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Lúcio de Paula Amaral

Professor de Curso de Mestrado Profissional em Agricultura de Precisão da UF-Santa Maria

Op-CP-50

A evolução da silvicultura de precisão
O setor florestal brasileiro sempre inovou e esteve na vanguarda do desenvolvimento da silvicultura, baseada principalmente no cultivo dos gêneros Eucalyptus e Pinus.  Houve grandes avanços científicos e tecnológicos que construíram os métodos e técnicas para elevar a produtividade das espécies florestais utilizadas comercialmente, tais como o melhoramento genético, uso de clones, desenvolvimento de programas específicos de correção e fertilidade do solo, programas de nutrição de plantas em viveiros, cultivo mínimo, mecanização de trabalhos manuais (plantio, tratos silviculturais, colheita e transporte florestal), dentre outros.

Cresce o consenso de que a silvicultura de precisão poderá auxiliar na obtenção de melhores ganhos, isto é, a produção maximizada de madeira por árvore na floresta, por possibilitar intervenções em todos os processos da produção. Prefiro utilizar o termo “floresta de precisão”, que visa maximizar os resultados, otimizar os recursos disponíveis, gerir melhor os processos e pessoas, desde a seleção e implantação dos melhores materiais genéticos disponíveis, determinação dos sítios e ambientes mais propícios para expressar o máximo potencial genético, que possibilitará obter maior produção possível de cada árvore, talhão, gleba e projeto florestal, chegando até o processamento adequado da matéria-prima.

A diferença entre esses dois conceitos é que floresta de precisão tende a ser mais abrangente em etapas e processos, indo além da silvicultura de precisão, englobando manejo, colheita, logística, processamento da madeira e ambiência. Voltando à silvicultura de precisão, penso que só será possível ser trabalhada, se conhecermos onde e como cada árvore cresce na floresta, o que demanda o conhecimento de sua posição no talhão. A tendência é que no momento do plantio das mudas, suas coordenadas geográficas sejam obtidas por uma antena GNSS (Global Navigation Satellite System) ligada a um computador de bordo que gerará um id (código identificador) para cada árvore, sendo ambos integrados em um mapa de plantio e banco de dados. 
 
As linhas de plantio serão planejadas para que máquinas autônomas ou operadas de modo automático as gerem. Com as linhas de plantio e as mudas georreferenciadas, todas as demais atividades e operações de tratos e manejo podem ser aplicadas a essas mudas/árvores, de forma localizada e precisa. Na agricultura de precisão a semente é o insumo mais importante para a formação da lavoura, enquanto  na silvicultura de precisão, a muda é o insumo mais importante para a formação do povoamento florestal, o que justifica tal nível de controle e de aquisição de dados. 
 
Outra demanda importante é a obtenção automatizada de dados, envio e armazenamento nas nuvens de forma periódica, para não dizer em tempo real, o que poderá alimentar sistemas de gerenciamento, que farão a análise espacial e técnica desses dados, assim como os sistemas de informações geográficas ou similares, para gerar as recomendações no momento adequado à sua aplicação na floresta. Não há como negar que, independentemente do nome (silvicultura de precisão, floresta de precisão, manejo florestal de precisão, dentre outros termos similares), essa abordagem tem se consolidado como uma nova mentalidade no setor florestal, fundamentada em gestão silvicultural e no manejo integrado da floresta ou do empreendimento.

Entretanto, para efetivamente realizar essas intervenções via tratos silviculturais, que não devem considerar cada talhão, região da floresta (zona de produção) ou árvore como um padrão único, será necessária a utilização de máquinas e implementos que realizem multifunções e que atuem em multilinhas, ou seja, realizem diferentes operações ao mesmo tempo em duas ou mais linhas e entre linhas concomitantemente.  
 
Essas máquinas estão sendo desenvolvidas ou adaptadas para atenderem a essa nova demanda do setor florestal, para aplicarem esse conceito nas diferentes etapas do processo. Dessa forma, a silvicultura de precisão depende das geotecnologias (sensoriamento remoto orbital e/ou com aeronaves remotamente pilotadas (ARP), sistemas de informações geográficas (SIG) e/ou sistemas de gestão, banco de dados espaciais, posicionamento por GNSS, da tecnologia big data (envio e armazenamento de dados nas nuvens), de máquinas autônomas ou controladas remotamente, do desenvolvimento de novos métodos e técnicas que levem em consideração a variabilidade espacial e temporal dos fatores que condicionam a produção, bem como de técnicos e gestores qualificados para essa realidade.

Acredito que haverá uma infinidade de sensores para otimizar a coleta de dados de diversos temas, que farão o mapeamento do solo, da vegetação e/ou dos plantios florestais, do clima, dentre outros fatores. Eles serão embarcados nas máquinas que transitam nos talhões ou em plataformas específicas, com as ARP. Para o ser humano, será atribuída a função de gestor, seja para tomadas de decisões no âmbito do empreendimento florestal, seja de maneira mais pontual, na gestão das operações de máquinas autônomas ou automáticas realizarão, não sendo mais necessário ser ele o operador de máquinas ou a força de trabalho manual. 
 
As intervenções na floresta deverão ser feitas de forma localizada e em taxa variada, podendo ser registrada a variabilidade espacial da própria produção, na qual as máquinas de colheita florestal podem gerar os “mapas de colheita”, assim como na agricultura de precisão. 
 
A propósito, sobre os mapas, esses serão em formato digital e irão descrever a variabilidade espacial de vários temas como dados de crescimento, volumetria e biomassa obtidos a partir dos inventários florestais, dados de vegetação, relevo, classes ou tipos de solos, bem como a variabilidade de seus atributos físicos e químicos, condições do clima, sítios florestais, incidência de pragas e doenças, ocorrência de plantas daninhas, déficit hídrico, risco de incêndios ou áreas nas quais esses ocorreram, dentre outros.

Os mapas digitais serão ainda intercambiáveis entre diferentes sistemas de gerenciamento e entre diferentes computadores de bordo das máquinas, podendo ainda ficar armazenados nas nuvens, que poderá ser acessada diretamente pelas máquinas em campo via links específicos. 
 
Para exemplificar a vantagem do uso da abordagem da silvicultura de precisão ou floresta de precisão, cito resultados de pesquisa realizada pelo nosso grupo em um plantio comercial de clones de Eucalyptus sp. no Rio Grande do Sul. Nessa área experimental de aproximadamente 145 ha, em rotação de ciclo, foi realizado um levantamento de qualidade do plantio, com uso de unidades amostrais circulares e georreferenciadas para coleta de dados de sobrevivência, mortalidade e danos às mudas (quebra, ataque de formigas, bifurcação, dentre outros). Com esses dados foram realizadas análises espaciais em SIG (interpolação pelo inverso da distância ponderada – IDW), evidenciando que em 93,40 ha a densidade foi maior que 42 mudas por unidade amostral circular de 299,87 m2, considerada acima do ideal, que seriam 40 mudas, ±5% por unidade amostral (correspondente a 1.333 mudas/ha), representando 64,21% da área avaliada.

Em 42,43 ha (29,16%) a densidade foi considerada ideal e em 9,64 ha (6,63%) a densidade ficou abaixo do ideal. As figuras abaixo ilustram essas variações de densidade de mudas na área de estudo. Essas análises, relativamente simples, já apontam problemas de gestão silvicultural e definem a localização espacial das áreas nas quais os problemas ocorreram e intervenções específicas poderiam ser realizadas. 
 
 Quanto à formação dos profissionais que irão atuar na silvicultura de precisão, destaco que a academia também se preocupa em oferecer aos estudantes de graduação e pós-graduação essa abordagem. Por exemplo, na UF-Santa Maria, o curso de graduação em Engenharia Florestal oferece a disciplina de Floresta de Precisão I, como complementar de graduação, que aborda as bases da silvicultura, manejo e colheita de precisão. 
 
Está prevista ainda a criação da disciplina Floresta de Precisão II (para complementar com atividades práticas em áreas experimentais, visitas a empresas e instituições que desenvolvam projetos nessa abordagem). Existe também um Mestrado Profissional de Agricultura de Precisão, voltado aos profissionais da área de Ciências Agrárias I e áreas correlatas, que precisam se especializar nessa área. Outro exemplo é a UF-Paraná que oferece um MBA de Manejo Florestal de Precisão, dentre outras iniciativas em outras instituições de Ensino Superior.

Com todos esses avanços, no setor florestal e acadêmico, espera-se que a produtividade das florestas seja elevada a novos patamares, a exemplo de ganhos anteriormente obtidos na silvicultura brasileira e mundial.