante. Eram mais de trinta entidades representativas, nem sempre unidas, mas sempre atentas às limitações do setor.
A cada mudança de Governo, era muito comum uma grande movimentação entre entidades de classe e lideranças profissionais, no sentido de reunir dados e informações e apresentar ou ressuscitar reivindicações para melhorias do setor. Esses movimentos eram bem expressivos e contavam com o apoio de todos os segmentos interessados.
Com a extinção dos incentivos e, mais tarde, do IBDF, o assunto florestal foi segmentado em nível de Governo Federal e ficou fragilizado em termos institucionais. Perdeu-se o “locus institucional”. As dificuldades para se juntar as entidades representativas aumentaram a ponto de levar grande parte delas à extinção. Criou-se um vazio na representatividade setorial. Restaram as entidades providas de recursos financeiros de grandes empresas, e as reivindicações se restringiram a interesses bem específicos. As reivindicações, embora justas e necessárias, perderam muito da legitimidade. Pouco se avançava em reivindicações, e muitas se arrastam até os dias atuais.
Nas últimas mudanças de Governo, o descrédito nas decisões governamentais e o interesse focado em segmentos específicos arrefeceram muito o ânimo e a disposição das lideranças profissionais. Uma pena, pois, com isso, o setor foi se enfraquecendo, em nível institucional, e muitos problemas foram se juntando e se desdobrando em consequências inevitáveis e prejudiciais. Há de se destacar que, nesse período em que tudo girava em torno do interesse do reflorestamento e seus usuários, o restante do setor florestal foi marginalizado e só se manteve vivo graças ao heroísmo de profissionais brilhantes, professores e poucos pesquisadores. Vivia-se um estranho paradoxo: um país rico em florestas nativas se destacava para o mundo por suas florestas plantadas.
Mas há de se registrar que esse brilhantismo de alguns segmentos se deu pelo esforço, competência e crédito que tiveram diante das potencialidades naturais do Brasil. O setor de celulose é o exemplo de maior destaque, sem desmerecer o valor de outros segmentos industriais. Esses exemplos é que fizeram com que a silvicultura brasileira despontasse no mercado de exportações e o Brasil se transformasse em destaque internacional na ciência florestal, voltada à produtividade de florestas plantadas. Um sucesso indiscutível e que só merece elogios, respeito e admiração. No entanto, para muitos, o setor florestal brasileiro continua sendo só isso – autossuficiente, sustentável, independente e rico.
Não há necessidade de muitas justificativas para se perceber que essa fotografia maravilhosa de parte do setor de florestas plantadas é, vergonhosamente, contrastante com a grande realidade do setor florestal brasileiro. Temos a maior e mais rica floresta tropical do mundo. Muito “badalada” pelo mundo todo, mas pouco aproveitada para benefícios dos brasileiros.
Nossas pesquisas florestais que se destacam internacionalmente usam mais de 80% dos recursos disponíveis para estudar florestas plantadas para um universo industrial cada vez mais restrito. Pouco se fala de pesquisas com nossas espécies nativas, e os avanços alcançados no manejo de nossas florestas nativas ainda não teve o merecido e indispensável apoio dos governantes. Somos protagonistas em tudo que se trata de florestas plantadas e miseravelmente acanhados em tudo que se trata do restante de nossos recursos naturais.
E foi, exatamente, com a sensibilidade desses contrastes que o movimento, que se realizava na chegada de novos governantes, desta vez, tomou rumo diferente. No momento, não dá para pedir só acertos daqui e dali, é preciso que se apresente de forma direta e sem rodeios, os descaminhos a que está submetido o setor.
São rumos indesejáveis, que afetam mais de três milhões de brasileiros e matam o sonho de mais de mil e quatrocentos engenheiros que se formam todos os anos em nossas faculdades. Inibem o desenvolvimento de muitas regiões e afastam empreendedores que poderiam gerar empregos e mais riquezas a toda a sociedade, que mal conhece o que é setor florestal em toda sua abrangência. Dessa vez, não houve necessidade de grandes reuniões, discursos e pauta infindável.
Usando-se dos meios modernos de comunicação, uma simples chamada através do WhatsApp, em poucos dias, reuniu mais de cem profissionais e, em pouco tempo, com umas trezentas mensagens, foi possível retratar um pouco da realidade do setor e muito das principais dificuldades, que assustam os profissionais do País. Com o nome de Silviculturando-se, juntaram-se dados e informações, que possibilitaram que um grupo de profissionais pudessem elaborar uma carta-documento para ser entregue à Ministra da Agricultura.
Longe de se esgotar e detalhar os problemas do setor, a carta deve ser entendida como um “grito de alerta do setor florestal”. Mostra as prioridades essenciais e indica a necessidade de se manter uma interlocução direta com todas as representações do setor. Sugere-se a adequação e a valorização do Serviço Florestal Brasileiro, para que possa exercer com eficácia suas atribuições de gestão de todo o setor.
Lembra da inadiável implementação do Programa de Desenvolvimento de Florestas Plantadas e dá destaque à formação da Comissão Nacional de Políticas Florestais, onde todos os segmentos deverão ser representados. Nada de imposições constrangedoras e tudo de compartilhamento, colaboração e participação dos interessados.
A motivação que gerou todo esse movimento é a convicção dos profissionais de que o setor florestal brasileiro pode se transformar numa excelente alavanca para o desenvolvimento econômico, social e ambiental do Brasil. E que esse processo só acontecerá a partir do interesse e decisões políticas de nosso Governo. A união de profissionais, no Silviculturando-se, deu o “Grito de Alerta”, com a esperança de que nossos governantes não protelarão, ainda mais, o crescimento e o desenvolvimento do setor florestal do Brasil.